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Os temas de 2013 continuam em 2014
PublishNews, 21/01/2014
Os temas de 2013 continuam em 2014
“Com mais de trinta anos de vivência no mercado editorial, busco mais aprender a fazer as perguntas certas do que qualquer outra coisa. Fazer as perguntas certas para as várias personas sociais, e procurar verificar se os paradigmas (no conceito de Thomas Kuhn) se sustentam ou não. Até porque, ao contrário das ciências físicas, a sociedade muda ao mesmo tempo em que são feitas as perguntas e se elaboram os discursos. E, nessa situação de mudanças e incertezas, sobra pouco espaço para afirmações taxativas, e necessidade de muito empenho para começar a vislumbrar o que se deseja compreender.”

14 de maio – Um mercado opaco

Entre esta coluna no PublishNews e as que saíram no blog O Xis do Problema publiquei ano passado cerca de setenta posts sobre questões do mercado editorial.

Os temas foram bem variados. Os livros têm essa característica de servir de “meio” para se falar de qualquer coisa. São, de certa maneira, um reflexo do mundo real. E as complexidades do mercado editorial acompanham essa variedade: autores, editores, distribuidores, livreiros, leitores. Para se realizar, o livro precisa ser lido, chegar a seu destinatário final, o leitor. Sem isso, perde sentido. O esforço de todos os envolvidos, portanto, se unifica nesse objetivo comum: chegar ao leitor.

E como o livro é, ao mesmo tempo, produto, objeto de consumo e um bem cultural ou educacional, a mescla dessas características torna as atividades de todos dessa cadeia sujeitas a inúmeros condicionantes.

Nesta primeira coluna de 2014 quero fazer um apanhado de alguns temas que foram relevantes em 2013 e que continuarão, certamente, na pauta deste ano. Sem ordem de importância.

Frankfurt e a divulgação da literatura brasileira no mundo

O evento mais importante do ano foi a participação do Brasil como convidado do ano da Feira de Livros de Frankfurt.

A festa foi bonita e teve seus momentos de polêmica.

O que salientar nisso?

Em primeiro lugar, a característica de EVENTO da Feira de Frankfurt. Um evento de enorme repercussão no mundo do livro, e certamente uma oportunidade para que a cultura do país convidado se apresente diante de um público altamente qualificado.

Mas é um evento. Coisa transitória. Em 2014, o convidado já será outro país, e assim sucessivamente.

Por isso é que sempre insisti em continuidade de ações. A primeira experiência do gênero, quando o Brasil foi o convidado em 1994, representou também um enorme esforço que se esvaiu rapidamente pela ausência de continuidade. Os ministérios da Cultura e de Relações Exteriores não tinham políticas permanentes e continuadas para aproveitar o impulso dado. O programa de apoio às traduções se tornou irregular e não houve nenhum esforço para se dar continuidade às medidas de promoção da literatura brasileira no exterior. Recolhemo-nos na conhecida síndrome de vira-latas e deixamos o cenário.

Este ano será diferente?

Pode ser que não. Mas tenho minhas dúvidas.

O Programa de Apoio à Tradução continua. Nas palavras do professor Renato Lessa, continuará pelo menos enquanto ele estiver na Biblioteca Nacional. E aí está o perigo. O programa está longe de se institucionalizar. Depende da vontade dos eventuais ocupantes dos cargos públicos. Outras iniciativas já feneceram, descontinuadas, ou estão no limbo: as viagens de escritores, a vinda de tradutores para estágios no Brasil tiveram presença meteórica ano passado. Ninguém sabe se continuam ou não.

A Machado de Assis Magazine, que publica excertos de traduções de autores brasileiros, continuará. O Itaú Cultural comprometeu-se a manter o investimento. Mas já temos um intervalo de descontinuidade que certamente não contribui para sua consolidação.

As responsabilidades de editores e agentes públicos nesse processo de divulgação da nossa literatura foi objeto de polêmica em vários momentos. A Fundação Biblioteca Nacional cobrou uma maior participação financeira dos editores no processo. O artigo no qual analiso a questão foi, surpreendentemente, o que atraiu o maior número de leitores para minha coluna. Meus poucos leitores habituais se transformaram em mais de sete mil naquele post. O que isso quer dizer, não sei.

O assunto Frankfurt não pode deixar de tocar na cerimônia de abertura e seus discursos. Gostaria de salientar algumas coisas.

A primeira, sobre o polêmico discurso do Ruffato. Já escrevi que o ponto central do discurso era uma visão de redenção através da literatura. Como comentou uma amiga, depois, só faltou o autor nos convocar para criar a Igreja da Redenção pela Literatura. E o alinhavar dos males do país só se entende pelo que também foi dito: agora, depois de quinhentos anos, se começa a mudar as coisas. Esse trecho é o discurso do Lula, sem tirar nem por. Acho curioso que não se haja compreendido isso, e que eventualmente ele fosse criticado. Em uma feira de livros, a literatura foi apresentada como a solução.

Entretanto, o discurso do autor pecou por um detalhe muito significativo: restringiu essa experiência do escritor falar sobre seu país, olhar para fora do umbigo, a algo estritamente pessoal. Faltou a primeira pessoal do plural, em vez da primeira pessoa do singular, para que o discurso pudesse se transformar em um ponto de agregação para tantos outros escritores que, como ele, mergulham na nossa realidade para dar-lhe um sentido artístico e literário. Ao não fazer isso, o discurso apareceu como algo não literário e fora do lugar.

O discurso da Ana Maria Machado foi, como previsto, um discurso institucional, de presidente da ABL. Correto, chamou atenção para a diversidade de abordagens que se apresentava aos visitantes da Feira através dos livros de nossos escritores.

Já o do senhor Vice-Presidente Michel Temer, não vale a pena nem comentar.

Outros temas, de passagem

Outros temas estiveram bem presentes em 2013, e continuarão a estar neste ano.

Metadados, distribuição, impressão sob demanda, a sombra da Amazon no mercado internacional e aqui, e a questão onipresente do acesso aos livros.

Outro tema fortemente presente é o das políticas públicas para o livro e a leitura.

Ano passado, com a saída de Galeno Amorim da FBN, iniciou-se uma nova transformação na estrutura institucional das políticas para o livro no ministério da Cultura. Pelo que sei, até o momento, esse processo está lento e com muitas indefinições. Reservo-me a possibilidade de opinar sobre esse conjunto de problemas mais adiante.

O que vale dizer, aqui, é que essa história de políticas públicas e institucionalizadas está cada vez mais longe de ser verdade. Já mencionei o caso do programa de apoio às traduções. Continuará “enquanto eu permanecer na FBN”, disse o prof. Lessa. Ora, esse tipo de afirmação só revela uma coisa, essencial: não é política pública. Continua sendo – ou não – praticada ao alvedrio de quem ocasionalmente ocupe os postos de direção. O mesmo vale para o vai-vem institucional dos órgãos encarregados – em tese – de desenvolver os programas. Criam-se e se cancelam programas também de acordo com o gosto do dirigente da ocasião. Pretextos nunca faltam, é claro. Afinal, papel aguenta tudo. Mas isso revela a fragilidade e o descaso com que é tratada a questão do livro no Brasil. Muda o(a) ministro(a) e muda não apenas a senhora que serve o cafezinho, como também programas, metas e objetivos, e toda a cadeia de responsáveis(?) pelos programas.

O que está na raiz dessa situação é a ausência e fragilidade de pressão pública para a continuidade e institucionalização dos programas. As ditas entidades de classe de editores e livreiros se revelam também frágeis e oscilantes. Dos escritores, nem falar. De fato, não existe nenhuma instância representativa dos criadores, que, quando assim o desejam, se manifestam individualmente ou em grupos de pressão ocasionais, como foi o caso da polêmica sobre as biografias.

E, para iniciar o ano de forma desalentadora, tivemos um editorial assinado pelo vice-presidente da CBL, Hubert Alquéres no qual, com retórica mal disfarçada, leva a entidade a um posicionamento eleitoral, falando dos “desacertos” do governo Dilma no mesmo tom dos grandes jornais, e afirmando que tudo isso “tem que mudar”.

Isso vindo de uma entidade que tem ou teve vários convênios com o MinC e uma atuação no mínimo discretíssima nos grandes debates dos últimos anos relacionados com o livro e a leitura: modificações na Lei de Direitos Autorais, mudanças nas leis de incentivos fiscais e, mais recentemente, na implantação do Vale-Cultura, deixado inteiramente nas mãos das empresas. Sem falar na farsa de manipulação na tentativa de achar “preço médio” dos livros na pesquisa de produção, junto com o SNEL, e lançando uma enorme sombra na respeitabilidade da FIPE. Algo que nenhum estatístico de respeito pode avalizar.

Depois de um 2013 movimentado, acho que começamos mal 2014. Espero que melhore.

Felipe Lindoso é jornalista, tradutor, editor e consultor de políticas públicas para o livro e leitura. Foi sócio da Editora Marco Zero, diretor da Câmara Brasileira do Livro e consultor do CERLALC – Centro Regional para o Livro na América Latina e Caribe, órgão da UNESCO. Publicou, em 2004, O Brasil pode ser um país de leitores? Política para a cultura, política para o livro, pela Summus Editorial. Mantêm o blog www.oxisdoproblema.com.br. Em sua coluna, Lindoso traz reflexões sobre as peculiaridades e dificuldades da vida editorial nesse nosso país de dimensões continentais, sem bibliotecas e com uma rede de livrarias muito precária. Sob uma visão sociológica, ele analisa, entre outras coisas, as razões que impedem belos e substanciosos livros de chegarem às mãos dos leitores brasileiros na quantidade e preço que merecem.

** Os textos trazidos nessa coluna não refletem, necessariamente, a opinião do PublishNews.

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