No poema Boitempo, Carlos Drummond de Andrade faz um resgate da sua infância rural. Fazendo uma analogia, quando Ivana Jinkings decide fundar a sua editora, em 1995, e dá a ela o nome de Boitempo, ela também resgatava o seu passado. Nascida em Belém do Pará, filha de Raimundo Jinkings, Ivana “praticamente nasceu” em uma livraria. Três anos depois do seu nascimento de fato, seu pai, um líder comunista perseguido pela ditadura, perde o emprego e cria uma pequena livraria – inicialmente instalada na casa onde a família morava. Anos antes, o pai também tinha empreendido uma pequena editora e dado a ela o nome de Boitempo. Era um disfarce, dando um nome poético a uma editora que publicava livros perseguidos: publicou Mao Tsé-Tung, por exemplo.
Ivana, que nesta semana está no PublishNews Entrevista – programa que quer resgatar a memória editorial brasileira – reconhece que ao decidir pelo nome quis mais homenagear o pai do que o próprio poeta.
Há 25 anos, quando fundou a Boitempo, Ivana tinha em mente a publicação de livros raros, inéditos em português ou cujas edições brasileiras estavam esgotadas. Foi assim com os primeiros livros: Napoleão, de Stendhal, e Carta ao pintor moço, correspondência inédita de Mário de Andrade ao pintor Enrico Bianco.
Quando publica O mistério de fazer dinheiro, livro de sociologia do trabalho escrito pela irmã, Nise Jinkings, a Boitempo dá uma guinada na sua linha editorial. Depois de publicar o título, Ivana é procurada pelo sociólogo Ricardo Antunes, professor da Unicamp, que passa a coordenar a Mundo do Trabalho, a coleção mais antiga da editora.
Ivana decide publicar livros que estavam, de certa forma, ligadas à história de sua família. “Sem que eu tivesse planejado, a Boitempo foi se dirigindo mais para uma linha política”, disse na conversa com André Argolo. Em 1998, publica a edição comemorativa dos 150 anos do Manifesto comunista. “Marx estava fora do ambiente acadêmico e a Boitempo, àquela altura, estava fazendo uma inserção maior no público acadêmico e universitário. E eu me lembro bem de professores me questionando: ‘mas você vai publicar Marx? Ninguém mais está lendo Marx’. E essa nossa edição foi muito bem e, a partir dela, veio a ideia de fazer uma coleção, que hoje é a principal coleção da Boitempo, inclusive comercialmente”, disse. Com esse movimento, a editora criou uma demanda por estas leituras.
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