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Bienal SP: Entrevista com Karine Pansa
PublishNews, 02/09/2014
Bienal do Livro SP 2014 – E entrevista com Karine Pansa

Passei pela Bienal nas tardes de três dias: segunda, terça e quarta-feira passadas. Era evidente a diminuição da área vendida aos expositores, com muitos estandes de cessão gratuita de tamanho maior que o usual, corredores bem mais largos. Ouvi poucas queixas de expositores quanto ao volume de vendas. No geral, pareciam satisfeitos com os resultados, embora os cariocas sempre ressaltassem que no evento do Rio de Janeiro se vende mais.

Gostei muito da programação cultural, coordenada pelo SESC-SP. Foi diversificada e bem dinâmica. Evidentemente os momentos de maior presença do público foram aqueles que astros pop apareciam, fossem ou não escritores. Mas sem dúvida alguma, foi um avanço muito significativo. O SESC não apenas organizou a programação cultural, como gastou um bom dinheiro com os convidados e com o estande de sua editora. A Federação do Comércio contribuiu adicionalmente com o estande da Editora SENAC-SP.

Mesmo assim, mantenho, sem vacilação, duas de minhas críticas principais.

A primeira diz respeito ao barulho provocado pela circulação da meninada, que vagueia pela feira sem uma organização de eventos estruturada para atendê-los de maneira produtiva. Desde a última vez que visitei a Feira de Guadalajara, virei um entusiasta do formato que eles acharam. Lá, o recinto da feira está dividido fisicamente em dois. As crianças entram para sua área, onde estão também os estandes dos expositores voltados especificamente para esse público, e uma série de atividades estruturadas para a garotada. As editoras que também atendem ao público adulto, podem comprar outro espaço na área geral. Quem entra – adultos – pela área geral, pode ir visitar a área infantil, mas o vice-versa não acontece. É, até hoje, o melhor arranjo que conheci. Perguntei sobre o assunto na entrevista com a presidente da CBL, Karine Pansa, logo abaixo.

Mas, antes da entrevista, outro ponto negativo que acho importante. Os estandes de saldos e promoções. Desde logo declaro que sou um defensor desse segmento do mercado, que oferece novamente ao público, a preços promocionais, livros que deixaram de ser exibidos nas livrarias. Mas não na Bienal. Acho que ali não é o lugar para isso.

Finalmente, as reclamações sobre o escorchante preço do estacionamento. Usei o ônibus para voltar ao terminal Tietê, e foi rápido e confortável, só que foi no meio da tarde, fora do horário de pico.>

Agora, vamos ao que interessa. Encontrei Karine Pansa em um dos corredores e pedi uma entrevista. Logo depois ela me recebeu no estande da organização. Gravei uma hora e vinte minutos no celular, mas a bateria acabou.

A conversa girou sobre vários temas. Um deles, as cartas aos presidenciáveis, vai ficar para outro post.

Vamos aos trechos principais da conversa. Os meus comentários são feitos entre parênteses e não foram vistos posteriormente pela Karine Pansa.

As mudanças na Bienal

Karine mostrou que levou a sério as críticas feitas em 2012. Disse que a Comissão da Bienal discutiu muitas alternativas, em busca do que fazer para “dar ao visitante uma razão para visitar a Bienal”.

No final, decidiram que as atividades culturais seriam o ponto chave de atração, e o SESC, que já havia sido “parceiro da CBL” naquele ano, foi contatado para assumir a organização de todas as atividades culturais. “O consumidor pode comprar qualquer tipo de livro em casa, ou na livraria mais próxima. Por isso, dentro da comissão da Bienal, decidimos chamar um grande parceiro para as atividades culturais. Foi essa a ideia que ‘saiu da cartola’” – disse a presidente. Segundo ela, o SESC e a CBL interagiram muito com os expositores para definir a programação. Com o aumento das áreas destinadas à programação cultural, aumentou o número de autores convidados.

Segundo Karine Pansa, a CBL “já esperava” uma diminuição da área comercializada, por conta de ser ano eleitoral e da Copa do Mundo. Argumentei que há muito as bienais de São Paulo acontecem em ano eleitoral, e que isso não seria justificativa. Quanto à Copa do Mundo...

A dirigente da CBL reconhece os problemas relacionados com a área vendida. Afirma que a redução do número de expositores foi insignificante. Mas a área:

“Diminuiu bastante... Diminuiu não porque editoras pararam de expor ou não quiseram estar aqui. A maior parte das reduções foi por conta da centralização e reorganização dos expositores. Por exemplo, o espaço da Abrelivros, onde tínhamos seis grandes editoras, e todas tinham espaços de no mínimo 300 m2. Passaram em conjunto para um espaço de 600 m2. Esse foi o maior baque que levamos. Depois houve diminuições... normais”, atribuindo-as à adequação aos espaços disponíveis. “Não me preocupei com isso, de verdade”, concluiu.

(Observação minha: Infelizmente não é tão simples assim. Editoras importantes, como a Objetiva, não participaram, além das que, ano passado, já estavam ausentes, como a Summus. O espaço da Abrelivros – que agrupou as seis didáticas- é o caso mais problemático, realmente, pois é um indicador de que esse segmento desistiu de trabalhar o público infantil e juvenil durante a Bienal. Além da concentração das vendas para o governo, devem estar canalizando mais recursos para o marketing diretamente junto a escolas, em ação direta).

Karine disse que o espaço vendido foi de aproximadamente 14.000 m2. Não consegui levantar a informação sobre o espaço comercializado em 2012, mas a impressão visual era que a área ocupada havia se reduzido uns 40% este ano.

Quanto aos estandes de pontas de estoque e ofertas, a presidente da CBL disse que o assunto foi debatido na comissão da Bienal. Chegou-se a discutir algumas alternativas, como preços diferenciados por metro quadrado, localização específica para esses estandes, e outras. “Mas concluímos que fazer isso talvez fosse um passo maior do que o que demos agora [com as atividades culturais]. Então a comissão decidiu que a primeira ruptura seria uma grande programação cultural. Depois, talvez, uma nova ruptura”.

Abordei a questão dos serviços que a CBL presta aos sócios, mencionando a entrevista que havia feito com OrenTeicher, da ABA. Karine reconhece que a Venda dos serviços aos sócios é um componente importante dos recursos da CBL. “Mas há resistência quanto aos preços cobrados. Ainda existe uma mentalidade antiquada, empresas e pessoas que acham que tudo deve ser barato ou de graça. Ora, se não posso pagar bem a um palestrante, não conseguiria levar quem eu gostaria”. A Escola do Livro, contudo, teve significativo aumento de faturamento e organizou eventos em outros estados, como no Ceará e em Minas Gerais, através de convênio com entidades locais.

(Observação minha: Na minha opinião, o problema se deve também aos cursos que são oferecidos, que talvez não reflitam uma contribuição para a solução das dificuldades enfrentadas por editoras e livrarias)

A Escola do Livro não é o único serviço prestado pela CBL aos associados. O mais antigo é a catalogação na fonte, uma das primeiras formas de metadado institucionalizada, e que há décadas foi adotada pela CBL e pelo SNEL. Segundo Karine Pansa, “a catalogação está mais ágil. Houve um aumento dos valores cobrados, mas uma melhoria na rapidez do serviço”.

Entramos, então, na questão dos metadados. Karine Pansa confessa que não entendia nada sobre o assunto, do qual ouviu falar pela primeira vez no Congresso do Livro Digital da CBL. Quando assumiu a presidência da entidade, o contrato entre a CBL e a Federación de Gremios de Editores da Espanha para o uso do DILVE havia sido recém assinado. Bom, o DILVE usa o Onix como base. Pretende ser, porém, muito mais que uma base de informações usadas por editoras e livrarias. Sua pretensão é bem mais ampla: ser também um canal de negócios entre editoras e livrarias e o repositório de todos os livros disponíveis no mercado, uma espécie de “books in print” espanhol. Ou seja, vai muito além do objetivo básico do sistema Onix, tal como foi desenvolvido pelo BISG – Book Industry Study Group, dos EUA, que é mantido pelas editoras de lá e serve também como normatizadora, e para o estabelecimento de padrões de qualidade em várias áreas técnicas da indústria editorial. Aqui no Brasil o órgão que me parece mais próximo desse conceito é a ABTG – Associação Brasileira da Indústria Gráfica, que inclusive edita normas técnicas oficiais para a indústria.

Mas, voltemos ao que me disse Karine Pansa.

Quando assumiu a presidência da CBL, ela decidiu incorporar sua editora, a Girassol, ao CANAL, a versão tupiniquim do DILVE. Tentou, e verificou as dificuldades de incorporar os 1.900 títulos do seu catálogo. Era necessário transferir os dados do catálogo para uma planilha, exportar para o CANAL e depois validar um a um os títulos. Desistiu.

“Voltei para a CBL e disse, parem com isso. Enquanto as editoras não puderem transferir seus dados de uma maneira transparente, sem necessitar pessoal adicional, não vamos conseguir levar isso adiante. Quando botamos o CANAL para rodar, o sistema não tinha todas as ferramentas que julgávamos necessário ter. Então a decisão da diretoria foi parar. Na hora que alguma editora gritar que precisa disso, começamos novamente a correr atrás do assunto. Há pouco fui a uma reunião do CERLALC para discutir a questão e verifiquei que todo mundo enfrentava os mesmos problemas. Eu disse que as editoras não se preocupavam com o assunto, então a CBL é que teria que fazer o investimento e ir atrás de todos para usar o sistema. Não dá”.

(Observação minha: Sei que as editoras e as livrarias não percebem a importância de ter seus metadados organizados para vender mais. No caso, penso que houve uma conjunção de fatores. 1) O CERLALC “vendeu” o DILVE como solução para o problema. Só que essa ferramenta espanhola é muito mais que isso: é um mecanismo que pretende agilizar as vendas para as distribuidoras e, ao mesmo tempo, ser o catálogo geral dos títulos disponíveis. Ou seja, o “books in print”. 2) Deram um pulo maior que a perna e não observaram que o Onix é, primariamente, um mecanismo muito flexível de organização dos dados das editoras, e que, ao usá-lo, a transferência de informações de cada editora para as livrarias fica muito mais fácil. Exatamente pela flexibilidade, o Onix permite que cada editora o configure da maneira que lhe seja mais conveniente, sem estar presa a um sistema fechado. Existem dezenas de programas (alguns até gratuitos) de transferência dos dados de cada editora ao padrão Onix e esse seria o primeiro e mais simples passo. A construção do ”books in print” nos EUA e no Reino Unido é um empreendimento particular da Bowker nos EUA e da Nielsen, no Reino Unido, que adquiriu a Whitaker, a desenvolvedora original do sistema. Essa informação é compilada a partir dos respectivos ISBN e um extenso programa de pesquisa, financiado pela venda do banco de dados. Ou seja, são produtos bem diferentes, e são comercializados de modo distinto.

No Brasil seria o caso das editoras normatizarem suas informações, de modo a que atendesse facilmente os distintos requerimentos de livrarias físicas e online, inclusive o e-commerce que vende geladeira e roupa e cujas planilhas originais foram desenvolvidas para isso. As livrarias, por sua vez, absorvem essas informações. Hoje, tanto a Nielsen quanto a GfK, que recolhem informações de vendas online capturam os dados e os filtram, através de sistemas baseados no Onix, que é simplesmente um padrão, para processá-los. A ambição do DILVE/CANAL foi o que complicou tudo, na minha opinião).

O último ponto de nossa conversa foi a eleição para renovação da diretoria da CBL, que acontecerá em fevereiro próximo. Karine já não pode, por razões estatutárias, concorrer a um terceiro mandato. Mês passado, o mercado recebeu a notícia do lançamento da candidatura de Luís Antonio Torelli, da Trilha Editorial, para a presidência. Torelli faz parte da atual diretoria da entidade. Lançou sua candidatura de forma independente, mas Karine Pansa informou que, posteriormente, a diretoria da CBL havia decidido apoiá-lo oficialmente. Já conversei brevemente com o candidato e espero sua confirmação para a solicitação que fiz para entrevistá-lo e conhecer suas propostas.

E paro por aqui. Mas voltarei a todos esses assuntos.

Felipe Lindoso é jornalista, tradutor, editor e consultor de políticas públicas para o livro e leitura. Foi sócio da Editora Marco Zero, diretor da Câmara Brasileira do Livro e consultor do CERLALC – Centro Regional para o Livro na América Latina e Caribe, órgão da UNESCO. Publicou, em 2004, O Brasil pode ser um país de leitores? Política para a cultura, política para o livro, pela Summus Editorial. Mantêm o blog www.oxisdoproblema.com.br. Em sua coluna, Lindoso traz reflexões sobre as peculiaridades e dificuldades da vida editorial nesse nosso país de dimensões continentais, sem bibliotecas e com uma rede de livrarias muito precária. Sob uma visão sociológica, ele analisa, entre outras coisas, as razões que impedem belos e substanciosos livros de chegarem às mãos dos leitores brasileiros na quantidade e preço que merecem.

** Os textos trazidos nessa coluna não refletem, necessariamente, a opinião do PublishNews.

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