Nos cursos que tenho ministrado, sempre aprendo e me reciclo bastante.
Numa oportunidade dessas, no Rio de Janeiro, estive com Anna Rennhack, pedagoga e mestre em Educação que, por cerca de 13 anos, exerceu o cargo de gerente de Relações Institucionais no Grupo Record. Seu foco principal eram as vendas para governos. Dela, ouvi uma informação preocupante, mas que precisa ser mais discutida e que já provocou inúmeras baixas no mercado editorial, de pessoas e empresas e, se não estivermos atentos, pode provocar um dano muito maior, na Educação, na formação de leitores, no futuro de nossos profissionais de todas as áreas.
No último ano em que houve compras do PNBE, 2014, elas representaram quase 20 milhões de livros infantis e juvenis, correspondendo a 66% do mercado infantojuvenil. Isso significa dizer que nos últimos dois anos o mercado editorial neste segmento encolheu para 1/3.
Quais as consequências? Desemprego de profissionais, editores, autores, ilustradores, gráficos, revisores, tradutores, agentes, vendedores. Livros que saíram de catálogo e não voltarão. Pessoas que precisaram redirecionar a dedicação de uma vida à Educação e precisam buscar novas atividades profissionais. São muitas as editoras que fecharam, e há várias outras segurando as portas por um fio (e por idealismo), tentando garantir a existência na esperança de alguma melhora em breve.
Mas isto não sensibiliza muita gente, afinal, é o país inteiro na mesma crise.
Então outro algo deveria sensibilizar.
Acabam de sair os resultados do PISA, avaliação de estudantes brasileiros em relação a outros 70 países do mundo e nosso país ficou dentre os últimos colocados: 65º dos 70 avaliados, atrás de Kosovo, Tunísia e Argélia, por exemplo.
Muita gente diz que o resultado passa por valorização do professor. Penso que sim, mas não apenas salário. É investimento na formação, na estrutura das escolas, na definição de prioridades do currículo escolar, na disciplina tanto para alunos quanto para todo corpo de professores. Greves frequentes, faltas de professores, escolas sem estrutura física razoável, retirada de autoridade dos professores em salas de aula são elementos mais graves do que oferecer um conteúdo mediano, mas frequente e consistente aos alunos.
Meses atrás, publiquei num artigo a declaração da doutora em Educação, Emília Amaral, sobre como se alterou nas últimas décadas o ensino de literatura, apoiado por uma visão pós-modernista.
Segundo ela, passou-se a oferecer literatura a partir de questões externas às histórias dos livros. Basicamente significa dizer que o aluno saber se o autor / personagem era negro, homossexual, perseguido passou a ter mais destaque que a história narrada. Muitos desses livros passaram a ser vistos apenas por trechos, então não importava mais agora conhecer a história.
Olhem as questões do Enem e vejam como analisar a mente do poeta, o momento da produção da escritora é o destaque das questões. Não há literatura ali. Não é preciso ler um livro do autor para responder a essas perguntas.
Numa idade em que deveríamos formar leitores, fazer mais pessoas terem prazer com a leitura, desestimulamos o prazer pela ideia de tornar aquele possível futuro leitor num crítico literário e social. Mas não se torna um crítico sem antes haver leitura com compreensão.
Não à toa temos gente disparando ideias e ideais nas redes sociais sem qualquer estudo histórico. Uma geração que não sabe somar, não relaciona causa e consequência, que joga culpa no Estado e nos pais por todas as mazelas, mas não assume parte da responsabilidade.
É sobre isso que se trata a leitura.
É sobre esses jovens e adolescentes, que não terão livros novos, atuais, desafiadores nos próximos anos que veremos resultados ainda piores.
E o que se dizer do índice de leitura. A pesquisa “Retratos da Leitura”, de 2007, indicou que apenas 55% se declaravam leitores no Brasil. Em 2015, com o boom de compra de livros dos anos anteriores para as bibliotecas esse número subiu para 57%, e 4,96 livros lidos per capta. O que devemos esperar para 2017? Certamente uma queda. E bem grande.
Se a retomada das compras governamentais de livros, que alguns poderiam ver como meio de salvar empresas (no caso, as editoras), não é algo sensibilizante e capaz de produzir votos e aumentar a aceitação de um político, o argumento de salvar uma geração do analfabetismo funcional deveria ser considerado algo forte, pois tem impacto direto futuro do país e melhora de índices de emprego, renda, saúde e segurança. Sim, a falta de leitura pode destruir um país.Pedro Almeida é jornalista profissional e professor de literatura, com curso de extensão em Marketing pela Universidade de Berkeley. Autor de diversos livros, dentre eles alguns ligados aos animais, uma de suas paixões. Atua no mercado editorial há 26 anos. Foi publisher em editoras como Ediouro, Novo Conceito, LeYa e Saraiva. E como editor associado para Arx; Caramelo e Planeta. É professor de MBA Publishing desde 2014 e foi presidente do Conselho Curador do Prêmio Jabuti entre os anos 2019 e 2020. Em 2013 iniciou uma nova etapa de sua carreira, lançando a própria editora: Faro Editorial.
Sua coluna traz exemplos recolhidos do cinema, de séries de TV que ajudam a entender como funciona o mercado editorial na prática. Como é o trabalho de um ghost writer? O que está em jogo na hora de contratar um original? Como transformar um autor em um best-seller? Muitas dessas questões tão corriqueiras para um editor são o pano de fundo de alguns filmes que já passaram pelas nossas vidas. Quem quer trabalhar no mercado editorial encontrará nesses filmes algumas lições importantes. Quem já trabalha terá com quem “dividir o isolamento”, um dos estigmas dos editores de livros. Pedro Almeida coleciona alguns exemplos e vai comentá-los uma vez por mês.
** Os textos trazidos nessa coluna não refletem, necessariamente, a opinião do PublishNews
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