Enquanto o mercado brasileiro estava na maravilhosa festa de Paraty discutindo questões importantes sobre o mercado editorial e sobre cultura e leitura, o mundo da Inteligência artificial estava dando voltas e reviravoltas! É impressionante e preocupante como o avanço nesta área é muito rápido, quase impossível acompanhar as notícias. Por isso selecionei algumas mais relevantes (na minha opinião) para compartilhar e refletir.
IA sempre mais presente no mercado editorial
Que a IA é um tema que o mercado editorial está tentando abordar com mais profundidade já não é mais notícia. Na segunda (27), a Conferência profissional Future Book 2023 tratou de temas importantes como audiobook e IA com algumas palestras que valeram a pena, como o Keynote: How publishing can embrace AI, ou o painel How should publishing navigate the evolving AI landscape?, ou em outro painel How AI is impacting audio. Em Paraty, também foram discutidas as questões do avanço da tecnologia no mercado editorial e como usá-la da melhor maneira.
Um caso de uso interessante é o da Springer Nature, que quer se colocar como a primeira editora a usar o GPT para criar livros acadêmicos.
Enfim, aqui no Brasil as coisas vão um pouco mais lentamente no mercado editorial, mas mesmo em meio a muitas polêmicas e pontos a serem esclarecidos precisamos abordar este tema. Eu diria que precisamos conhecer mais sobre este tema.
Falando em conhecer mais, é muito importante que o mercado editorial tome consciência do que outras entidades da sociedade estão tentando fazer para orientar e tentar entender melhor este novo mundo da IA dentro da nossa realidade brasileira.
A Academia Brasileira de Ciências lançou em 9 de novembro o documento “Recomendações para o Avanço da Inteligência Artificial no Brasil”. Este documento foi elaborado por um grupo de trabalho composto por 16 pesquisadores de diferentes áreas do conhecimento, com o objetivo de mapear os desafios para o desenvolvimento de Inteligências Artificiais nacionais e sugerir caminhos para seu uso responsável em diversos setores da sociedade.
Dois pontos me chamam a atenção neste documento:
O documento sublinha a necessidade de uma educação robusta e da capacitação profissional em Inteligência Artificial. É vital reconhecer como o investimento estratégico em educação pode catalisar o crescimento tecnológico e fomentar a inovação no país.
O documento adverte: "Sem investimentos sólidos e políticas públicas consistentes e eficazes, o avanço global em IA poderá conduzir o Brasil a um retrocesso tecnológico sem precedentes."
Diante dessa realidade, proponho um convite à ação, especialmente aos envolvidos no mercado editorial: vamos ir além dos limites do sistema educacional formal e buscar maneiras inovadoras de promover, apoiar e sustentar o aprendizado em IA.
Este aspecto é crucial. O Brasil não deve se limitar a ser um mero usuário de IA, mas também um inovador e desenvolvedor de tecnologias nessa área. Compreender os fundamentos da IA é essencial para a criação de soluções pioneiras e independentes.
Sempre defendo, quando falo de tecnologia, que, não devemos nos restringir ao papel de usuários passivos. É fundamental que todos, independentemente de sua área de atuação, busquem entender como a IA funciona – seus mecanismos, capacidades técnicas e limitações. A necessidade de um conhecimento mais profundo nesse campo é urgente, pois, sem ele, corremos o risco de ser meros espectadores em um cenário de transformações radicais que o mundo está enfrentando.
Embora o documento da ABC não mencione especificamente o mercado editorial, faço um apelo aos profissionais desse setor: não deixem a IA nas mãos apenas de especialistas. Enfrentem o desafio de compreender essa tecnologia em profundidade! Não basta saber usar ferramentas como o ChatGPT ou saber criar prompts; é necessário entender as vastas implicações que a IA acarreta. Caso contrário, ficaremos restritos a opinar e a reagir a polêmicas de maneira superficial.
Quem está mais antenado em questões tecnológicas, já sabe que tramita no senado o Projeto de Lei n° 2338, de 2023 conhecido como Marco legal da IA no Brasil. Este tema é muito importante para todos nós cidadãos porque afeta diretamente o modo como usamos a tecnologia de IA e como o Brasil se colocará no cenário mundial. Além disso, irá influenciar temas importantes como direitos autorais e IA, ética e bom uso destas ferramentas.
O projeto tem como objetivo geral regulamentar o uso da IA no Brasil, visando a proteger direitos fundamentais e garantir a implementação de sistemas seguros e confiáveis. Os objetivos específicos do projeto incluem:
Regulamentar algo que ainda nem sabemos como funciona direito e que não sabemos o que pode fazer é bem complicado. Existem muitas discussões acontecendo no momento e muitos grupos trabalhando em defender uma ideia de IA ética e respeitosa dos direitos já adquiridos, mas ao mesmo tempo que não seja freada.
Entre os os principais desafios de criar uma regulamentação da IA no Brasil estão:
No entanto, é fundamental que o Brasil desenvolva um marco regulatório adequado para garantir o uso ético e responsável da IA. Este é um tema que merece uma um aprofundamento específico, mas por enquanto deixo aqui alguns textos para a leitura que podem ajudar a nos nortear no que está acontecendo:
Não encontrei nenhuma manifestação oficial do mercado editorial sobre o tema. Seria muito importante que também o mundo dos livros se manifestasse sobre a lei.
A OpenAI, uma das empresas pioneiras no campo da Inteligência Artificial e responsável pelo desenvolvimento do ChatGPT, enfrentou recentemente eventos internos que ressoam profundamente no mundo tecnológico. Estes eventos não são apenas uma "novela mexicana" corporativa, mas também um reflexo dos desafios éticos e de transparência que permeiam o setor de IA, temas que já abordamos anteriormente.
Sam Altman, CEO da OpenAI, foi demitido em 17/11 após um aparente desacordo com o conselho da empresa. A demissão de Altman e a subsequente ameaça de saída de uma grande parte da equipe para a Microsoft destacam a importância do capital humano qualificado no desenvolvimento da IA. Este episódio sublinha a rapidez com que a inovação tecnológica pode ser afetada por mudanças internas em empresas líderes, algo que o mercado editorial precisa observar atentamente.
A "novela" da OpenAI exemplifica os desafios éticos e de falta de transparência que enfrentamos na implementação da IA. A situação levanta questões sobre como as decisões tomadas por esses grandes players influenciam as ferramentas e tecnologias disponíveis para o mercado editorial, como o ChatGPT, e a importância de manter-se informado sobre tais desenvolvimentos.
Além disso, o evento na OpenAI reforça a necessidade de compreender as implicações da IA além de sua utilidade prática. Não basta para os profissionais do mercado editorial saber usar ferramentas de IA; é essencial entender as complexidades e repercussões que a tecnologia acarreta em termos éticos e práticos.
Finalmente, após a reintegração de Altman na terça-feira, 21/11, observamos como o cenário tecnológico é volátil e como as empresas de IA, mesmo sem fins lucrativos, podem operar com uma surpreendente falta de transparência. Isso ressalta a urgência de uma compreensão mais profunda e crítica da IA, reforçando o apelo para que o setor editorial não seja apenas um espectador, mas um participante ativo na era da inovação digital.
Vivemos em uma era de transformações tecnológicas aceleradas, onde a compreensão e a adaptação à Inteligência Artificial são essenciais, especialmente no mercado editorial. A rápida evolução da IA, exemplificada pelos recentes eventos na OpenAI, mostra que estamos em um ponto de inflexão, onde o conhecimento e o diálogo são fundamentais para transformar desafios em oportunidades.
O mercado editorial, tradicionalmente focado em palavras e ideias, agora se depara com a necessidade urgente de abraçar e entender a IA. A inovação tecnológica não é uma ameaça, mas uma ferramenta potencialmente transformadora, capaz de ampliar alcances e criar novos caminhos para o conteúdo. Para isso, é crucial que os profissionais deste setor desenvolvam não apenas a familiaridade com ferramentas como o ChatGPT, mas também uma compreensão profunda das implicações éticas, sociais e legais da IA.
As discussões em torno do Marco Legal da IA no Brasil e as orientações da Academia Brasileira de Ciências apontam para uma realidade onde a IA não é um conceito distante, mas uma presença iminente e influente. Por isso, é vital que o mercado editorial não apenas reaja às inovações, mas participe ativamente do diálogo sobre como a IA deve ser moldada, regulamentada e implementada.
Por fim, a capacidade de síntese e uma visão panorâmica sobre os temas e fatos são habilidades indispensáveis para navegar nesta nova era.
Polêmicas podem gerar debates, mas é o conhecimento aprofundado e o diálogo construtivo que resolverão problemas e moldarão o futuro. O mercado editorial deve estar preparado para não apenas acompanhar, mas liderar em uma era definida pela inovação tecnológica, garantindo que a IA seja uma aliada na difusão do conhecimento e na expansão da cultura.
* José Fernando Tavares é especialista em Publicações Digitais e produtos digitais com mais de 14 anos de experiência no mercado editorial, especializado em tecnologia para negócios e Inteligência Artificial para produtividade. Em 2014, fundou a Booknando, empresa especializada em publicações digitais e livros acessíveis. No ano passado, criou a Volyo Audiobooks, focada na produção de audiolivros com uso de Inteligência Artificial. Com formação humanística, busca utilizar a tecnologia para melhorar o mundo. Tem paixão por vinhos e pelo aprendizado diário.
**Os textos trazidos nessa coluna não refletem, necessariamente, a opinião do PublishNews.
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