Mercado global de audiolivros vai crescer 25% por ano nos próximos sete anos, diz relatório da Feira de Frankfurt
PublishNews, Guilherme Sobota, 24/09/2024
Em parceria com o site Dos Doce, pesquisa reuniu dados de diferentes estudos e números globais fornecidos pela Bookwire, numa comparação internacional dos mercados de audiolivros (inclusive em português) com ambição inédita

Divisão da receita global de audiolivros, segundo relatório do Dos Doce e Feira de Frankfurt
Divisão da receita global de audiolivros, segundo relatório do Dos Doce e Feira de Frankfurt
O mercado de entretenimento de áudio (que engloba audiolivros, podcasts, streaming de música e rádio) deve continuar crescendo a uma taxa de 10% ao ano pelo menos até o fim da década, graças às receitas geradas por plataformas de assinaturas, vendas unitárias, empréstimos digitais, vendas no atacado para grandes empresas (como de telefonia) – enfim, com formatos diversificados de fontes de receita. Essa é a conclusão de um relatório elaborado pelo site espanhol DosDoce e divulgado recentemente pela Feira do Livro de Frankfurt, com dados atualizados até 2023, intitulado An opportunity for audiobook global growth beyond English-language markets.

Ao reunir dados de diferentes estudos – como da consultoria Deloitte – e números globais fornecidos pela Bookwire (que distribui mais de 300 mil audiolivros no mundo todo em diferentes línguas), o relatório oferece uma comparação global dos mercados de audiolivros (inclusive em português) com ambição talvez inédita.

O relatório analisa os dados para concluir que, nos últimos 15 anos, o mercado global de audiolivros cresceu em taxas de dois dígitos ano após ano, e atualmente representa US$ 7 bilhões por ano – e vai continuar crescendo para alcançar US$ 35 bilhões até 2030, segundo um estudo da consultoria Grand View Research. Isso significa, de acordo com o relatório, que o mercado global vai crescer 25% por ano nos próximos sete anos, enquanto que a indústria do livro físico deve crescer em média 2% ao ano.

Outro paper do Center for Technology, Media and Telecommunications da Deloitte compilado no estudo aponta que 270 milhões de pessoas vão ouvir um audiolivro em um mês em 2024, um aumento de 15% na audiência ano a ano. A consultoria também prevê que os audiolivros vão se tornar aproximadamente 6% da receita global com livros, com acréscimo de 26% no ano.

“Esse impressionante crescimento no consumo de conteúdo em áudio tem sido acompanhado pelo investimento e dinamização de uma ampla gama de plataformas de streaming, como Audible, Spotify, Storytel, Podimo, Nextory, BookBeat, Scribd, YouScribe, Skeelo, entre outras, que estão impulsionando o crescimento dessa indústria com a introdução de novos modelos de negócios, baseados em planos de assinatura, planos limitados por horas, vendas unitárias, vendas no atacado por meio de parcerias com grandes empresas, como operadoras de telefonia”, diz o relatório. “Também é importante mencionar o papel das plataformas de empréstimo digital de bibliotecas, como Overdrive, Hoopla, DeMarque, Odilo, entre outras, na dinamização da indústria de audiolivros, especialmente em mercados onde o poder aquisitivo dos ouvintes é mais limitado do que nos mercados anglófonos”.

O relatório pode ser acessado aqui (em inglês).

Mercado em português

O mercado de audiolivros em português é um dos menores em comparação com outros idiomas analisados. Existem cerca de oito mil audiolivros em português de mais de 100 editoras que publicam conteúdo em áudio nesse idioma. As principais editoras que publicam nesse formato são Leya e Porto Editora em Portugal, juntamente com Companhia das Letras, Livro Falante e Universo dos Livros no Brasil, entre outras, segundo o relatório.

Embora existam editoras e plataformas de streaming, como Audible e Ubook, que fazem grandes esforços de investimento nesse formato, por enquanto menos de 500 novos audiolivros em português são publicados a cada ano – lembrando que o relatório contém dados até 2023. “Uma taxa de produção muito baixa para impulsionar a indústria de áudio”, segundo a análise.

O faturamento da indústria de audiolivros em português (somando Brasil e Portugal) gira em torno de 30 milhões de euros por ano (cerca de R$ 180 milhões). Os principais players da indústria de áudio que operam nesse mercado são Audible, Storytel, Kobo e Ubook.

Assim como nos mercados francês e espanhol, as editoras consultadas para o relatório indicaram que 85% de suas receitas de áudio vêm de plataformas de assinatura, 12% de canais de vendas unitárias e apenas 3% do canal de bibliotecas.

Menos de 5% dos audiolivros em português são adquiridos ("viajam") fora do Brasil e Portugal. “Esse é um número muito baixo, considerando que é um idioma falado por mais de 250 milhões de pessoas no mundo. O fato de que mais audiolivros em português são vendidos nos Estados Unidos do que em Portugal indica o grau de imaturidade do mercado de audiolivros em Portugal”, explica a análise.

Para Antonio Hermida, head de áudio na Bookwire Brasil, o relatório apresenta uma análise bastante animadora para os mercados emergentes, em especial para a língua portuguesa.

“Sendo este um dos menores (comparado às outras línguas analisadas), com menos de oito mil títulos disponíveis, apesar de incipiente, apresenta um enorme potencial de crescimento, especialmente no Brasil, onde alguns fatores se destacam, como, por exemplo, o tamanho do mercado quando colocado lado a lado com outros países falantes de português; a quantidade de players já em operação; programas de governo e incentivos, além de parcerias com empresas de telecomunicações”, diz Hermida ao PublishNews.

“Além disso, as IAs vêm ganhando corpo (não apenas em modelos, mas falando do léxico de nossa língua) possibilitando já a conversão de todo um espectro de catálogos que, de outra forma, estariam relegados a um futuro sempre adiável. Ou seja, através da adoção de novos modelos de negócio, aprimoramento de canais de distribuição e o uso de tecnologias emergentes, já temos em mãos as ferramentas essenciais para impulsionar esse mercado nos próximos anos”, diz o especialista.

Pedro Sobral, presidente da Associação Portuguesa de Editores e Livreiros (APEL) e diretor editorial do Grupo Leya, indicou no relatório que "o mercado de audiolivros está em seu início em Portugal, mas crescendo ano após ano, gerando oportunidades de negócios". Em relação aos principais desafios, Sobral destacou "a pirataria e a violação de direitos autorais por empresas de Inteligência Artificial como uma das principais ameaças, assim como as ferramentas de IA se tornando criadoras de conteúdo fora do setor editorial".

Formas de consumo

O relatório também aponta para o domínio das plataformas de assinatura entre as formas de consumo de audiolivros ao redor do mundo – em alguns casos, como nos mercados em língua portuguesa e alemã, ele representa cerca de 85% das receitas. Vendas a la carte e bibliotecas digitais aparecem como alternativas. Um dos fatores atribuídos para este número pelo relatório é o de que já existe nestes países uma cultura muito forte de pagamentos de assinaturas digitais.

Comparação entre as principais formas de consumo de audiolivros nos diversos mercados | © Dos Doce / Feira de Frankfurt
Comparação entre as principais formas de consumo de audiolivros nos diversos mercados | © Dos Doce / Feira de Frankfurt
Novos modelos

O paper ainda aborda novos modelos de negócios que se consolidam mundo afora – como a estratégia do Spotify, de vender um plano de assinatura com horas limitadas de consumo, e do Skeelo, empresa brasileira que opera no modelo B2B2C, tendo como clientes diretos grandes empresas de telefonia e outras, que então repassam os livros digitais para os consumidores finais.

A empresa é reconhecida ali por oferecer “uma das melhores soluções de leitura da América Latina”.

“A missão do Skeelo é ser a maior plataforma e comunidade de leitura do mundo, replicando o sucesso que já temos no Brasil em outros idiomas dominantes, como o espanhol e o francês”, diz no report o CEO da empresa, Rodrigo Meinberg.

Inteligência artificial

Por fim, o relatório repassa algumas das principais discussões sobre o uso de inteligência artificial na produção e distribuição de audiolivros – e os relatos mais recentes dão conta de modelos de produção híbridos, em que a voz humana tem diversas vantagens e preferências, mas sem deixar de lado possibilidades dos modelos de tecnologia.

Uma das preocupações diz respeito a aplicativos que já transformam textos escritos (a partir de formatos como os PDFs) em arquivos de áudio.

"Como em qualquer outra indústria criativa, a indústria de audiolivros é um negócio dos detentores de direitos”, explica a especialista na história da leitura oral e autora do livro La voz de los libros (Aguilar/PRH, 2024), Maribel Riaza. “Podemos nos deparar com a situação em que alguém adquire um livro digital legalmente, mas depois o carrega no aplicativo mencionado ou em outro semelhante e o transforma em formato de áudio, sendo este um formato pelo qual o proprietário dos direitos não receberá nenhuma compensação econômica. Sem dúvida, como já aconteceu em outras ocasiões ao longo da história do mercado editorial e dos livros, a tecnologia acabará por fornecer respostas aos problemas que ela cria, talvez estabelecendo filtros nos próprios arquivos que impeçam sua reprodução sem a devida autorização", indicou.

[24/09/2024 10:13:52]