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A primeira visita à biblioteca
PublishNews, Leonardo Garzaro, 14/12/2022
Em sua primeira coluna, Leonardo Garzaro fala sobre o seu primeiro contato com uma biblioteca e sua rotina, quando criança, no local

Foi conversando com a talentosa equipe do PublishNews que decidimos por uma coluna quinzenal sobre bibliotecas, livrarias e eventos literários. Já escrevi muito sobre os livros; falta escrever sobre como eles me encontram. Após algumas caminhadas solitárias, nos fins de tarde, mastigando as frases, cheguei a este primeiro texto. Sim, alguns arquivos deletados, parágrafos reescritos e palavras trocadas. Uma vez que cá estamos, prazer, Leonardo Garzaro. Sou escritor, editor e jornalista. Velejador amador. Apaixonado por mapas antigos. Estaremos juntos semana sim, semana não.

Como frequentador assíduo de livrarias e bibliotecas, cogitei começar narrando alguns dos fatos insólitos que já presenciei entre as estantes de livros. Na livraria Drummond, do Conjunto Nacional, um homem que discretamente lambeu uma página de um livro — e não comprou. Na entrada da Biblioteca Nacional de Buenos Aires, um jogo de amarelinha, riscado no cimento fresco, em referência ao Rayuela, do Cortázar.

Poderia também contar que frequentemente discordo do modo como os livros estão organizados, e, me esquivando dos livreiros, enfio meus livros preferidos na pilha dos mais vendidos (sim, César, fui eu). Também retiro das estantes centrais títulos que supostamente ensinam como enriquecer rapidamente e largo nos fundos da loja. Com o tempo, poderei contar todas essas histórias, e inclusive sobre a vez em que ajudei um vendedor que não localizava o pedido do cliente, interessado em adquirir “o Dom Quixote de Pierre Menard”. Alguém havia feito uma piada que o leitor não entendeu.

Me forcei, contudo, à lembrança da primeira visita a uma livraria ou biblioteca. Brás Cubas que me perdoe: começarei pelo princípio. Se a memória não me engana, foi seguindo a professora Marieliz, na companhia de outros 30 alunos, que debutei, conduzido para um passeio no qual me mostraram estantes de livros, mesas de estudo, uma jovem bibliotecária e o cartão que deveríamos rechear com empréstimos e restituições no prazo.

O primeiro livro retirado foi Tico Tico no Fubá, o qual devolvi após observar as figuras e não ler nada. O segundo, Barulhinho do silêncio, da Sonia Salerno Forjaz, que adorei. Daí em diante, retirar livros, ler e devolver se tornou rotina. Recebi meu primeiro prêmio (um livro de presente por ser o aluno que mais retirava livros), e a primeira multa, aos oito anos: duas semanas suspenso por conta de cinco dias de atraso na devolução de Reinações de Narizinho. A regra era clara: para cada dia de atraso, três dias de suspensão.

Pensar nestes tempos me deixou incrivelmente nostálgico. Para escrever esta coluna, mexi em algumas fotos, me revi com as botas ortopédicas, encontrei o antigo uniforme escolar. Para onde terá ido a bibliotecária? Era uma estudante de Letras que me apresentou o Terra dos homens, do Exupéry. Tenho medo de descobrir que ela se tornou trader de criptoativos. Busquei no Google alguma imagem do Tico Tico no Fubá e só encontrei livros de culinária e música clássica. Quem terá sido o autor do primeiro livro que tentei ler, sem sucesso?

Foi na caixa de cima, da casa dos meus pais, que encontrei meu antigo cartão da biblioteca da escola. E, debaixo dele, o último livro retirado, Contos Fluminenses, do Machado de Assis. Folheei as páginas amareladas, lembrando que li A Cartomante e deixei o resto para depois. Jamais terminei, e não devolvi por achar que faltava uma semana ou duas para concluir. No cartão, consta a data na qual deveria ter retornado: 01.06.1998.

Preciso voltar à biblioteca da escola e devolver o exemplar. Precisarei explicar ao porteiro que, apesar do diploma entregue há 20 anos, ainda tenho obrigações a cumprir naquele prédio. Será a última visita: pela regra, estarei suspenso pelos próximos 72 anos...

Leonardo Garzaro é escritor, editor e jornalista. Paulista, nascido em 1983, fundou diferentes editoras independentes e editou dezenas de livros. Seu primeiro romance, o infantojuvenil O sorriso do leão, teve os direitos vendidos para editoras de seis países, com traduções para o inglês, espanhol, turco e árabe. Alguns de seus contos foram publicados na premiada revista norte-americana Literal Latin Voices. É consultor de literatura brasileira das editoras Interzona, da Argentina; Arlequin Ediciones, do México; e Corredor Sur, do Equador. Lançou em 2022 O guardião de nomes, que foi elencado como um dos melhores romances de 2022 pelo Suplemento Literário Pernambuco.

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