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‘Romance literário’ e ‘Romance comercial’: qual a diferença?
PublishNews, Pedro Almeida, 30/03/2020
Conselho curador do Prêmio Jabuti traduz texto publicado pelo London Writers Awards em que críticos literários explicam as diferenças entre as duas categorias

Ao lançar a última edição do Prêmio Jabuti, passamos a acompanhar pelas redes sociais um amplo debate sobre a nova categoria que decidimos criar para esta edição que já está nas ruas, a Romance de Entretenimento. As dúvidas são muitas, claro, mas uma delas é bastante recorrente: como eu, candidato ao Prêmio, vou decidir se meu livro é um Romance Literário ou um Romance de Entretenimento? Conseguimos autorização dos organizadores do London Writers Awards, prêmio britânico que também tem as duas categorias, para traduzir um texto claro e didático que define o que é uma coisa e o que é a outra. O texto traz a visão de críticos de romances literários e romances de entretenimento, lá também chamados de romances comerciais. A tradução é Marcos Marcionilo, meu companheiro no Conselho Curador.

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Seu texto já está pronto. Agora, o que você precisa é se decidir por qual categoria: Romance Literário ou Romance Comercial?

Essa é uma pergunta que muitas pessoas se fazem. Diferentemente da poesia, com sua forma definida, ou da ficção infantil com seu público óbvio, ou até da narrativa não ficcional, baseada na verdade, a definição de romance literário e de romance comercial é mais matizada e confusa.

Apesar de haver um cruzamento entre as duas, elas são categorias distintas. O romance literário quase sempre se concentra na arte, a partir de um enredo impulsionado pelos personagens e por suas motivações internas. Já o romance comercial geralmente está mais concentrado no enredo e lida mais com a busca do entretenimento do que com a arte (com as palavras). “No romance literário, há mais de um foco na escrita em si mesma, não apenas como um instrumento para contar uma história”, diz a escritora Diana Evans, jurada da categoria romance literário. “Tanto o romance literário quanto o comercial contam histórias, mas eu diria que, no romance literário, a história e a escrita persistem como alvos de mesma estatura, ao passo que no romance comercial a história tem todo o destaque”.

Ella Kahn, da DKW Literary Agency, é uma de nossas juradas na categoria de romance comercial. Ela também ressalta a diferença de focos e afirma que “o romance comercial (qualquer que seja seu gênero) tende a ser mais impulsionado pelo desenvolvimento do enredo e dos personagens, enquanto o romance literário é impulsionado por preocupações temáticas ou estilísticas”.

Vaseem Kahn, escritor e jurado na categoria de romance comercial concorda: “O romance literário oferece uma tela mais ampla aos escritores, com infinitas possibilidades de exploração do personagem, do cenário, do tema e do estilo. O nível de ‘qualidade’ da prosa desse romance é considerado alto. O desafio para o autor do romance comercial é encontrar a criatividade dentro dos limites do gênero, sem deixar de atender às expectativas de um público particular”.

Contudo, a questão vai além de um se concentrar apenas no leitor e o outro, na arte; um escritor jamais deve descuidar de um ou de outra. A fronteira entre o romance comercial e o literário está se afunilando. Por exemplo, no passado recente, o Man Booker Prize viu muitos de seus indicados cruzarem gêneros. Em ambos os casos, a qualidade da escrita é fundamental. “Uma grande qualidade de prosa é importante para ambas as categorias, e as explorações de temas e enredos podem ser igualmente complexas em ambas”, afirma Ella, “mas é no romance comercial que a qualidade da escrita também pode ser definida por determinado grau de ‘legibilidade’ ou ‘acessibilidade’ de estilo que talvez a torne mais imediatamente envolvente”.

Vaseem cita o romance policial como um grande exemplo dessas fronteiras indistintas. “Em uma ponta desse espectro, está sendo produzido, em termos de estilo e qualidade, um romance policial quase indistinguível da escrita literária; mas ele preserva as marcas de uma boa história policial em seu enredo, na caracterização dos personagens e no mistério a ser desvendado”.

Eva Lewin, gerente de Desenvolvimento de Escritores na Spread the Word, concorda com a afirmação de que o romance comercial diz quase sempre respeito ao enredo e ao gênero, mas afirma também: ele “depende parcialmente de como (em última instância) um editor decide divulgar o romance em questão”. Isso é algo que Lucy Luck, agente na C+W Agency e jurada da categoria de romance literário, também acredita definidor: “Para mim, a diferença é o impacto que os dois tipos de livros buscam provocar no mercado. Romance literário se aplica a livros que carecem de uma venda sustentada, logo, confiam na recepção da crítica e nas listas de prêmios para convencerem os livreiros a encomendarem exemplares e os leitores a comprá-los e lê-los. Romance comercial diz respeito aos livros com maior apelo de exposição nas prateleiras dos mais vendidos, de modo a terem forte presença nas livrarias desde o lançamento e a serem indicados pelas promoções e pelo boca-a-boca”.

Como parte do programa do London Writers Awards, os escritores terão a oportunidade de aperfeiçoar seu trabalho, de modo a deixá-lo pronto para seu agente ou editor, independentemente do gênero ou categoria. Antes de decidir em que categoria inscrever, pergunte-se se sua história está concentrada no enredo ou nos personagens, qual a importância das palavras em comparação com o que as palavras querem dizer e quem você imagina como público-alvo de seu escrito. Esses elementos o(a) ajudarão a tomar sua decisão. Contudo, lembre-se: independentemente da categoria, sua obra tem de ser o melhor que ela possa ser.


* Nesta tradução, trocamos “ficção” por “romance”, por se tratar do modo como nos referimos ao gênero no Prêmio Jabuti.

** As opiniões aqui são variadas, mas se fundem nos mesmos princípios. Não buscamos o consenso total, pois, como diz o texto, trata-se de distinção complexa, sobretudo para quem não está acostumado a ler e editar as duas vertentes. Há carência de trabalhos acadêmicos que estudem as duas ocorrências e sua importância para a literatura, ou maior divulgação das dissertações e teses já constantes nos acervos eletrônicos das universidades.

*** Este texto foi originalmente publicado na página da Agência Spread the Word.

Pedro Almeida é jornalista profissional e professor de literatura, com curso de extensão em Marketing pela Universidade de Berkeley. Autor de diversos livros, dentre eles alguns ligados aos animais, uma de suas paixões. Atua no mercado editorial há 26 anos. Foi publisher em editoras como Ediouro, Novo Conceito, LeYa e Saraiva. E como editor associado para Arx; Caramelo e Planeta. É professor de MBA Publishing desde 2014 e foi presidente do Conselho Curador do Prêmio Jabuti entre os anos 2019 e 2020. Em 2013 iniciou uma nova etapa de sua carreira, lançando a própria editora: Faro Editorial.

Sua coluna traz exemplos recolhidos do cinema, de séries de TV que ajudam a entender como funciona o mercado editorial na prática. Como é o trabalho de um ghost writer? O que está em jogo na hora de contratar um original? Como transformar um autor em um best-seller? Muitas dessas questões tão corriqueiras para um editor são o pano de fundo de alguns filmes que já passaram pelas nossas vidas. Quem quer trabalhar no mercado editorial encontrará nesses filmes algumas lições importantes. Quem já trabalha terá com quem “dividir o isolamento”, um dos estigmas dos editores de livros. Pedro Almeida coleciona alguns exemplos e vai comentá-los uma vez por mês.

** Os textos trazidos nessa coluna não refletem, necessariamente, a opinião do PublishNews

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