Crescimento tímido do mercado editorial brasileiro reforça aposta em livrarias físicas e inovação digital
PublishNews, Guilherme Sobota e Talita Facchini, 29/05/2025
Profissionais do setor ouvidos pelo PublishNews compartilham suas primeiras impressões sobre a Pesquisa Produção e Vendas, que viu resultado positivo em 2024, impulsionado pelos subsetores de Obras Gerais e Religiosos

Livraria da Travessa | © Beatriz Sardinha
Livraria da Travessa | © Beatriz Sardinha

A Pesquisa Produção e Vendas e Conteúdo Digital do Setor Editorial Brasileiro – realizada pela Nielsen BookData, em parceria com CBL e SNEL – apresentou seus resultados nesta quarta-feira (28), mostrando que o setor encerrou o ano de 2024 com um crescimento real de 0,2% no faturamento. Entre os destaques desta edição, estão o bom desempenho dos subsetores de Obras Gerais e Religiosos, bem como do digital, que puxaram o faturamento do setor para cima.

Obras Gerais apresentou um resultado positivo no faturamento de 9,2%. Descontada a inflação, as vendas ao mercado cresceram 4,2%. “O que possibilitou esse aumento no faturamento das editoras de Obras Gerais foi a recuperação do preço”, analisou Mariana Bueno, economista da Nielsen BookData responsável pela pesquisa.

Um dado importante relacionado ao subsetor é o crescimento de 2,2% das Livrarias entre os canais de distribuição. “Quando identificamos que há uma retração no e-commerce e um avanço das lojas físicas, há que se levar em conta que muitas editoras nos últimos anos concentraram seus esforços nas ações do e-commerce – seja nas suas próprias operações ou nas lojas dedicadas a este tipo de varejo – com isso podemos crer que quem manteve essa estratégia ou andou de lado ou teve queda em valores reais”, comenta Gerson Ramos, diretor comercial da Planeta.

Ao comparar os dados da editora com o mercado, Ramos identificou uma evolução positiva diferente da média geral. “Muito disso deveu-se à nossa persistência em apoiar as lojas físicas, em especial no que diz respeito aos lançamentos, pois, conforme temos enfatizado repetidamente, as livrarias têm papel mais determinante na venda neste recorte do catálogo do que as operações online”.

Ramos destaca ainda a baixa participação do segmento Distribuidoras no conjunto geral das vendas. “Sem que repensemos de forma consistente o papel representado por esta parte da cadeia do livro será muito difícil projetar melhoras para o mercado. Não há como editoras atenderem toda a diversidade de tipos de varejos sem que haja um novo acordo para Editoras e Distribuidores para que atendam com equilíbrio os diferentes cantos do Brasil – ou iremos continuar vendo as vendas globais perdendo valor real”, frisou.

Na visão de Mauro Palermo, diretor da Globo Livros, em 2024, apesar da falta de dinheiro e da crescente competição pelo tempo dos leitores de livros, as editoras – Globo Livros incluída – “fizeram seu dever de casa e cumpriram sua missão de difundir a leitura no país”, disse ao PublishNews. “A má notícia, entretanto, veio do Governo Federal com a redução drástica na aquisição de obras paradidáticas. E, para piorar o cenário, Brasília parece seguir o mesmo caminho em 2025”, acrescentou.

Didáticos, CTP e digital

O resultado geral da Pesquisa é reflexo também do impacto das vendas de didáticos ao governo: o ano de 2023 foi de compra para o Ensino Médio, que conta com um alto índice de evasão escolar. Em 2024, além da compra ter sido para Infantil e F1, o governo realizou o pagamento do Objeto 2. “A diferença fundamental é sobre o ciclo de compras e no que o governo pagou. Esse aumento está dentro do esperado”, esclarece Mariana Bueno.

Outro ponto de destaque no estudo é relacionado ao subsetor de CTP. Ao contrário de Obras Gerais, o avançø do preço continua abaixo da inflação, mas houve um aumento nominal no faturamento de 3,3%. Além disso, é um subsetor que tem migrado para o digital e que a cada ano vê o crescimento das Livrarias Exclusivamente Virtuais.

Aliado a esse ponto, o Conteúdo Digital – que apresentou alta nominal de 21,6% – contou com o impulso das Bibliotecas Virtuais e Plataformas Educacionais, um movimento que já se delineava nos últimos anos. “O uso de sistemas de ensino é uma realidade em parte das escolas privadas do país, sobretudo no Ensino Médio. Observamos, entretanto, uma ampliação desse uso no Ensino Fundamental e na Educação Infantil, além de uma adesão crescente por parte de redes públicas municipais”, explica Roberta Perazzo Campanini, diretora de marketing, produtos e experiência do cliente da FTD Educação. A profissional acredita ainda que essa tendência deverá se intensificar nos próximos anos, impulsionada pela evolução das infraestruturas digitais, pelo uso de tecnologias emergentes, como a Inteligência Artificial generativa, e pela formação continuada dos educadores.

“É relevante destacar que o setor tem respondido a essa demanda por meio de investimentos significativos no desenvolvimento de produtos digitais. Na FTD Educação, por exemplo, foram destinados mais de R$ 30 milhões para mais de 70 projetos voltados à inovação e à transformação digital, com foco na melhoria da experiência educacional”, completa Campanini.

Em relação aos canais de distribuição, a digitalização também é perceptível. “Hoje, os canais de ‘Escolas e Colégios’ têm participação semelhante à de ‘Livrarias’ em volume, ao passo que observamos um crescimento dos marketplaces e dos sites próprios das editoras, reflexo da busca por maior conveniência e segurança. No mercado privado, por exemplo, a FTD Educação detém aproximadamente 20% de participação no segmento de sistemas de ensino”, comprova Roberta.

Em uma análise mais geral, Karine Pansa, CEO do Grupo Girassol e ex-presidente da International Publishers Association (IPA), acredita que o bom desempenho de Obras Gerais e Religiosos reflete uma busca crescente das pessoas por conforto, acolhimento e respostas. “É algo que se conecta muito com o papel que o livro pode (e deve) ter: ser companhia, pausa, reflexão. E olhando para frente, acredito que veremos essa mesma tendência se repetir de forma bastante clara nos livros de colorir, que têm ganhado força silenciosa, mas constante, com cada dia mais títulos disponíveis no mercado”.

[29/05/2025 11:00:00]