
Estar com Marcel Proust ou Thomas Mann nas mãos já basta para sinalizar a sofisticação do “leitor”. Pode-se, também, estampar a capa de obras clássicas em bolsas, camisetas ou capinhas de celular. O título vira logomarca; a literatura, commodity. Esse é o Performative Reading, uma maneira de comunicar um luxo silencioso. Nesse imaginário, o livro se torna acessório de status. O comportamento gera, assim, visibilidade.
Especialistas em luxo afirmam que a lógica do “ter” migrou para o “fazer” e evoluiu para o “parecer”. O consumo aspiracional deixou de estar restrito a bolsas icônicas ou carros de alto padrão para se deslocar às experiências que são registradas e compartilhadas, acumulando curtidas. O livro entrou nesse mesmo circuito: de atividade íntima, silenciosa e formadora passa a ser uma vitrine portátil.
Esse movimento não é uma grande novidade, uma vez que já estava em curso há um tempinho. Desde 2021, quando celebridades passaram a liderar clubes de leitura e transformaram a prática em espetáculo, vemos que o livro estava se consolidando um símbolo de status. Na prática, passou a se alinhar às dinâmicas da moda, tornando-se um dispositivo de construção de imagem – mais próximo de um item de luxo ou de um bem “instagramável” do que de uma experiência de pensamento.
O novo luxo é performar. O livro, nessa ótica, já não precisa necessariamente ser lido; basta ser visto. Entre o gesto de folhear uma edição rara e a escolha de posar com um calhamaço em mãos, abre-se uma fissura que diz muito sobre a contemporaneidade: a cultura transformada em vitrine, a intimidade convertida em marketing pessoal. E talvez seja justamente nesse deslocamento que se decide um possível futuro do livro – menos como guardião de memória e mais como signo de distinção em uma sociedade movida pela necessidade de aparecer.
Algo a considerar é o impacto dessa trend no mercado, ou seja, será que as vendas, a visibilidade das obras e a movimentação de novos circuitos de consumo podem se beneficiar? Não de uma maneira vazia, mas com uma proposta de qualificar a tendência, tentando influenciar a leitura efetiva de clássicos. Penso nisso à luz do que o TikTok tem feito por meio de comunidades de leitores. Será que estou sendo otimista ao imaginar essa possibilidade?
Que os leitores me perdoem a acidez da coluna desta semana. É que, como diz Adélia Prado: “De vez em quando Deus me tira a poesia. Olho pedra e vejo pedra mesmo”.
*Lu Magalhães é fundadora do Grupo Primavera (Pri, de primavera & Great People Books), sócia do PublishNews e do #coisadelivreiro. Graduada em Matemática pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), possui mestrado em Administração (MBA) pela Universidade de São Paulo (USP) e especialização em Desenvolvimento Organizacional pela Wharton School (Universidade da Pensilvânia, Estados Unidos). A executiva atua no mercado editorial nacional e internacional há mais de 20 anos.
**Os textos trazidos nessa coluna não refletem, necessariamente, a opinião do PublishNews.
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