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Autopublicação: qual é o negócio do livro?
PublishNews, 26/07/2012
Autopublicação: qual é o negócio do livro?

As soluções e problemas para os autores com a entrada de megaeditoras na autopublicação

O anúncio da aquisição da Author Solutions pela Penguin na semana passada deixou muita gente com a pulga atrás da orelha. Qual seria o interesse do venerando grupo editorial, que parecia escolher tão bem seus parceiros, na empresa de autopublicação? Que sinergia haveria entre a Pearson, o conglomerado por trás da Penguin, líder da publicação em língua inglesa e mastodonte do mercado educacional, e a ASI, dona da Author Solutions e de uma penca de marcas, todas tirando sua receita não da venda dos livros, mas do bolso dos postulantes a escritores, que pagam por serviços que vão desde o registro do ISBN até uma campanha publicitária?

Na coletiva de imprensa, os CEOs de cada empresa fizeram questão de marcar a aquisição como um rito de passagem. “A Penguin está dando um selo de aprovação para o setor da autopublicação”, disse Kevin Weiss, da AS. Já o presidente da Penguin, John Makinson, teve que se esquivar da desconfiança e afirmou que a reputação de seletividade da sua editora não vai sair manchada com o esquema “pagou-publicou” da firma recém-adquirida. “Não estamos preocupados. A Penguin está associada à seleção editorial e a padrões, e, ainda que a Author Solution esteja usando filtros diferentes,” [maneira britânica de dizer que a AS não usa filtro algum] “eles estão permitindo que mais escritores encontrem seus leitores”.

Uma leitura que se pode fazer dessa operação é que as editoras tradicionais estão atentas ou, pelo menos, incomodadas com a expansão da autopublicação. Já em 2008, a Author Solutions afirmava que respondia por 1 em cada 15 livros publicados nos Estados Unidos. É um mercado em pleno florescimento. O próprio Makinson verbalizou: “nós tentamos acompanhar o jogo […] a Penguin tem olhado para o mercado da autopublicação com crescente respeito e admiração”.

É preciso reconhecer que a própria Penguin foi uma das pioneiras, entre as grandes editoras, a experimentar com o selfpublishing. Seu site Book Country promete uma “comunidade de escrita”, com postulantes a escritores mostrando seus trabalhos mutuamente, e acena com uma (remota) possibilidade de profissionalização — para escamotear um serviço, pago, de autopublicação.

De qualquer modo, o Book Country é um passo adiante (ainda que mal dado) em relação ao Author Solution, que se limita, sem muitos pudores, a oferecer uma tabela de serviços editoriais, onerosos, sem preocupação em “socializar” ou dar visibilidade ao livro ou o autor.

Por isso, fica difícil concluir que a Penguin tenha feito um bom negócio ao adquirir a AS por U$ 116 milhões, mais do que ela fatura por ano (e 30 vezes seu lucro líquido). A verdade é que com uma googlada rasteira o candidato a escritor encontra opções muito mais interessantes para publicar seu livro, incluindo as que oferecem apuro gráfico e outras dedicadas ao digital, mais baratas ou de graça. Não é coincidência que a internet pulule de autores/clientes insatisfeitos (com a AS e com outros sites que vendem serviços editoriais a aspirantes a escritores).

O aspirante a escritor, ou qualquer um que tiver uma ideia para oferecer ao mundo, fará uma opção mais inteligente se for atrás de sites e projetos que se propõem a publicar, mas não necessariamente a produzir livros. O paradigma vigente ainda determina que a forma “nobre” de se disseminar um romance ou um ensaio é o volume impresso. Mas certamente este já não é o mais eficiente, especialmente quando se considera um livro editado em um site de autopublicação, onde a maioria dos títulos são lançados… para o ostracismo (com raras e espetaculares exceções). Uma proposta como a que a Kobo acaba de lançar, por exemplo, já tenta empregar os recursos da “sociabilização” social como forma de dar visibilidade à escrita, apoiando o autor até que seu original esteja maduro para ser publicado e comercializado… exclusivamente na forma de e-books.

O digital está franqueando novas ferramentas, derrubando barreiras (custos, distribuição) e criando um novo meio ou suporte que, com o tempo, vai se descolar do livro (assim como a televisão deixou um dia de ser “um rádio com imagens” para se tornar outra linguagem, ou quando o cinema evoluiu de um simples “teatro filmado” e ganhou vocabulário próprio). É curioso, senão tentador, pensar que o e-book pode ser o primeiro meio de comunicação que não exigirá grandes recursos do criador, e portanto, teoricamente, não terá restrições de entrada. É preciso uma grande equipe e um grande orçamento para se fazer um filme, e até para se gravar uma música faz-se necessário um aparato custoso. Um livro (ou melhor, um pós-ebook) requererá basicamente uma ideia, um autor alfabetizado, e um computador conectado à grande rede. É quase como um daqueles livretos da “geração mimeógrafo” que se vendia nos bares do Rio nos anos 1970 — só que agora o mundo é um Baixo Leblon só. O status atual já permite que um indivíduo suba, gratuitamente, um ePub, que pode ser comprado e lido por virtualmente qualquer habitante do planeta.

Uma possível consequência perversa dessa “individualização” radical da produção literária será a obscuridade extrema. Quando todos se publicarem, e quando o que todos publicarem estiver ao alcance de todos, o que valerá a pena ser lido? Melhor dizendo: o que valerá alguma coisa, monetariamente? “Zero é um preço alto demais para um livro autopublicado”, disse o editor Andrew Franklin, que defendeu a classe dos editores da ameaça da obsolescência.

Eu arrisco um palpite de que uma nova classe de ebooks se consolidará como novo meio de expressão, um que requererá mais do que um autor solitário e quixotesco — exigirá um aparato considerável. Serão livros vivos, que trarão recursos sociais e interligações e embutirão, no texto, mídias diferentes para contar história (mas essa não serão meros penduricalhos, como na época da moda do “multimidia”). Por conta desse grau de elaboração, sua produção terá de ser restrita a organizações, que tenham ou amealhem os recursos necessários. Se eu tiver que dar um chute, acho que o que se faz, hoje, de mais parecido com esse ebook de amanhã, seriam os TEDBooks: curtos, ágeis, socio-imbricados, comunitários, empregando recursos digitais e midiaticos de forma coerente e construtiva.

Seja como for, nossa geração está desfrutando da rara oportunidade de testemunhar o nascimento de um novo meio, uma nova forma de expressão — e os mais espertos entre nós podem contribuir para dar seu formato definitivo. Como disse o presidente da Author Solutions, “essa é a melhor época de todas para se ser escritor”. Eu acrescentaria que é também, no mínimo, uma época instigante para os leitores.

Julio Silveira é editor, escritor e curador. Fundou a Casa da Palavra em 1996, dirigiu a Nova Fronteira/Agir e hoje dedica-se à Ímã Editorial, no Brasil, e à Motor Editorial, em Portugal. É atual curador do LER, Festival do Leitor.

** Os textos trazidos nessa coluna não refletem, necessariamente, a opinião do PublishNews.

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