
Não, não era uma pessoa fácil. Inteligente e culto, era bastante intolerante com pessoas que não usassem um raciocínio lógico na argumentação. Dizem que chegava a ser ranzinza. Se, de fato, o fosse, era um ranzinza inteligente e culto, dono de um terrível senso de humor, que poupava poucos. Quem teve Pedro como colega na diretoria da Câmara Brasileira do Livro, como eu, sabe que ele se irritava muito com conversa fiada. Logo bradava, em inglês, insistentes pedidos de “next, next”. Acabava sendo ouvido, a pauta avançava e assim tivemos um período de muita atividade a favor do livro na CBL.
Mas ele não era apenas culto e inteligente. Conheço vários cultos e inteligentes que, perdidos em dúvidas existenciais ou simples preguiça, financiada por alguma instituição, não produzem nada. Pedro era um trabalhador compulsivo que tomou para si a responsabilidade de dotar São Paulo de livrarias dignas do tamanho e da importância que a metrópole tinha adquirido. E aí pudemos ver, integralmente, o talento dele.
Seu papel foi o de transformar o sonho de sua mãe, dona Eva, em uma grande realidade. Ou grandes e lindas realidades, se somarmos todas as livrarias que construiu, com enormes doses de sonho e bom gosto. Qual editor de São Paulo não ouviu da maioria de seus autores a pergunta “mas não dá pra fazer o lançamento na Cultura?”, quer se tratasse de um romance muito falado, quer de uma dissertação de mestrado, ou uma explicação sofisticada e quase ilegível sobre o sentido da vida? Sem menosprezo aos demais livreiros, é indiscutível que Pedro conseguiu transformar suas livrarias em modelo de livraria e isto trouxe benefícios a autores, editores e até outras livrarias. Nada como o exemplo. Ele mostrou que, mesmo em nosso país, ágrafo e pobre em leitores, uma loja de livros pode e deve ser glamorosa, uma atração da cidade, lugar para onde levávamos os amigos. Pelo menos os cultos e inteligentes.
Não pude ir ao Cemitério Israelita do Butantã para me despedir de você. Eu me despeço agora. Com o abraço respeitoso e amigo que você fez por merecer. Afinal, mesmo tendo sido um cara muito crítico e autocrítico, fique tranquilo. Você fez um belo trabalho!
