Publicidade
Publicidade
Para deixar de tomar decisões “pelo cheiro” II – A GfK e suas informações
PublishNews, 04/12/2013
Para deixar de tomar decisões “pelo cheiro” II

Estive na sede brasileira da GfK para conhecer os dados e os métodos de coleta de informações de seu sistema de acompanhamento do varejo de livros no Brasil. Atendido pela Cláudia Bindo, diretora da unidade, tive oportunidade de ter uma visão mais ampla das informações processadas pela empresa alemã. Em post recente havia abordado a chegada do Nielsen BookScan por estas plagas, e quero, desde logo, me desculpar por uma avaliação ali feita de que a implementação dos serviços da GfK andava “a passos lentos”.

Não é certo. A GfK avançou bastante no estabelecimento do serviço. Se algo pode ser dito a respeito da presença das duas multinacionais de pesquisa de mercado no Brasil é que isso denota o interesse crescente que o setor editorial vem despertando. O Brasil e a Espanha, aliás, são os únicos mercados em que as duas empresas competem diretamente. A Nielsen acompanha o mercado dos EUA, mas a GfK tem uma presença mais abrangente na Europa.

É certo que, para os respectivos clientes, o que importa fundamentalmente são os dados do mercado local. Entretanto, as duas empresas têm condições de oferecer algumas análises comparativas. Nesse sentido, a GfK apresentou algumas informações bastante interessantes sobre a presença de autores brasileiros em outros países.

A GfK recolhe os dados diretamente dos varejistas (o método é o usado para o acompanhamento de todos os segmentos de varejo). A partir daí é que a tabulação e análises variam um pouco entre os sistemas das duas empresas. A GfK, por exemplo, não registra o preço de capa oficial, somente o preço efetivamente praticado, o que não permite mensurar níveis de desconto. Mas o acompanhamento de eventuais anomalias é constante e qualquer dado que destoe é verificado junto ao varejista.

Outras diferenças importantes dizem respeito aos bancos de dados. A GfK vem montando seu próprio banco de dados de títulos e os classifica internamente em gêneros. As duas empresas usam bancos de dados com dimensões – hoje – bem diferentes. A Nielsen usa o do iSupply, com cerca de 250 mil títulos e a GfK declara ter, em seu próprio banco de dados, mais de 510 mil títulos cadastrados. No meu “chute qualificado”, esse último número é o que deve estar mais perto do “books in print” atual (sem contar, entretanto, com a multidão de títulos de autopublicação, dos quais apenas uma pequena parcela entra nessas pesquisas, que só considera as vendas em canais estruturados de livros físicos). A GfK registrou, no período de janeiro a setembro de 2013, vendas (pelo menos um exemplar) de 202 mil títulos. E na primeira semana de outubro foram registrados 73 mil títulos.

Tal como os outros dados disponíveis, esses números mostram uma enorme dispersão na quantidade de títulos movimentados. Mas, aqui como alhures, a concentração no volume de vendas também é muito grande.

A questão da qualificação por gêneros é sempre complicada, pois envolve alguns fatores de ordem subjetiva. Um amigo meu, por exemplo, diz que “livro religioso” é o da sua religião, a dos outros é “autoajuda”.

Segundo a empresa alemã, o segmento “livros religiosos” teve um aumento, em 2013 (até setembro), de 3%, comparado com o mesmo período no ano passado. A GfK notou, entretanto, que grandes eventos têm capacidade de provocar aumentos sazonais de vendas de certos gêneros. Foi o que aconteceu com a Jornada Mundial da Juventude. Olhem o quadro:

A coincidência dos “picos” é quase perfeita.

Entretanto, outros títulos que eu particularmente classificaria como religiosos, foram colocados na categoria “Obras Gerais” e no segmento de biografias: os livros do Edir Macedo e os livros sobre o Papa.

Ou seja, um bom analista dos dados deve levar em consideração os possíveis cruzamentos entre títulos de gêneros distintos que podem influenciar a análise de um segmento específico.

A GfK acompanha vários segmentos do setor que denomina de “Entretenimento”, que inclui, além de livros, filmes, brinquedos e games. Com as mais recentes tendências do mercado editorial, ter dados de outros projetos “multimídia” permite uma análise mais contextualizada do setor de livros. Por exemplo, a GfK mostrou uma tabela que comparava o desempenho de games e livros da série “Assassins’ Creed”.

A tabela surpreende:

Aparentemente, uma situação “tostines”: livros vendem mais porque estão atrelados a games ou vice-versa? O fato é que os livros venderam 50% a mais que os games.

A GfK, alegando confidencialidade, não revela quais os varejistas que já estão fornecendo dados, mas estima sua cobertura em 69% das vendas no varejo. Apenas de livros físicos. Os livros eletrônicos não estão coligidos.

Essa proporção permite deduzir que as grandes cadeias de livrarias e do comércio varejista já estão fornecendo os dados. Perguntei sobre dados recolhidos entre as livrarias independentes, e a resposta foi a mesma: confidencialidade. Entretanto, o fato da GfK já ter feito pesquisas específicas para a ANL – Associação Nacional de Livrarias, permite entrever pelo menos uma abertura para trabalhar com os pequenos e médios varejistas.

A mesma resposta de confidencialidade foi dada quanto aos custos. Simplesmente se aduziu que os custos são negociados diretamente com os clientes.

Os dados disponibilizados pelas duas gigantes da pesquisa do mercado podem permitir um avanço na capacidade técnica das editoras brasileiras. Infelizmente, o acesso ainda está restrito às grandes empresas.

O problema maior, para mim, é que o conjunto do mercado ainda tateia na capacidade de analisar e interpretar os dados, e usar tanto as informações das empresas de pesquisa quanto seus próprios dados internos para construir cenários melhores.

Isso coloca em pauta os seguintes pontos: primeiro, a questão da capacitação. É evidente a melhoria e a qualificação dos profissionais do mercado editorial brasileiro em várias áreas, da produção ao marketing. Mas há ainda um longo caminho a ser percorrido para o manejo de todas as informações já disponíveis, em um mundo cada vez mais abarrotado de conteúdo. Em segundo lugar, se torna cada vez mais evidente a incapacidade aparente das entidades profissionais, tanto de editores quanto de livreiros, de criar meios tanto para que essa capacitação aconteça de modo mais vertical, abrangendo as pequenas e médias empresas, quanto para a busca de maneiras de permitir um acesso mais amplo a essas informações. E a correção dessa deficiência, cada vez mais necessária. Faltam-nos instituições como o BISG – Book Industry Study Group (que tem seus congêneres nas associações europeias) que ajudem a superar isso.

Felipe Lindoso é jornalista, tradutor, editor e consultor de políticas públicas para o livro e leitura. Foi sócio da Editora Marco Zero, diretor da Câmara Brasileira do Livro e consultor do CERLALC – Centro Regional para o Livro na América Latina e Caribe, órgão da UNESCO. Publicou, em 2004, O Brasil pode ser um país de leitores? Política para a cultura, política para o livro, pela Summus Editorial. Mantêm o blog www.oxisdoproblema.com.br. Em sua coluna, Lindoso traz reflexões sobre as peculiaridades e dificuldades da vida editorial nesse nosso país de dimensões continentais, sem bibliotecas e com uma rede de livrarias muito precária. Sob uma visão sociológica, ele analisa, entre outras coisas, as razões que impedem belos e substanciosos livros de chegarem às mãos dos leitores brasileiros na quantidade e preço que merecem.

** Os textos trazidos nessa coluna não refletem, necessariamente, a opinião do PublishNews.

Publicidade

A Alta Novel é um selo novo que transita entre vários segmentos e busca unir diferentes gêneros com publicações que inspirem leitores de diferentes idades, mostrando um compromisso com qualidade e diversidade. Conheça nossos livros clicando aqui!

Leia também
Em sua coluna, Felipe Lindoso dá seus pitacos sobre a Pesquisa Produção e Vendas do Setor Editorial Brasileiro divulgada na última segunda-feira
Felipe Lindoso resgata a história do ISBN para analisar a mudança da operação do ISBN, que deve acontecer em março próximo
Em sua coluna, Felipe Lindoso chama atenção para a importância do acervo bibliográfico e documental das bibliotecas do Museu Nacional, que foram destruídas no incêndio do ano passado
Felipe Lindoso sai em defesa do casal de sebistas processado por Edir Macedo. 'Esse processo representa um atentado à liberdade de expressão tão grave quanto o veto a Miriam Leitão e Sérgio Abranches', defende.
Em sua coluna, Felipe Lindoso conta os bastidores que possibilitaram a inauguração de uma biblioteca infantil dedicada à língua portuguesa no Japão
Publicidade

Mais de 13 mil pessoas recebem todos os dias a newsletter do PublishNews em suas caixas postais. Desta forma, elas estão sempre atualizadas com as últimas notícias do mercado editorial. Disparamos o informativo sempre antes do meio-dia e, graças ao nosso trabalho de edição e curadoria, você não precisa mais do que 10 minutos para ficar por dentro das novidades. E o melhor: É gratuito! Não perca tempo, clique aqui e assine agora mesmo a newsletter do PublishNews.

Outras colunas
Neste episódio nossa equipe conversou com Rita Palmeira e Flávia Santos, responsáveis pela curadoria e coordenadoria de vendas da livraria do centro de São Paulo que irá se expandir em breve com nova loja no Cultura Artística
Todas as sextas-feiras você confere uma tira dos passarinhos Hector e Afonso
Seção publieditorial do PublishNews traz obras lançadas pela Ases da Literatura e seus selos
Em 'A cartinha de Deus', a autora leva os leitores em uma jornada íntima e inspiradora, mostrando como aprendeu a lidar com os desafios impostos pela distonia
Em 'Alena Existe', publicada pela Ases da Literatura, o autor Roger Dörl desvenda os segredos do universo numa trama repleta de ficção científica, aventura e mistério
Vamos pegar nossos livros e canetas. Eles são nossas armas mais poderosas.
Malala Yousafzai
Ativista paquistanesa
Publicidade

Você está buscando um emprego no mercado editorial? O PublishNews oferece um banco de vagas abertas em diversas empresas da cadeia do livro. E se você quiser anunciar uma vaga em sua empresa, entre em contato.

Procurar

Precisando de um capista, de um diagramador ou de uma gráfica? Ou de um conversor de e-books? Seja o que for, você poderá encontrar no nosso Guia de Fornecedores. E para anunciar sua empresa, entre em contato.

Procurar

O PublishNews nasceu como uma newsletter. E esta continua sendo nossa principal ferramenta de comunicação. Quer receber diariamente todas as notícias do mundo do livro resumidas em um parágrafo?

Assinar