Vencedores do Mix Literário ressaltam panorama vibrante da literatura queer
PublishNews, Beatriz Sardinha, 27/11/2025
Três obras premiadas delineiam um panorama vibrante da literatura queer brasileira em 2025: múltipla, insurgente, inventiva, capaz de reinventar tradições, ampliar imaginários e recentrar vidas silenciadas

O Festival Mix Brasil teve sua cerimônia de encerramento realizada no último domingo (23). Na ocasião o público conheceu os títulos vencedores dos prêmios Mix Literário e o Prêmio Caio Fernando Abreu de Literatura. O grande destaque de 2025 é Água de maré (Pallas), de tatiana nascimento (ela prefere grafar o seu nome com minúsculas), que recebeu nota máxima dos três jurados em todas as categorias e conquistou o Troféu Coelho de Prata de Melhor Livro Queer do Ano. O romance já tinha sido o vencedor da primeira edição do Prêmio Pallas, em 2024. Na mesma premiação, o livro Samba fandango (Editora Aboio) recebeu destaque do júri por sua 'pulsação'. Já o Prêmio Caio Fernando Abreu teve como vencedora a escritora Marina Montero, autora de Rebu. A autora terá seu livro publicado pela editora Reformatório. Em 2025, a vencedora do prêmio Caio Fernando Abreu foi a escritora Marcela Fassy.

A coletânea do contos Rebu foi obra vencedora do VI Prêmio Caio Fernando Abreu de Literatura de Marina Monteiro. A obra apresenta contos cujas histórias "desarrumam o mundo por meio de personagens que deslocam fronteiras": a menina-bruxa que reorganiza o colégio; a sapatona octogenária que reinventa o teatro de rua; a viajante que atravessa o deserto do Atacama em busca de uma versão inédita de si. A comunicação do Mix Literário define que a escrita do título "combina humor, fabulação, teatralidade, política e desobediência formal, revelando uma autora de imaginação poderosa e linguagem pulsante". Rebu será publicado pela Editora Reformatório, parceira histórica do prêmio.

Dar tempo ao tempo

Tatiana Nascimento | © Divulgação
Tatiana Nascimento | © Divulgação

Ao PublishNews, a vencedora tatiana nascimento diz que já acompanhava o Mix de cinema desde seus primórdios. Ela celebra o reconhecimento de sua obra dentro de premiações ditas "nichadas" pela representatividade de ter uma obra valorizada em meio a uma comunidade que se reconhece e se preza: "Faz tempo que sabemos que antes que outros olhares, especialmente os colonizados pela cisheteronormatividade e pelo racismo, consigam nos enxergar em nossa grandeza e plenitude, que é como nos vemos. ou melhor, como aprendemos a nos ver, quando nos libertamos da opressão de viver segundo as normas, e em busca do reconhecimento, dos sistemas de mundo que, como disse audre lorde, 'sequer esperavam que sobrevivêssemos' — quem dirá vivermos, viver e sonhar, e criar arte a partir de nossos próprios termos", diz. A autora também é fundadora da padê editorial, que publica em seu catálogo as obras de pessoas negras LGBTQIAPNb+.

Água de maré recebe o prêmio de melhor livro queer do ano 14 anos depois de começar a ser produzido. tatiana coloca que vê nesse feito uma lição de que as coisas são reveladas no momento em que são possíveis de ser compreendidas.

"Comecei a escrever o romance antes de publicar os livros de poesia que tornaram meu trabalho muito conhecido e reconhecido", o livro palavra preta, seu 11˚, foi finalista do Prêmio Jabuti de Poesia, em 2022. No meio do trajeto da escrita de Água de maré, tatiana tornou-se mãe solo. Ela acredita que a premiação tenha sido possível porque o júri do Prêmio Pallas era composto por jurados que viram que, além de digna, aquela era uma história condizente com uma premiação: "O júri do Prêmio Pallas tinha uma escritora sapatona negra e um escritor negro de histórias de terror que efetivamente leram uma história sobre personagens pretas vivendo dissidências de gênero e de sexualidade numa ficção especulativa sobre o fim do mundo como uma história sobre pessoas negras. e uma história digna de ser contada, e não só: premiada".

Menção honrosa

O júri também concedeu Menção Honrosa do Prêmio Mix Literário a Samba fandango, de Andreas Chamorro, obra que reposiciona as ficções de favela a partir de corpos dissidentes, como travestis, prostitutas e gays, que decidem assaltar um carro-forte e enfrentar uma facção criminosa. Embora o enredo policial componha a superfície, o romance mergulha em linhagens familiares, pactos espirituais, afetos brutais e uma mitologia própria, onde violência e ternura se entrelaçam. Com oralidade vibrante e construção ousada, Chamorro consolida seu lugar entre os autores mais originais do país, renovando o romance urbano brasileiro com vigor e imaginação.

Juntas, as três obras premiadas delineiam um panorama vibrante da literatura queer brasileira em 2025: múltipla, insurgente, inventiva, capaz de reinventar tradições, ampliar imaginários e recentrar vidas que historicamente foram silenciadas.


[27/11/2025 09:40:12]