Senti uma vontade imensa de fazer um balanço do ano que passou, ou seja, do período em que me dediquei ao mercado editorial digital. Como aqui vontade é coisa que dá e não passa, a coluna de hoje será uma retrospectiva.

Como todos que vêm me acompanhando por aqui sabem, costumo ver as coisas com “lentes rosas” – aquelas que só enxergam o lado bom das coisas -, logo vou começar pelas vitórias. Nos primeiros meses da dedicação na Gato Sabido, recebíamos um livro a cada três semanas. E cada um conseguido na unha! Fazíamos o que fosse preciso para ajudar as editoras (ok, continuo fazendo, mas agora parece que todo mundo sabe, pelo menos um pouco, a respeito). Reuniões infindáveis, explicações mil, horas de dedicação e no final o saldo era = 1 livro. E depois de umas semanas, mais um livro. E fomos fazendo trabalho de formiguinha. Hoje, as coisas estão mais ágeis: recebemos dezenas de livros na distribuidora por dia – sem gastar as unhas -, as editoras mais novas vêem mais necessidade de agilizar o processo. Sim, as editoras menores têm mais publicações digitais do que as gigantes. Novos autores e editoras, que nem tinham muito espaço no mercado regido pela lista de mais vendidos, estão aparecendo mais.

Pelo lado da editora que abri, a CakiBooks, venho sentindo isso nas vendas, que apresentam aumento de mais de 100% de um mês para o outro. Os contratos de direitos autorais internacionais já estão contemplando a publicação digital; os contratos nacionais já possuem uma cláusula a respeito do digital; o governo está tentando retirar os impostos sobre os tablets e ebooks,... Muitas coisas sendo movimentadas nesse segmento. Engraçado como são as coisas nesses tempos de internet: estou no mercado digital há um ano e me sinto uma veterana. Isso porque vi tudo tão estático e agora vejo novas distribuidoras, novas editoras ganhando espaço, novas obras se destacando, um acervo de mais de 3000 livros em português, crescendo diariamente, para ler em meu leitor digital, e até as obras em Português na Amazon ganhando cada vez mais força... Vejo tudo isso com olhos de anciã orgulhosa..

Bom, mas e o lado ruim?

Continuam as panelinhas editoriais, politicagem e favoritismos; a lentidão de alguns setores de produção vem me surpreendendo – me lembra muito o livro Atlas Shrugged, de Ayn Rand. Os autores querem publicar em ebook, mas sequer consomem o produto digital para experimentar e ter conhecimento de causa nas discussões. Já o governo não passa um direcionamento às editoras em relação à parte fiscal – estamos todos agindo como se fosse um produto impresso: nota de entrada e saída, entrada e saída nos programas de controle estoque... Estoque? Me poupe!!!. Não há um movimento das grandes editoras para fazer o mercado acontecer, muito pelo contrário, vemos um movimento no sentido do atraso do mercado digital – ok, têm tanto estoque para queimar que não custa ficarmos atrás das tendências internacionais em favor dos “coronéis” que produziram café demais. Isso me lembra uma fase da nossa história, não é? Ainda há preconceito com novatos no mercado porque coronel não gosta dessas intimidades.

Pelo que já escrevi até agora, a parte negativa é só um detalhe. Vejo muito mais coisas positivas por aí, vejo muito mais gente que faz, vejo mais parceria do que politicagem.

Não vou cair no clichê de ficar aqui prevendo o futuro. E nem adianta! Mas continuo pelo caminho, só descrevendo e desabafando minhas experiências. Deixo as previsões para os meninos e meninas de exatas... eu sou de produção!

camila.cabete@gmail.com

Agradecimento especial a @souzalaura pela revisão. A ilustração desta coluna é um quadro de Jean-Baptiste Debret.