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Pela igualdade editorial
PublishNews, Henrique Rodrigues, 08/03/2023
Em sua coluna, Henrique Rodrigues sugere estratégias para diminuir a desigualdade na balança de gênero no mundo dos livros

Aproveitamos o Dia Internacional da Mulher para, mais uma vez, nos lembrarmos de que a proporção feminina é muito aquém do que deveria ser na vida editorial brasileira, assim como em, praticamente, todos os setores da sociedade.

Em pleno 2023, temos atrasos seculares no Brasil de questões básicas. Quando ainda é preciso criar leis para distribuição de absorventes íntimos para meninas de baixa renda – espantosamente, há quem seja contra –, algo que já deveria ser política pública há décadas, pensar sobre a disparidade de espaços para manifestações literárias femininas parece quase um luxo. Mas não é.

Se voltarmos um pouco no tempo para o século XIX, às mulheres cabia a função de leitoras dos romances folhetinescos publicados em jornais e revistas (mutatis mutandis, as telenovelas vieram de lá), posteriormente reforçada pela destinatária dos cronistas (“a leitora que me lê agora...”).

Até hoje, no universo leitor há mais mulheres do que homens. Segundo a Retratos da Leitura no Brasil, que é nossa pesquisa mais confiável do setor, a presença feminina entre leitores de literatura é maior que a masculina. Em outro estudo, também realizado pelo Instituto Pró-Livro, dois grandes eventos literários (FLUP e Bienal do Livro Rio) são frequentados majoritariamente por mulheres.

A despeito desse quadro, é sabido que homens sempre publicaram mais.

Algo que me espanta nos últimos anos é notar que o Prêmio Sesc de Literatura, de cuja coordenação faço parte, tem mais homens inscritos do que mulheres. Mesmo sendo gratuita e aberta a todas as pessoas, há mais romances e livros de contos enviados por aspirantes masculinos a uma carreira literária. Conversando sobre o assunto com escritoras de gerações e lugares diferentes do país, voltamos a questões básicas do modus vivendi no qual as mulheres são sobrecarregadas de funções profissionais e domésticas.

Outro ponto, e sobre o qual poderia escrever ainda mais, mas prefiro ouvir das camaradas escribas, são os processos de autossabotagem, a falta de confiança na própria literatura e a ausência de estímulos de pares e outras pessoas próximas para publicar. Há não muito tempo, uma amiga escritora, hoje bastante reconhecida na cena literária, me revelou ter estreado tardiamente na literatura porque tinha um marido que, como primeiro leitor, desqualificava todo texto que ela produzia. Agora é ex, felizmente.

Quando entramos nas questões sociais, a coisa só piora. Para uma menina preta/parda/pobre, o acesso ao status de artista da palavra ainda parece ser um sonho distante. Quantas Carolinas Maria de Jesus temos hoje silenciadas nas favelas Brasil adentro? Nosso desafio é transformar a exceção em regra.

Daí a relevância de movimentos de leitura como o Leia Mulheres (e o Escreva Mulheres), o espaço nos saraus e inúmeras iniciativas que dão protagonismo feminino como autoras. A nós, organizadores de eventos, cabe o cuidado – que deve ser natural e não por cota – para que a proporção de mulheres nas programações seja pelo menos um pouco maior. Há algumas semanas, fizemos a curadoria coletiva do Arte da Palavra – Rede Sesc de Leituras, maior circuito literário brasileiro, cujos participantes, maioria feminina, serão divulgados em breve.

Como disse Virginia Woolf no seu conhecido ensaio “Mulheres e ficção”, publicado em 1929, haveria de chegar um período em que “as mulheres terão o que por tanto tempo lhes foi negado – tempo livre e um quarto só para si”. Continuemos batendo nesta tecla até que não seja mais necessária a escrita de um texto como este aqui.

Henrique Rodrigues é diretor do Instituto Caminhos da Palavra, voltado para a promoção do livro, leitura e escrita. Com mais de duas décadas de experiência na área, é coordenador geral do Prêmio Caminhos de Literatura e curador do Prêmio Pallas de Literatura. Nascido no subúrbio do Rio de Janeiro, formou-se em Letras pela Uerj, cursou especialização em Jornalismo Cultural pela Uerj, mestrado e doutorado em Letras pela PUC-Rio. Já foi atendente de lanchonete, balconista de videolocadora, professor, superintendente pedagógico da Secretaria de Estado de Educação do RJ, coordenador pedagógico do programa Oi Kabum! e gestor de projetos literários no Sesc Nacional. Publicou 24 livros, entre poesia, infantil, conto, crônica, juvenil e romance, tendo sido finalista do Prêmio Jabuti duas vezes. É patrono de duas salas de leitura das escolas públicas onde estudou. www.caminhosdapalavra.com.br

** Os textos trazidos nessa coluna não refletem, necessariamente, a opinião do PublishNews.

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(1888 - 1935)

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