Feira de Pequim reflete sobre o equilíbrio entre cultura local e ambição global e destaca o papel do livro como arte
PublishNews, Talita Facchini, 19/06/2025
Intercâmbio cultural com o Brasil, os desafios na sua expansão internacional, e a importância visual do livro para as novas gerações foram alguns dos temas abordados na programação do evento na capital chinesa

PEQUIM, China – Como entender e explorar a própria cultura e, ao mesmo tempo, apresentá-la para uma audiência internacional que não está familiarizada com essa tradição? Esse é o dilema central que move a organização da Feira Internacional do Livro de Pequim (BIBF) a criar uma programação diversa, mas ainda focada na cultura local.

Em sua 31ª edição, o evento mantém a missão de expandir seus negócios internacionais enquanto vê a necessidade de se comunicar com o público local. “Queremos mostrar aos editores internacionais a relevância que a nossa feira tem para os negócios e deixar claro que somos um mercado aberto”, afirmou Lin Liying, presidente da Corporação Nacional de Importação e Exportação de Publicações da China (CNPIEC), em conversa com o PublishNews.

O aumento do espaço dedicado à compra e venda de direitos é uma resposta direta a quem duvida do potencial comercial da Feira. “Sinto que o nosso mercado ainda tem um enorme potencial para que todos venham e ganhem dinheiro”, comentou Lin. “Por outro lado, lidamos com a demanda local, o que nos leva a um debate interessante entre o local e o internacional, porque cada país sempre quer que seus habitantes cresçam entendendo completamente sua própria cultura primeiro”, completou.

Brasil x China

Madam Lin Liying
Madam Lin Liying
Do ponto de vista internacional, as relações com o Brasil têm ganhado destaque. Na última semana, uma delegação com 20 representantes de oito editoras chinesas esteve na Bienal do Livro Rio. “Eles procuram fazer edições e coedições. Querem também levar literatura brasileira para lá e estreitar os laços. O mercado chinês é muito pujante e costuma vender 200 mil exemplares de um único livro”, comentou o editor Tomaz Adour, diretor do SNEL.

“A embaixada brasileira na China e a chinesa no Brasil mantêm diálogos constantes para criar esse tipo de intercâmbio e unir as pessoas por meio dos livros”, disse Liying, que participou da delegação. “Acredito que o Ano Cultural Sino-Brasileiro em 2026 será uma grande oportunidade para nos aproximarmos ainda mais”, afirmou, referindo-se à iniciativa formalizada durante a visita do presidente chinês Xi Jinping ao Brasil em novembro de 2024, e que visa celebrar os 50 anos das relações diplomáticas entre os dois países.

Enquanto as comemorações não começam, a Feira se prepara para o lançamento oficial da biografia do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, escrita por Fernando Morais. O título, publicado pela Yilin Press, um selo da gigante Phoenix Publishing and Media Inc., terá um evento especial nesta sexta-feira (20), com presença de membros das embaixadas do Brasil e da China.

O livro como arte

A importância de manter a cultura local presente pode ser identificada em toda a programação da BIBF, especialmente no Pavilhão dos Livros de Arte, que sediou o 3º Fórum Internacional de Publicação de Arte de Pequim. Nas apresentações, destacou-se o valor das particularidades dos livros: no design, na tradução e na capa.

“A tradução perfeita é um mito”, disse Yun Wu, reitor da Escola de Línguas Estrangeiras da Universidade Tongji, ao abordar os desafios de lidar e preparar as obras chinesas. “É importante que os profissionais do mercado tenham conceitos da nossa arte e uma comunicação intercultural ao trabalhar com livros chineses”, apontou.

Mais de um painel abordou o papel da arte, do design e da ilustração no negócio editorial. “Em um mercado saturado, onde os leitores são inundados com opções, a capa do livro funciona como o aperto de mão visual mais poderoso do mundo editorial”, disse Jacks Thomas, diretora do BolognaBookPlus (Feira do Livro de Bolonha), em seu discurso no Fórum de Publicação de Arte.

“Agora, mais do que nunca, o design da capa de um livro desempenha um papel crucial para capturar a atenção e influenciar decisões de compra — seja na prateleira de uma livraria ou na tela de um celular”, completou.

“Num mundo digital e com a Geração Z aparentemente ocupada demais para se envolver com o produto físico, tem sido maravilhoso vivenciar a evolução do BookTok e de outras oportunidades de marketing editorial que crescem organicamente e dão tanta ênfase ao visual, à criatividade, à arte e aos valores de produção dos livros”, continuou Thomas. “Quem poderia prever, mesmo há 10 anos, que aspectos tão tradicionais de um livro, como as capas, poderiam desfrutar de tal renascimento graças a leitores que valorizam a experiência visual além das palavras?”

Essa reinterpretação do papel do livro e sua importância visual esteve presente em diversos momentos do evento. Nesta quinta-feira, em uma conversa sobre o papel da ilustração na publicação global, Julia Zhu, editora-chefe adjunta da Phoenix Fine Art Publishing, destacou que com as novas gerações crescendo em um mundo totalmente digital, “a tradução, a ilustração e o design ganham um sentido ainda mais importante”, já que conseguem atravessar fronteiras e ganhar novas interpretações com facilidade.

No geral, o poder da China de criar e espalhar tendências também foi abordada, no sentido de que o mercado editorial pode tirar proveito dessa influência. “O Labuubu, por exemplo, é um fenômeno único e que surgiu num timing especial. A China vai sendo criada por essas tendências únicas e cada delas ajuda a expandir nossa cultura para o público global”, comentou Yiwu Zhang, Diretor do Comitê para Arte e Cultura e Professor da Peking University. "É algo que todos devem prestar atenção e encontrar maneiras de aproveitar".

*A jornalista viajou a convite da Corporação Nacional de Importação e Exportação de Publicações da China (CNPIEC).

[19/06/2025 07:20:00]