Ana Maria Gonçalves comenta novo livro, avalia mercado editorial e compartilha expectativas sobre o carnaval
PublishNews, Guilherme Sobota, 29/06/2023
'Um defeito de cor', seu romance publicado pela Record em 2006, será o tema do samba enredo da Portela em 2024; escritora participou do Sabatina PublishNews

Ana Maria Gonçalves foi convidada da Sabatina PublishNews; veja a entrevista na íntegra
Ana Maria Gonçalves foi convidada da Sabatina PublishNews; veja a entrevista na íntegra
No Sabatina PublishNews desta quarta-feira (28), a escritora Ana Maria Gonçalves falou de seu novo livro (ainda na gaveta, "descansando"), avaliou o mercado editorial, comentou questões de crítica literária e compartilhou suas expectativas para o carnaval de 2024, quando a Portela vai colocar na avenida o samba enredo inspirado em Um defeito de cor, seu romance publicado pela primeira vez em 2006 pela Record.

"Está sendo mágico, a ficha ainda não caiu", disse a escritora, sobre o carnaval. "Quero viver intensamente todo o processo. Começam agora os ensaios, já tenho todo o meu desfile na cabeça (risos), mas está sendo muito bonito acompanhar os carnavalescos, André Rodrigues e Antônio Gonzaga. É uma conversa muito bonita com o livro".

Sobre o novo romance, Ana Maria contou que uma primeira versão já foi concluída, e que agora ela espera um momento para reescrevê-lo e editá-lo, seu processo favorito na profissão. "Fiquei sete anos sem conseguir terminar nada, meio assustada com a repercussão (de Um defeito de cor). Passei a me cobrar muito a partir dali. Tem uns três anos que consegui terminar um livro, uma ficção científica policial. Ancestars (o conto inédito publicado na edição especial de Um defeito de cor lançada pela Record em 2022) aponta também para o afrofuturismo. A primeira versão do novo livro está descansando na gaveta, quero um tempinho agora para me dedicar a ele. Pela primeira vez, depois de Um defeito de cor, é um livro que gostei de ter escrito", contou.

Para a escritora, o setor editorial passou a entender nos últimos anos que havia uma demanda reprimida por livros de diferentes origens e escritos em diferentes contextos, abrindo espaço para a diversidade. "Depois de Um defeito de cor, acredito que o mercado entendeu que havia uma grande demanda, uma demanda reprimida. Então, hoje em dia há cobranças do próprio mercado por publicações mais diversas, não tão concentradas em São Paulo, Rio e Minas. Há um público muito grande que não estava mais interessado em um tipo de história com que o mercado estava acostumado. A gente acaba escrevendo sobre os temas mais próximos, a vida da gente… e eu acredito que os leitores já estavam cansados de uma literatura que falava apenas de um universo masculino e branco, sudestino. Quando vem uma literatura diferente, de outras regiões do Brasil, o próprio mercado entende que há aí um modo de crescer", avaliou.

"A fome que a gente estava de livros que falassem da gente. O mercado não entendeu isso porque é bonzinho, entendeu pelo bolso, e Um defeito de cor pode ter ajudado nesse processo. Era um momento em que estávamos começando a tratar a temática racial na mídia brasileira com mais intensidade", comentou.

Questionada sobre o lugar da crítica literária atualmente, a escritora evitou polêmicas mas ofereceu uma visão apurada a partir da própria experiência. "Antigamente, a crítica literária nos jornais tinha cadernos literários, pessoas que podiam se dedicar só àquilo. O que eu li sobre Um defeito de cor na época foi mais o que saiu na academia, apesar do livro ter sido bem recepcionado em outros lugares também. E, num determinado momento, eu parei de ler. A crítica talvez seja uma conversa entre o crítico e o leitor, ou entre o crítico e o mercado. Eu não leio".

Sobre o mercado editorial – ao qual chegou, segundo ela mesma, com uma facilidade rara –, Ana Maria apontou que há muito material, especialmente de autoria negra, perdido no tempo e em edições antigas e difíceis de encontrar, e que esse material precisa voltar a circular. "Poderíamos pensar em programas de governo com incentivos para editoras que trabalhem com isso", refletiu. "Eu não sei se teria publicado se Conceição Evaristo não tivesse publicado antes, por exemplo".

Por outro lado, ela reconheceu a necessidade de que as editoras brasileiras consolidassem estratégias de divulgação, por exemplo, semelhantes a de outros mercados, como o norte-americano. "A gente precisava que as editoras investissem mais na divulgação dos seus autores. Para que tivéssemos mais tempo de fazer uma literatura menos apressada, com mais calma. Vejo construção dos mercados editoriais lá fora, mas não vejo no Brasil", comentou.

Ana Maria foi entrevistada por uma bancada montada pelo PublishNews, da qual participaram: Tatiany Leite, jornalista e colunista, criadora do projeto "Vá Ler um Livro"; Luiz Henrique Oliveira, professor do Programa de Pós-Graduação em Estudos de Linguagens e do Ensino Médio do Centro Federal de Educação Tecnológica de Minas Gerais (CEFET-MG), um dos organizadores de Trajetórias editoriais da literatura de autoria negra brasileira (Malê, 2022); e Heider Assis, livreiro da LDM em Salvador e vencedor do Prêmio Catavento PublishNews 2023.

A entrevista foi apresentada pela jornalista Talita Facchini, editora assistente do PublishNews, e teve produção e direção de Guilherme Sobota, editor-chefe do PN.

O Sabatina já recebeu nomes como Sônia Machado Jardim, presidente do Grupo Editorial Record; Dante Cid, presidente do SNEL; Luiza Helena Trajano, presidente do Conselho de Administração do Magazine Luiza; Marcus Teles, diretor da Livraria Leitura; Marcos da Veiga Pereira, ex-presidente do SNEL, Marcos Guedes, ex-CEO da Saraiva; Luiz Schwarcz, CEO da Companhia das Letras; Lucia Riff, fundadora da Agência Riff; Eduardo Giannetti, autor e economista; o também autor Ilko Minev; e a CEO da Editora Gente e ex-presidente da CBL, Rosely Boschini.

Veja a entrevista completa com Ana Maria Gonçalves:

[29/06/2023 09:50:00]