No espaço de uma semana percorri um arco que saiu do Platinum Ballroom do Marriot de Frankfurt e chegou no sobrado do seu Eraldo, no Morro da Conceição, Rio de Janeiro. Entre um gole de Paulaner Hefeweißbier tépida e de uma Itaipava gelada, vivenciei discussões sobre o livro, em níveis discrepantes — de orçamento e de paixão.
O TOC (Tools of Change) de Frankfurt atraiu de editoras estabelecidas a startups quixotescas, todas querendo se manter a par e à frente das irriquietas mudanças tecnológicas na área da publicação. Se ainda persiste a noção de que passamos por uma revolução, que pode pôr por terra os Golias da edição tradicional e coroar os Davis digitais, essa noção já não causa tanta angústia (nos primeiros) e frisson (nos segundos). Ao fim das 30 apresentações (ou das que consegui assistir), o sentimento geral já não era “como faço para virar uma nova Amazon?” — mas sim “como faço para ter uma relação economicamente saudável com a Amazon?”.
Assim, uma das apresentações mais concorridas (e interessantes) foi a que tratou de “quanto podemos cobrar das pessoas pelos e-books?”. Por mais farisaica que seja a pergunta, o debate, conduzido por Edward Nawotka, gerou uma reflexão sadia sobre o papel do editor em levar o conteúdo ao leitor (papel que foi tão vilipendiado, por mim inclusive). Do lado menos “empresarial” e mais “aventureiro”, foi revigorante ver novas ideias apontando novos caminhos para o povo que vive do livro. Na mesa, revezaram-se a Pubslush (uma forma inteligente de conectar autores a leitores pelo crowdfunding), a & Other Stories (uma proposta ao mesmo tempo inovadora e “pura” de editora em tempos digitais, sobre a qual falarei adiante) e a Unglue.it (uma tentativa capitalista-libertária de “descolar” livros, que me pareceu mais um ideal que uma ideia).
Podem-se traçar algumas tendências, a partir da sinfonia de palestras e do zumzum dos coffee breaks. Uma certa síndrome de Estocolmo (amor e ódio) dos editores em relação à Apple e à Amazon; a sensação de que a margem de mercado de e-books vai deixar para trás a euforia e alcançar um platô, ou crescer vegetativamente; uma certa corrida para ver quem coloniza digitalmente os mercados emergentes, tanto os filés como o Brasil quanto a periferia remota; e — no que me pareceu o assunto e negócio mais promissor — a administração de bibliotecas digitais pessoais ultra-loja. Em outras palavras: a possibilidade do leitor consolidar, em uma única biblioteca virtual, todos os seus livros, tenham sido eles comprados na Apple, Amazon, Kobo ou na papelaria da esquina (ou mesmo pirateados). Isso, é claro, vai contra cada uma dessas empresas, e depende da abolição da algema do DRM (que mantém cada livro aferrado a uma plataforma ou aparelho). A Apple fez isso com o iTunes Match, pareando todos as músicas do usuário, mesmo as pirateadas, com ACCs cristalinos. Porém isso é privilégio de quem domina um mercado (o da música). No mercado do livro, onde há outros cachorros grandes como a Amazon, a Google e a Kobo, vai haver muito ranger de dentes. No entanto, a tendência, claramente verificável, de passar a considerar a leitura de um bem ou propriedade para um direito ou posse, vai criar, nos leitores, a demanda de um serviço consolidado. Se essa demanda do cliente vai ser atendida pela indústria, apesar dos peso-pesados, é algo a se conferir na próxima TOC.
A coluna está acabando e ainda não consegui falar da Feira de Frankfurt, dos planos do Brasil como homenageado em 2013, da tensão da chegada da Apple, Amazon, Google e Kobo no Brasil. Também não consegui falar sobre nenhuma das maravilhas do evento FIM DO LIVRO, que acabou no domingo — e este renderia uma saga, não uma coluna. Mas prometo colocar a conversa em dia semana que vem, antes da próxima aventura literária-digital, daqui a pouco, na ePorto Party da FLIPORTO.
Julio Silveira é editor, escritor e curador. Fundou a Casa da Palavra em 1996, dirigiu a Nova Fronteira/Agir e hoje dedica-se à Ímã Editorial, no Brasil, e à Motor Editorial, em Portugal. É atual curador do LER, Festival do Leitor.
** Os textos trazidos nessa coluna não refletem, necessariamente, a opinião do PublishNews.
A Alta Novel é um selo novo que transita entre vários segmentos e busca unir diferentes gêneros com publicações que inspirem leitores de diferentes idades, mostrando um compromisso com qualidade e diversidade. Conheça nossos livros clicando aqui!
Mais de 13 mil pessoas recebem todos os dias a newsletter do PublishNews em suas caixas postais. Desta forma, elas estão sempre atualizadas com as últimas notícias do mercado editorial. Disparamos o informativo sempre antes do meio-dia e, graças ao nosso trabalho de edição e curadoria, você não precisa mais do que 10 minutos para ficar por dentro das novidades. E o melhor: É gratuito! Não perca tempo, clique aqui e assine agora mesmo a newsletter do PublishNews.
Precisando de um capista, de um diagramador ou de uma gráfica? Ou de um conversor de e-books? Seja o que for, você poderá encontrar no nosso Guia de Fornecedores. E para anunciar sua empresa, entre em contato.
O PublishNews nasceu como uma newsletter. E esta continua sendo nossa principal ferramenta de comunicação. Quer receber diariamente todas as notícias do mundo do livro resumidas em um parágrafo?