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Fechamento da Oyster não tem nada a ver com a viabilidade da assinatura de e-books
PublishNews, Mike Shatzkin, 25/09/2015
Não é que a assinatura fracassou, mas que um ator de negócios puramente de livros faliu

A notícia de que a empresa de assinaturas de e-books Oyster está jogando a toalha não foi realmente uma surpresa. O modelo de negócio que foram forçados a adotar pelas grandes editoras – pagar o preço total para cada uso de um livro com um gatilho de pagamento a bem menos que uma leitura completa enquanto, ao mesmo tempo, oferecendo aos consumidores uma assinatura mensal que não cobria a venda de um livro, muito menos dois – era inevitavelmente pouco lucrativa. A esperança deles era que iriam construir uma audiência grande o suficiente para que as editoras se tornassem dependentes, de alguma forma, deles (pelo menos da renda que produziriam) e concordariam com termos diferentes.

Seria um erro interpretar o fechamento da Oyster como uma clara evidência de que “assinaturas para e-books não funcionam”. Claro que isso pode funcionar. Safari tem sido um negócio bem-sucedido e lucrativo por quase duas décadas. A 24Symbols da Espanha está operando um serviço de assinatura de e-books, principalmente fora dos EUA e principalmente em outros idiomas além do inglês, há vários anos e exclusivamente com dinheiro de investidores. Scribd tem publicamente (e um pouco desastrosamente, na minha opinião) ajustado seu modelo de assinatura para acomodar o que eram segmentos pouco lucrativos em e-books de romance e audiobooks. Mas a inferência seria que para outros segmentos o modelo de negócios está funcionando bem. E também está o Kindle Unlimited da Amazon, que é sui generis porque eles controlam muitas partes, incluindo a decisão mais ou menos unilateral de quanto vão pagar pelo conteúdo.

O que parecia óbvio para muitos de nós dede o começo, no entanto, era que uma oferta de assinatura para livros gerais não poderia funcionar no atual ambiente comercial. As Cinco Grandes editoras controlam a parte dos livros comerciais que qualquer serviço geral iria precisar. Todas essas editoras operam em termos de “agência”, o que torna extremamente difícil, se não impossível, que um serviço de assinaturas disponibilize esses livros a menos que a editora permita. Os termos que as editoras exigiam para participar nos serviços de assinaturas, que eram, aparentemente, o pagamento total pelo livro depois que uma certa porcentagem tenha sido “lida” por um assinante, combinada com um número limitado de títulos oferecido (não os lançamentos), faz com que a oferta de assinatura seja inerentemente pouco lucrativa.

As editoras veem as ofertas de assinatura como um negócio arriscado para livros que estão atualmente vendendo bem à la carte. Não só ameaçariam essas vendas, ameaçam transformar os leitores de compras à la carte em usuários de serviços de assinatura. Para as editoras, parece outra Amazon em potencial: um intermediário que controlaria os olhos dos leitores e com força cada vez maior para reescrever os contratos.

Então eles só participaram de uma forma limitada. A Penguin Random House (a maior e sozinha com metade dos livros mais comerciais) e o Hachette Book Group nem fizeram a experiência com os serviços de assinatura, apenas com a Amazon. HarperCollins, Simon & Schuster e, de forma menos extensa, a Macmillan, participaram de forma muito limitada. Múltiplas motivações levaram à participação que aconteceu. O principal estímulo, provavelmente, foi simplesmente enfrentar a Amazon. Ter clientes aninhados em qualquer lugar, exceto perto do monstro de Seattle, pode parecer uma boa ideia para a maioria das editoras. Mas deveria receber pelo menos parte desse dinheiro de investidores colocado em modelos de negócios com poucas chances de funcionar antes de terminar. E como as editoras é que decidem quais livros incluir, poderiam escolher títulos de catálogo que não estavam gerando muito dinheiro e que poderiam se beneficiar da “descobertabilidade” dentro do serviço de assinatura.

(Carolyn Reidy, a CEO da Simon & Schuster, deu essa dica em seu discurso na semana passada durante o BISG Annual Meeting onde mencionou especificamente o valor da descoberta que S&S viu acontecer nas plataformas de assinatura.)

Mas nem todos os serviços de assinatura eram iguais. O estabelecido Safari está em um nicho de mercado, servindo principalmente a clientes B2B em empresas de tecnologia. (Eles recentemente fizeram uma expansão na oferta porque trabalhadores da Boeing e da Microsoft não precisam apenas de livros sobre programação; também são pais e cozinheiros e jardineiros então não-ficção de interesse geral pode ter um apelo para eles. Mas essa não é a base do negócio da Safari e não estão tentando oferecer ficção.) O Scribd foi criado como um tipo de “YouTube para documentos” que o negócio de assinatura de e-books tanto construiu quanto aumentou. Para a Amazon, o Kindle Unlimited só deu a eles outra forma de fazer transações com o cliente do livro e outra saída para o conteúdo exclusivo de conteúdo para Kindle.

Só Oyster e outra start-up criada simultaneamente, Entitle (que tinha uma proposta que parecia mais um clube do livro do que um serviço de assinatura), estavam tentando transformar o fluxo de renda alternativa em um negócio independente. A Entitle faliu antes da Oyster. Librify, outra variação sobre o mesmo tema, foi comprada pelo Scribd.

Então o fracasso da Oyster é, na verdade, outra demonstração de uma “nova” realidade sobre a edição de livros, exceto que não é nova. A edição de livros — e a venda de livros — não são mais negócios independentes. Publicar e vender livros são funções, e podem ser complementares a outros negócios. E como adjuntos a outros negócios, não precisa realmente ser lucrativo para ser valioso. O que isso significa é que entidades tentando tornar os negócios lucrativo – ou pior, exigindo que seja lucrativo para sobreviver – começam com uma forte desvantagem competitiva.

A Amazon é grande mestre em tornar essa realidade bem óbvia. Lembramos que eles começaram como “loja de livros” e nada mais. Baseavam-se nos depósitos da Ingram no Oregon para permitir a existência de seu modelo de negócios, que era receber o pedido de um livro e aceitar pagamento, depois pegar esse livro da Ingram e enviar ao cliente, um pouco depois pagar a conta da Ingram. Esse modelo de fluxo de caixa positivo era tão brilhante que a Ingram poderia ter rapidamente permitido muitas cópias, e eles formaram uma divisão chamada Ingram Internet Support Services para fazer exatamente isso. Então a Amazon matou essa ideia ao cortar seus preços para o nível mais baixo possível e desencorajou outras pessoas a entrarem no jogo. Isso foi no final dos anos 1990.

Conseguiram fazer isso porque a comunidade financeira já tinha aceitado a estratégia da Amazon de usar livros para construir uma base de clientes e medir as perspectivas futuras dos negócios por LCV – o “lifetime customer value” das pessoas com quem faziam negócios. E ficou bastante claro rapidamente que podiam vender aos leitores de livros outras coisas, por isso vendas com baixa ou nenhuma margem era simplesmente uma tática de aquisição de clientes. Foi um jogo que a Barnes & Noble e a Borders não puderam disputar.

Agora as vendas de livros e e-books representam quase certamente apenas uma porcentagem de um dígito do total da renda da Amazon. Kindle Unlimited, como seus empreendimentos editoriais e ofertas de autopublicação, são pequenas partes de uma organização poderosa que possui muitas formas de ganhar com cada cliente que recrutam.

O Scribd não é tão poderoso quanto a Amazon, mas começaram com uma rede de criadores e consumidores de conteúdo. Isso deu a eles uma vantagem de marketing sobre a Oyster – nem todo cliente precisava ser adquirido a um custo alto já que muitos clientes potenciais já estavam “dentro da tenda”. Mas também deu a eles alguma estabilidade. Sobrancelhas foram levantadas recentemente quando o Scribd colocou os freios no empréstimo de romances e audiobooks. Mas ajustar o modelo de negócio para essas áreas verticais simultaneamente deixa aberto que o modelo na verdade está funcionando em outros nichos.

Podemos ver isso acontecendo de uma forma muito mais limitada nas lojas Barnes & Noble, onde os livros estão sendo substituídos nas prateleiras por brinquedos e jogos. Mas não é provável que haja diversificação suficiente no longo prazo. Certamente a B&N não vai chegar ao mesmo patamar da Amazon, onde bem mais de nove de cada dez dólares vem de algo que não são os livros. E a Barnes & Noble não está nem perto da Amazon: onde o lucro das vendas de livros é incidental se eles trouxerem novos clientes e também mantiverem a lealdade.

A história sobre a Oyster, ainda incompleta por enquanto, é que boa parte de sua equipe de gerência está indo para a Google, que, na verdade, “comprou” a empresa para tê-los. O Google parece estar tentando eliminar a ideia de que compraram a Oyster, só contrataram a equipe da Oyster. Obviamente, o Google se encaixa na descrição de uma empresa com muitos outros interesses nos quais os livros podem ser uma parte. No começo, tudo se resumia a buscas. Agora tudo tem a ver com o ecossistema Android e venda de mídia no geral. Um negócio de assinatura de e-books, ou até um negócio de assinatura de conteúdo, poderia fazer sentido no mundo do Google. Mas seria algo relativamente menor para eles. Meu palpite, e é só um palpite, é que eles estão pensando em algo mais do que um mero “serviço de assinatura de livros” e querem usar a equipe da Oyster nisso. Observadores mais inteligentes do que eu parecem acreditar que o pessoal que o Google recrutou vai fornecer conhecimento sobre a leitura móvel e a tecnologia de descoberta da Oyster. Claro, isso é informação essencial para o Google.

Da mesma forma, a Apple, que agora tem um serviço de assinatura para música, também poderia pensar em fazer um para livros – ou para toda a mídia – no iOS em algum momento. Eles não têm as vantagens da Amazon – uma grande quantidade de propriedade intelectual que controlam – mas seu negócio é criar um ecossistema no qual as pessoas entram e não querem sair. A assinatura de livros poderia aumentar isso.

Mas o ponto central que eu tiraria disso não é que a assinatura fracassou, mas que um ator de negócios puramente de livros faliu. Uma pergunta óbvia que provoca é quando vamos ver alguns sinais de sinergia entre Kobo e seus donos na Rakuten, que presumivelmente têm ambições mais ao estilo da Amazon, mas não parecem ter usado o negócio de e-book para ajudá-los a seguir nessa direção.

E o que é verdade nas livrarias também é verdade na publicação de livros, como observamos nesse espaço há algum tempo. Tanto a publicação quanto a venda de livros vão se tornar, cada vez mais, complementos a empreendimentos maiores e cada vez menos atividades isoladas às quais as empresas podem se dedicar para ter lucro.

O The New York Times publicou um artigo de primeira página afirmando essencialmente que a onda dos e-books acabou, pelo menos por enquanto, e que o negócio dos impressos parece estável. Isso é uma ótima notícia para editoras se a tendência for real. Infelizmente, alguns poucos pontos importantes foram ou suprimidos ou ignorados, e poderiam minar a narrativa.

Um é que, enquanto as editoras informam as vendas de e-books como porcentagem do total de vendas de livros com resultados regulares ou levemente em declínio, a Amazon afirma (e Russell Grandinetti foi citado no artigo) que as vendas de e-books deles está crescendo. Assumindo que tudo isso é verdade, é talvez a diferença da migração das vendas das editoras (cujas vendas seriam informadas pelas estatísticas da AAP) e passando para títulos independente mais baratos disponíveis somente através da Amazon (quais vendas não passam por ela?).

Outro é que as editoras estão aumentando os preços em e-books. Toda a resistência às vendas criada por preços mais altos resulta em vendas de impressos, ou parte disso faz com que o livro seja rejeitado por algo mais barato? Em outras palavras, poderia ser que as vendas totais de muitos títulos sejam menores do que as procuravam antes? (Pelo menos um agente me diz que é isso.)

E outra é que o ressurgimento das livrarias independentes ocorreu nos anos seguintes à falência da Border’s e a mudança para uma mistura de vários produtos na Barners & Noble. Vale a pena perguntar se as independentes são beneficiárias temporárias de uma súbita deficiência de espaço nas prateleiras ou se estamos realmente vendo não só um aumento na leitura de impressos, mas um renovado interesse dos leitores de livros em ir às livrarias para comprar um impresso. Essa pergunta não está colocada nesse post.

(Tradução de Marcelo Barbão)

Mike Shatzkin tem mais de 40 anos de experiência no mercado editorial. É fundador e diretor-presidente da consultoria editorial The Idea Logical Co., com sede em Nova York, e acompanha e analisa diariamente os desafios e as oportunidades da indústria editorial nesta nova realidade digital. Organiza anualmente a Digital Book World, uma conferência em Nova York sobre o futuro digital do livro. Em sua coluna, o consultor novaiorquino aborda os desafios e oportunidades apresentados pela nova era tecnológica. O texto de sua coluna é publicado originalmente em seu blog, The Shatzkin Files.

** Os textos trazidos nessa coluna não refletem, necessariamente, a opinião do PublishNews.

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