Desde Gutenberg até hoje, o principal elo entre o autor e o leitor é o editor. De Aldo Manuzio, William Caxton e Claude Garamond até os editores eletrônicos de hoje, o primeiro elo dessa sequência, a ligação entre o autor e o editor, se dá através do contrato de edição.
A primeira lei de Direito Autoral, o Estatuto da Rainha Anne da Inglaterra, em 1710, assegurava ao editor o direito de editar a obra do autor por 14 anos, após os quais este poderia contratar a publicação do livro com outro editor. E hoje?
A lei brasileira (Lei 9610/98) em vigor define o contrato de edição em duas modalidades. A primeira, a mais habitual: “art. 53. Mediante contrato de edição, o editor, obrigando-se a reproduzir e a divulgar a obra literária, artística ou científica, fica autorizado, em caráter de exclusividade, a publicá-la e a explorá-la pelo prazo e nas condições pactuadas com o autor.” No parágrafo único desse mesmo artigo estipulou-se que em cada exemplar da obra o editor mencionará, (a) o título da obra e seu autor; (b) no caso de tradução, o título original e o nome do tradutor; (c) o ano de publicação, e (d) o seu nome ou marca que o identifique.
Da simples leitura do art. 53 verifica-se que nesse contrato o editor se obriga a reproduzir e divulgar a obra – que já é apresentada pronta pelo escritor - com exclusividade, dentro do prazo e condições pactuadas com o criador do livro.
Autor e editor ficam mutuamente obrigados. O primeiro a entregar obra original, em condições de ser editada, geralmente atendendo as especificações do editor, como forma de apresentação, tamanho, ilustrações etc. Já o editor revisa, elabora a capa, imprime e tem prazo de até dois anos para lançar a obra (se outro não for pactuado). Deve, ainda, fixar o preço de venda, mas de modo a não inviabilizar a sua comercialização, prestar contas da comercialização e pagar ao autor a remuneração combinada.
A lei determina que se o contrato nada disser sobre o número de edições ou tiragens, nem discriminar a quantidade de exemplares de cada uma, o editor somente poderá publicar uma edição, de até três mil exemplares. Obviamente, é interesse das partes comercializar o maior número de exemplares possível, daí os contratos estipularem que o editor poderá publicar quantas edições o mercado demandar, sem limitar o número de unidades.
Interessante notar que a lei de direito autoral só se refere à “edição”, não mencionando o termo “tiragem”. Isso só vamos encontrar na NBR 6029/2006, da ABNT – Associação Brasileira de Normas Técnicas, na qual são explicitados os dois conceitos. Assim, e também para fins de respeito ao consumidor, uma nova edição, principalmente em livros técnicos ou científicos, só se caracteriza quando há mudança – geralmente atualização – no conteúdo da obra. Do contrário haverá apenas nova tiragem, isto é, uma simples reimpressão, o que mostra o costumeiro equívoco do anúncio das sucessivas “edições” de uma obra de ficção inalterada.
Aliás, após publicado o livro Chatô e com as vendas em popa, um personagem alertou o autor para o fato de que determinado episódio não ocorrera como relatado na obra. Fernando de Morais apurou o fato, confirmou que se equivocara e retificou a passagem do livro, configurando, a partir daí, nova edição - a segunda! – sendo que cada uma delas teve várias tiragens, todas registradas no início dos exemplares.
A praxe da remuneração é o pagamento pelo editor de 10% do preço de capa dos livros vendidos. A prestação de contas e o pagamento ocorrerem a cada quatro meses, excluídos dessa base os exemplares destinados à divulgação. Embora a regra legal seja a da exclusividade, nada impede que uma obra seja feita em regime de coedição – publicada por mais de uma editora, em conjunto - mas somente os editores contratados podem produzir e distribuir a obra durante o prazo de vigência do contrato. Findo o prazo contratual o autor fica livre para celebrar outro contrato, com a mesma ou com nova editora.
A outra modalidade de contrato de edição, menos comum, e geralmente celebrada com autores de renome, ainda que passageiro, é a do art. 54: “Pelo mesmo contrato pode o autor obrigar-se à feitura de obra literária, artística ou científica em cuja publicação e divulgação se empenha o editor.”
Nesse caso, o autor se obriga a elaborar e entregar obra para que o editor a publique quando estiver concluída. Recomenda-se aqui, se possível, a especificação precisa dos limites da obra. É notório o episódio em que a atriz Joan Collins, após ter recebido adiantamento de US$ 1,2 mi para escrever uma biografia, teve recusados os originais, com base na alegada péssima qualidade do texto, bem como o pagamento do saldo de US$ 2,8 mi. Ela reclamou ao Judiciário, que em 1995 acolheu sua pretensão, pois não fora especificado nada em relação à qualidade ou estilo. Nesse tipo de contrato, portanto, é prudente que a editora – que geralmente adianta parte da remuneração - especifique previamente as condições da obra e eventualmente acompanhe a evolução do trabalho. Obviamente deve ser respeitada a criatividade do autor, mas a prudência recíproca sugere essas cautelas.
São essas, em geral, as regras para os contratos de edição em forma física. Em outro capítulo abordarei o contrato de edição digital, pois ainda não existe regulamentação legal específica, nem se delineou um padrão mínimo identificável no mercado.
Gustavo Martins de Almeida é carioca, advogado e professor. Tem mestrado em Direito pela UGF. Atua na área cível e de direito autoral. É também advogado do Sindicato Nacional dos Editores de Livros (SNEL) e conselheiro do MAM-RIO. Em sua coluna, Gustavo Martins de Almeida aborda os reflexos jurídicos das novas formas e hábitos de transmissão de informações e de conhecimento. De forma coloquial, pretende esclarecer o mercado editorial acerca dos direitos que o afetam e expor a repercussão decorrente das sucessivas e relevantes inovações tecnológicas e de comportamento. Seu e-mail é gmapublish@gmail.com.
** Os textos trazidos nessa coluna não refletem, necessariamente, a opinião do PublishNews.
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