Gosto pelos livros e a história da crônica são destaques nos debates d'A Feira do Livro
PublishNews, Guilherme Sobota, 20/06/2025
Convidados aproveitaram o bom público que frequentou o evento nesta emenda de feriado, com o clima agradável que fez na cidade nos últimos dois dias

A Feira do Livro tem 150 expositores entre editoras e livrarias; evento vai até o domingo (22) | © Flavio Florido / A Feira do Livro
A Feira do Livro tem 150 expositores entre editoras e livrarias; evento vai até o domingo (22) | © Flavio Florido / A Feira do Livro
O livro e a crônica foram alguns dos principais temas debatidos nesta sexta-feira (20) n’A Feira do Livro, na Praça Charles Miller, em São Paulo (SP). Do gosto pela leitura até a materialidade do livro, passando pela intersecção entre crônica e política, os convidados aproveitaram o bom público que frequentou o evento nesta emenda de feriado, com o clima agradável que fez na cidade nos últimos dois dias.

No início do dia, os editores Jiro Takahashi e Cecilia Arbolave discutiram a produção editorial e gráfica brasileira. Uma das conclusões do debate foi que as novas formas de impressão abriram espaço para iniciativas editoriais independentes inovadoras e ousadas, que hoje funcionam como espaços de experimentação e vanguarda. Cecilia é uma das fundadoras da Lote 42, editora paulistana cuja dedicação à qualidade e criatividade gráfica definiu tendências para outras empreitadas semelhantes.

“Houve uma melhoria muito grande para a diversidade”, disse Jiro sobre as facilidade tecnológicas, como a impressão digital. “O caminho para coisas ousadas e inovadoras está no mundo dos independentes”.

Idealizador da Coleção Vagalume – entre muitos outros feitos no setor do livro no país –, Jiro contou como deu início à coleção depois que identificou falhas e ausências do ensino de literatura na sala de aula (ele era professor de língua portuguesa para o ensino fundamental). Ele também disse sentir falta de uma maior integração entre setores de mídia amplamente populares, em especial os videogames, com o mercado editorial: “há histórias e oportunidades ainda não exploradas nesse campo”.

Jiro Takahashi e Cecilia Arbolave conversaram no Auditório Armando Nogueira | © Guilherme Sobota / PublishNews
Jiro Takahashi e Cecilia Arbolave conversaram no Auditório Armando Nogueira | © Guilherme Sobota / PublishNews
Para Cecilia, o apelo de uma produção editorial caprichada atrai público e leitores para os livros. “Para nós, a questão gráfica (materiais, técnicas de impressão, tintas que podem ter algum efeito) tem a ver com conquistar público. Alguns livros precisam do formato clássico, de virar a página. Mas outros podem ser diferentes. Às vezes, perdemos a preocupação com o formato lúdico quando estamos falando sobre adultos. Por algum motivo, isso não pode na literatura adulta. Mas também é um caminho para se conectar com o livro. O contato com a materialidade tem que atravessar todas as idades”, concluiu.

Crônica

Mais tarde, no Palco Petrobras, Humberto Werneck e Luís Henrique Pellanda debateram a importância e a aclimatação da crônica no país. Segundo os autores, o gênero, muitas vezes considerado menor, permite observações agudas sobre transformações sociais e políticas, mas sem perder sua característica e linguagem literária.

Luís Henrique Pellanda e Humberto Werneck: conversa foi mediada pelo jornalista Ruan de Sousa Gabriel | © Guilherme Sobota / PublishNews
Luís Henrique Pellanda e Humberto Werneck: conversa foi mediada pelo jornalista Ruan de Sousa Gabriel | © Guilherme Sobota / PublishNews
“Eu queria ser ficcionista, mas sou beneficiário de uma geração de ouro da crônica. Fiz a descoberta do cronista em mim neste período mais recente, neste século. De toda forma, nunca me senti parte da tradição da crônica no Brasil. Eu fui criado na leitura de crônicas, na minha geração dos anos 1950, você abria jornal ou revista e tinha vários cronistas. Eu lia isso e passei a ficar chocado quando, nas antologias de literatura brasileira, todos os escritores estavam mortos. Mas aí eu via o Fernando Sabino andando de mocassim”, contou Humberto, que está lançando Viagem no país da crônica (Tinta-da-China Brasil).

Já Luís Henrique Pellanda – autor do recente A crônica não mata (Arquipélago), entre outros livros – refletiu sobre como o cronista pode servir como uma espécie de termômetro do seu tempo. “A política move a nossa vida pública, social e conjunta. Vivemos no Brasil há alguns anos uma ebulição política que atrapalha tudo, inclusive a saúde do cronista e de todo mundo. Registrei durante 15 anos a cidade de Curitiba, que se transformou de maneira negativa num dos centros do debate político brasileiro, por conta da Lava Jato. Quem não estava lá, não é capaz de imaginar a toxicidade do ambiente nesses anos. Sem falar nenhuma vez os infelizes nomes de [Sergio] Moro, Deltan [Dallagnol] ou Lava Jato, consegui registrar como a vida na cidade piorou nesse tempo. Sem falar em política diretamente, passei a ser xingado na rua, fui hostilizado em lugares que frequentava, até com as minhas filhas pequenas. Mesmo assim, como cronista, consegui manter meu trabalho nos trilhos”, compartilhou.

O vício nos livros

À tarde, o espanhol Jorge Carrión e o português Afonso Cruz falaram sobre suas experiências com a leitura e com os objetos-livro em si, bem como com as livrarias.

"Não gosto da ideia do livro como investimento capitalista, me dá uma certa repulsa", disse Carrión, autor de Livrarias (Bazar do Tempo) e Contra Amazon (Elefante). "Se o mesmo livro tem uma edição de bolso que custa mais barata, é essa a que eu compro", disse. O escritor também defendeu uma regulação do desconto dos lançamentos de livros, legislação em vigor em vários países, como a Espanha – no Brasil, a Lei Cortez, que limita os descontos nos primeiros doze meses após o lançamento de um livro, está para ser discutida e votada no Plenário do Senado.

A Feira

No sábado (21), penúltimo dia d’A Feira do Livro, a programação do Palco Petrobras traz Marina Lima, que homenageia seu irmão, o compositor e poeta Antonio Cicero; o cineasta Ugo Giorgetti e o escritor Mario Prata conversam sobre literatura e futebol; e o podcast Foro de Teresina, da revista piauí, se apresenta ao vivo. Ainda no Palco Petrobras, haverá conversas com a autora Beatriz Bracher, e com o poeta Leonardo Fróes.

Para o público infantil, o paleontólogo Luiz Eduardo Anelli explora as características de dinossauros brasileiros em bate-papo no Espaço Rebentos. Já no Tablado Literário Mario de Andrade, o escritor e roteirista Antonio Prata fala sobre suas colunas na Folha e seus livros.

Também em destaque, o Auditório Armando Nogueira recebe encontros com o economista e ensaísta Eduardo Giannetti; e com a historiadora Mary Del Priore; já Marilene Felinto, jornalista e escritora pernambucana, recebe para o lançamento de seu novo romance, Corsária (Ubu).

O domingo (22), último dia do evento, começa com dois jogos de futebol entre autores na Mercado Livre Arena Pacaembu. Ao longo do dia, no Palco Petrobras, a escritora Cidinha da Silva faz uma homenagem a Sueli Carneiro; o ator e escritor Lázaro Ramos, ao lado do teólogo carioca Ronilso Pacheco, debate negritude, história e sociedade no Brasil atual; e Neide Rigo fala sobre como se alimentar melhor nos dias de hoje.

No Espaço Motiva Tablado Literário, Mary Del Priore fala sobre envelhecimento; no Auditório Armando Nogueira, a poeta, tradutora e ensaísta Marília Garcia conversa sobre poesia com a também poeta e tradutora Bruna Beber em um episódio ao vivo do podcast 451 MHz. Bela Gil e Daniel Kondo apresentam seu lançamento infantil Florisbela (WMF Martins Fontes) no Espaço Rebentos. Conrado Hübner Mendes fala sobre autoritarismo no Tablado Literário Mário de Andrade; e Waldete Tristão e Elizabeth Cardoso conversam sobre infâncias negras, dignidade e imaginação no Tablado Literário das Bancadas.

A Feira do Livro 2025 é uma realização da Associação Quatro Cinco Um, organização voltada para a difusão do livro no Brasil, da Maré Produções, empresa especializada em exposições de arte, e do Ministério da Cultura, por meio da Lei Rouanet – Incentivo a Projetos Culturais. O evento tem apresentação exclusiva da Petrobras, patrocínio Prata da Prefeitura de São Paulo e da Motiva, por meio de seu Instituto, patrocínio Bronze do Itaú Unibanco, e apoio do Instituto Ibirapitanga, Pinheiro Neto Advogados e enjoei.

[20/06/2025 15:17:10]