
Após cinco anos como CEO da Penguin Random House USA — um dos maiores grupos editoriais do mundo —, em 2024 Madeline decidiu que era o momento de inovar e seguir em outra direção. Na companhia de outros dois executivos do mercado editorial, fundou a Authors Equity, editora dedicada a reformular o relacionamento entre autor e editor, e com um modelo centrado em princípios que colocam o autor em primeiro lugar.
Já com nomes de peso no catálogo, como James Clear (Hábitos atômicos, publicado aqui pela Alta Life) e Joseph Nguyen (Não acredite em tudo o que você pensa, no Brasil pela Universo dos Livros), a Authors Equity conseguiu criar um espírito colaborativo entre os envolvidos no processo de publicação. A editora centrada no autor espera chegar ao fim de 2025 com 25 livros — até o momento, 80% do catálogo é de não ficção. E já fechou parcerias importantes com a 831 Stories e a Lyx, selo da editora alemã Bastei Lübbe, líder no mercado de romances e ficção para jovens adultos, com o objetivo de aumentar sua oferta no gênero.
Em entrevista ao PublishNews, McIntosh — descrita como uma pessoa criativa e focada em compreender as complexidades da indústria editorial — fala sobre a mudança na carreira, expõe sua visão a respeito do mercado e conta os diferenciais da sua editora, que acaba de completar um ano.
PublishNews – Madeline, você saiu de uma das maiores empresas globais do setor para trabalhar com uma equipe de apenas dez pessoas. Como tem sido essa mudança?
Madeline McIntosh - Foi uma grande mudança de mentalidade para mim. Comecei na Penguin Random House quando ainda era apenas a Bantam Doubleday Dell, em 1994, algo menor. Então, foi uma evolução natural: a empresa ficou maior e assumi mais responsabilidade. De certa forma, toda minha carreira estava centrada em uma grande estrutura corporativa. E aprendi muito lá. Mas descobri que realmente amo lidar diretamente com os livros e com autores; e, quando se está em uma posição de nível sênior, não se consegue mais fazer isso. Assim, trabalhar na Authors Equity tem sido o mais gratificante de tudo. Adoro resolver quebra-cabeças e lidar com todas as etapas do processo. E é nessa parte que é muito mais interessante e produtivo ser uma equipe pequena, porque podemos estar todos em uma chamada de vídeo, expressar nossas ideias ou frustrações, fazer um brainstorming e decidir rapidamente em qual direção seguir. O processo é mais pessoal e íntimo para todos.
PN – Você mencionou em eventos internacionais que vê com atenção o crescimento no número de pessoas insatisfeitas com seus trabalhos e que a Authors Equity procura atuar com freelancers pensando na flexibilidade oferecida aos colaboradores. Essa dinâmica tem funcionado?
Madeline - A indústria editorial americana vem caminhando nessa direção há algum tempo. Há muitos editores, designers e publicitários que trabalham como freelancers. O lado criativo dessa dinâmica é descobrir a melhor pessoa para trabalhar em cada etapa do livro, decisão que, por aqui, é tomada em conjunto com o autor.
PN – Como funciona a dinâmica da editora no dia a dia? De que forma os autores participam do processo de construção da obra?
Madeline - Digamos que você é um autor e seu agente te levou para conhecer diferentes editoras. Você pode se decidir com base em fatores como, por exemplo, aquela que realmente te conquistou ou que pagaria mais. No nosso caso, o autor é quem decide se está interessado em trabalhar com cada colaborador. Primeiro, ele avalia como se sente em relação ao modelo com o qual trabalhamos e à cultura da empresa. Depois, quando decide “sim, quero que você me publique”, temos uma conversa sobre o que ele está procurando e o que imagina ser bom em um editor. Algo como descobrir o estilo e, em seguida, o assunto, a personalidade, e aí é montar um time único. A diferença é que, como não temos uma equipe grande, nosso trabalho inicial é maior para descobrir quem será o editor e quem estará em cada etapa da publicação. E a equipe mais consistente é a de marketing, publicidade, vendas e produção.
PN – O que levou você a criar uma empresa focada no autor e em reformular o relacionamento entre editora e esse elo essencial da cadeia?
Madeline - Na minha perspectiva, no mercado tradicional as editoras eram as guardiãs, detentoras do poder de dizer “decidi que você será um best-seller” ou que “tal livro é extraordinário”. A maneira de fazer com que o livro fosse vendido era convencer todos os livreiros de que ele deveria ser sua maior prioridade. Não estamos mais nesse mercado. Não porque as editoras deixaram de fazer o que podem para se comunicar com os consumidores. Elas fazem. Mas os consumidores são mais impactados pelos autores.
James Clear, por exemplo, com Hábitos atômicos, ao trabalhar ano após ano para desenvolver seu próprio público, tem hoje muito mais impacto na comunicação com os consumidores do que uma editora jamais teria. O mesmo vale para autores que estão em começo de carreira. Sim, eles precisam de orientação e suporte especializado, mas realmente se beneficiarão se entenderem que o livro poderá ser um sucesso ou fracasso não apenas por ser bom, mas se eles, como autores, forem bons em trabalhar com uma editora para se comunicar diretamente com os leitores.

Madeline - O que fazemos é uma divisão de lucros muito, muito direta. Pegamos a receita e deduzimos os custos diretos da publicação. Qualquer coisa que não seja um custo para a empresa, mas sim algo necessário (como contratar um freelancer, comprar papel ou publicar um anúncio), deduzimos da receita para chegar ao lucro. Com isso, a maior fatia fica com o autor, uma média de 70%.
PN – A digitalização do mercado é um dos motivos para mudar essa relação entre autores e editoras?
Madeline - Sim. Pense no fato de que é bem raro hoje em dia ter um livro com um sucesso midiático que o expresse corretamente. Você ouve o tempo todo sobre autores que fazem 200 entrevistas diferentes em podcasts, que têm site, redes sociais, newsletter, tudo. O trabalho do autor é árduo. E isso porque estamos muito longe da época em que você poderia simplesmente participar do programa matinal de TV e então conseguir as vendas. A questão central é que o mercado digital é fragmentado, o que significa uma maior carga para o autor.
PN – Como vocês cobrem os custos de publicação e distribuição? Quem são seus parceiros?
Madeline - Nossa principal parceira de distribuição é a Simon & Schuster, claro, por conta do seu grande alcance internacional. Também trabalhamos com o departamento de produção deles para produzir nossos livros, o que é realmente útil.
PN – Como tem sido a aceitação da editora por parte dos autores?
Madeline - Os autores estão muito felizes. A questão principal é que não é para todos. Muitos estão apegados à ideia de receber um adiantamento. Não pagamos adiantamentos. Nós nos esforçamos para garantir que eles realmente entendam a matemática do mercado. Joseph Nguyen, por exemplo, está nos ajudando a entender como vender livros pelo TikTok. Mas alguns autores não querem ter esse tipo de experiência colaborativa. E está tudo bem, porque não queremos ser uma grande empresa. Estamos interessados em permanecer como uma boutique focada e altamente colaborativa.
PN – Como você vê a evolução dos grandes grupos editoriais nos próximos anos?
Madeline - Ter uma ampla gama de editoras de diferentes tamanhos e estruturas é sinal de uma indústria saudável. Não existe um modelo ou abordagem que se adapte a todos os autores. Sendo uma empresa de pequeno porte, nossa força vem da flexibilidade e da vontade de experimentar coisas novas de diferentes maneiras. Mas, ao mesmo tempo, contamos com a força de um grande parceiro [Simon & Schuster] em relacionamentos com fornecedores, uma grande força de vendas e uma cadeia de suprimentos global.
PN – Qual é sua avaliação sobre a inteligência artificial no mercado editorial? Seu uso, leis e evolução…
Madeline - O valor para a nossa indústria está na substituição dos processos lentos, manuais e pouco criativos — que ninguém gosta de fazer. Isso dá aos humanos mais tempo para pensar e agir criativamente, o que é algo positivo.
PN – O mercado editorial está acompanhando bem as mudanças de comportamento do leitor digital?
Madeline - Em um mercado com menor capacidade de atenção e ampla disponibilidade de entretenimento de alta qualidade, os livros e programas de áudio mais curtos podem ser mais viáveis que os mais longos. Mas a economia editorial tradicional incentiva a publicação de livros mais longos a preços mais altos. Essa é uma lacuna da qual todos devemos estar cientes.
PN – Há algum outro processo que o mercado editorial deveria mudar?
Madeline - A partir da guerra comercial presenciada neste ano, tenho a impressão de que a evolução que eu espero ainda levará muito mais tempo. Mas adoraria que os livros pudessem viajar mais facilmente de uma região do globo para outra. Há ótimas histórias em algumas partes do mercado global que levam muito tempo para chegar ao resto do mundo. É uma pena.
PN – Apontaria alguma tendência global para o próximo ano?
Madeline - Estamos já no meio de uma tendência interessante, a dos livros que nos ajudam a lidar com a ansiedade, a entender o que sentimos. Acho que para a maioria das pessoas há mais com o que se preocupar no mundo hoje do que antes. Acredito, então, no crescimento de livros que ajudem as pessoas a sentir que têm controle sobre si mesmas, que lhes deem uma sensação de esperança para o futuro ou uma sensação de fuga. Acredito também que continuaremos a ver o crescimento de categorias de ficção como romance, fantasia, ficção científica e mistérios. Por outro lado, acho que a categoria que continuará tendo mais dificuldades será a dos livros sérios, longos, que parecem um pouco com uma lição de casa.
*Matéria veiculada na primeira edição da Revista PublishNews (impressa), lançada em junho de 2025, com tiragem de 10 mil exemplares e distribuição gratuita, tanto física quanto digitalmente (em breve). Quer contribuir financeiramente com o canal? Clique aqui.
