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O Brasil em Frankfurt em 1994 – Daqui para 2013
PublishNews, 11/10/2011
O Brasil em Frankfurt em 1994 – Daqui para 2013

A Feira do Livro de Frankfurt 2011 começa amanhã. O Brasil estará presente em um estande que conta com o apoio da Biblioteca Nacional e do programa Brazilian Publishers, da APEX – Agência de Promoção de Exportações, do Ministério da Indústria e Comércio. Mais editoras brasileiras terão estandes próprios. Durante muitos anos algumas editoras religiosas se abrigavam junto de suas congêneres internacionais, como a Paulus e as Paulinas. Já há algum tempo, a Companhia das Letras mantinha seu próprio estande, este ano acompanhada nesse tipo de iniciativa pela Record e pelo Grupo A. O Brasil é foco de atenções. O olho grande do mercado internacional considera o país, hoje, um dos principais mercados de direitos autorais.

Ótimo que esteja assim hoje.

Dezenove anos depois da primeira vez em que o Brasil foi País Convidado da Feira, tentei, nestes últimos dias, no meu blog www.oxisdoproblema.com.br, dar um panorama do que foi feito e dos problemas enfrentados. Meu objetivo é muito simples: como não se constrói a partir do nada, queria refrescar a memória, fazer o balanço do bom e do ruim e contribuir, assim, para termos uma participação vibrante e proveitosa em 2013. Aqui vou tentar resumir o caso.

Uma primeira e muito significativa diferença entre 1994 e 2013 é a participação e a postura do governo brasileiro e das entidades do livro.

Em 1994, a iniciativa coube principalmente aos editores. A CBL – Câmara Brasileira do Livro, e o SNEL – Sindicato Nacional de Editores de Livros (principalmente a primeira) tomaram a iniciativa (e pagaram uma parcela nada desprezível da conta), organizaram a participação e, de certa forma, arrastaram um Ministério da Cultura desarticulado para participar do evento. Desta vez é o contrário. Tudo indica que o Ministério da Cultura, através da Fundação Biblioteca Nacional, é quem tomará a iniciativa.

Quais os principais resultados positivos de 1994?

O Brasil levou para Frankfurt uma amostra ampla de sua cultura, através de exposições, presença de autores antes, durante e depois da Feira. Até aquele momento, pouquíssimas vezes fora apresentada tal variedade de aspectos da cultura brasileira no exterior, e a repercussão foi muito significativa.

A organização da participação brasileira contratou uma empresa especializada para recolher o clipping de matérias publicadas sobre o Brasil – particularmente sobre as atividades relacionadas com a Feira – nos jornais alemães. O resultado foi a contabilização de matérias com o espaço (centímetro/coluna) equivalente a 178,82 páginas de jornal tamanho padrão brasileiro. Esse espaço foi avaliado pelos critérios da Stamm Presse-und-Medienhandbuch Tariffe e o valor encontrado correspondia a US $ 8.854.950 (oito milhões, oitocentos e cinquenta e quatro mil, novecentos e cinquenta dólares americanos). O investimento brasileiro foi equivalente a US $ 2.947.000 (dois milhões, novecentos e quarenta e sete mil dólares americanos), dos quais a CBL teve que usar recursos próprios no valor de US $ 1.047.000 (hum milhão e quarenta e sete mil dólares), tudo em valores da época. O investimento público, considerando-se recursos orçamentários e o incentivo fiscal, foi de US $ 1.900.000 (hum milhão e novecentos mil dólares). Desses, um milhão coube ao ministério das Relações Exteriores.

O noticiário internacional sobre a participação do Brasil na Feira de Frankfurt em 1994 mostrou ao público de outros países que o Brasil era um país muito mais rico e complexo culturalmente do que transparecia na imprensa internacional de então. As notícias foram amplamente positivas para o país, com aproximadamente 90% de avaliações positivas ou neutras. Mesmo as notícias negativas, com aspectos críticos, não deixavam de mencionar diferentes aspectos positivos do Brasil e de sua cultura. O noticiário internacional na época não tinha a menor semelhança com o que se fala do Brasil hoje. Éramos o país que massacrava crianças na Candelária, o país das injustiças sociais, o país que tinha impedido o presidente da República e que recém tinha feito uma reforma monetária que ninguém ainda tinha certeza de que daria certo.

A participação do Brasil em Frankfurt rendeu, naquele ano e por mais algum tempo, um aumento no número de traduções de autores brasileiros. Nada que possa nos colocar nem perto do volume de traduções de autores anglo-saxões, evidentemente. Mas, para autores que escrevem em português, um idioma insular, de escassa importância econômica internacional, com falantes restritos ao Brasil e Portugal e uma pequena parcela dos habitantes das ex-colônias portuguesas em África e Ásia, foi um aumento significativo. Tanto assim que Frankfurt 1994 é uma das razões pelas quais, anos depois, o Instituto Itaú Cultural instituiu o programa Conexões – Mapeamento Internacional da Literatura Brasileira, que mapeia a presença da nossa literatura pelo mundo afora, e com resultados positivamente surpreendentes.

Foi tudo bem?

Evidentemente que não. Ao se observar o passado, vemos os erros cometidos: podíamos ter escolhido um autor mais vibrante e significativo para fazer o discurso de abertura, por exemplo. Outros certamente podem apontar mais deficiências, erros e equívocos. Certamente aconteceram.

Mas a grande oportunidade desperdiçada a partir do esforço de Frankfurt 1994 aconteceu depois, com o esvanecimento das tentativas de estabelecer políticas públicas de divulgação da cultura e do livro brasileiro no exterior, e mesmo com o não aproveitamento do material recolhido na ocasião.

Tome-se, por exemplo, o clipping já mencionado. Podia muito bem ter sido a base para que o Itamaraty ou o Ministério da Cultura começasse a montar um amplo cadastro de jornalistas e meios de comunicação para os quais se enviassem, sistematicamente, informações sobre a cultura brasileira. Não foi feito isso.

O Itamaraty, aliás, ainda que possamos tranquilamente citá-lo como exemplo de excelência no serviço público – e sua atuação em Frankfurt 1994 mostrou isso, como assinalei e elogiei - permanece aquém das exigências de uma política de Estado para a cultura. Aparte o acompanhamento de tratados e convenções internacionais, onde nossos diplomatas atuam com vigor, como foi o caso da Convenção sobre a Diversidade Cultural, sob outros aspectos a atuação do Itamaraty deixa muitíssimo a desejar. Vários Centros de Estudos Brasileiros foram fechados como consequência de uma política equivocada de exigir que se mantivessem com recursos locais, implementada a partir de 1996; as ações das embaixadas e consulados, na área cultural, dependem quase exclusivamente da iniciativa dos seus titulares e não existe uma diretriz e uma política coerente e aplicada de forma sistemática. O Instituto Machado de Assis para a promoção da língua portuguesa e da nossa cultura nunca saiu do papel. Sinceramente, quando vemos o que faz o Instituto Camões, dá vergonha.

No âmbito do Ministério da Cultura a coisa foi ainda pior. Já mencionei como o programa de bolsas para tradução foi irregular, com alguns anos sem ser aplicado e sempre com valores muito aquém do necessário. Somente este ano institui-se, com Galeno Amorim, uma política de longo prazo, que esperamos dê frutos consistentes. Cátedras de estudos de literatura que existiram durante algum tempo também foram fechadas, como é particularmente o caso da de Oxford.

Em suma, ao sucesso de 1994 sucedeu-se a falta de continuidade. E o que se tinha conseguido foi sendo diluído e quase perdido.

A grande lição de 1994 (e de alguns outros eventos mais recentes, como o Ano do Brasil na França e da França no Brasil, Copa da Cultura e etc.) é que, se não há continuidade e coerência nas políticas públicas de cultura, fazemos belas festas, mas o resultado dessas se esgota rapidamente. Isso é o que tem que ser evitado.

Para 2013, devo assinalar como positivo o esforço de estabelecimento dessas políticas públicas de Estado. O programa de traduções e o apoio à presença de autores brasileiros no exterior, os prêmios e bolsas de viagem de tradutores estrangeiros para o Brasil são exemplos altamente positivos. Receio que já estejamos um tanto atrasado na construção das parcerias com as instituições alemãs, tática que usamos com muita felicidade e êxito em 1994, e que não apenas diminuiu consideravelmente os custos, como permitiu uma repercussão mais significativa para as exposições levadas.

Vamos ter, certamente, a repetição das polêmicas relacionadas com os autores que participarão dos eventos em 2013. Como disse em post anterior, isso é inevitável.

Fiz um levantamento, incompleto, de matérias publicadas na época pela imprensa brasileira. Pensei em deixar aqui os links para que os leitores vissem por si mesmos a famosa mentalidade de vira-latas, metáfora tão cara ao Nelson Rodrigues, da imprensa brasileira, mas desisti. Sinceramente, não queria que os leitores de hoje tivessem “vergonha alheia” ao ler certas matérias publicadas em jornais e revistas, inclusive artigos publicados por editores naquela época. Afinal, o esforço daquele ano valeu a pena e não quero que minha alma se apequene.

Felipe Lindoso é jornalista, tradutor, editor e consultor de políticas públicas para o livro e leitura. Foi sócio da Editora Marco Zero, diretor da Câmara Brasileira do Livro e consultor do CERLALC – Centro Regional para o Livro na América Latina e Caribe, órgão da UNESCO. Publicou, em 2004, O Brasil pode ser um país de leitores? Política para a cultura, política para o livro, pela Summus Editorial. Mantêm o blog www.oxisdoproblema.com.br. Em sua coluna, Lindoso traz reflexões sobre as peculiaridades e dificuldades da vida editorial nesse nosso país de dimensões continentais, sem bibliotecas e com uma rede de livrarias muito precária. Sob uma visão sociológica, ele analisa, entre outras coisas, as razões que impedem belos e substanciosos livros de chegarem às mãos dos leitores brasileiros na quantidade e preço que merecem.

** Os textos trazidos nessa coluna não refletem, necessariamente, a opinião do PublishNews.

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