Na última quinta (6), um documento da Secretaria de Educação de Rondônia chamou a atenção por determinar o recolhimento de 43 livros das escolas estaduais. Na lista, estão livros de autores como Caio Fernando Abreu, Carlos Heitor Cony, Euclides da Cunha, Ferreira Gullar, Rubem Fonseca e Franz Kafka. Obras como Macunaíma, de Mário de Andrade e Memórias Póstumas de Brás Cubas, de Machado de Assis, obrigatórias para os vestibulares, também fazem parte da lista.
Assinado pelo secretário de educação, Suamy Vivecananda Lacerda de Abreu, o documento alegava que os livros apresentam "conteúdos inadequados às crianças e adolescentes". Depois de ser questionada, a secretaria tornou o processo secreto ainda na quinta-feira e logo depois recuou na decisão.
A tentativa de censura levou editoras a se manifestaram em suas redes sociais e a Ordem dos Advogados do Brasil Seccional de Rondônia (OAB / RO) e a Academia Brasileira de Letras enviaram notas de repúdio. “Trata-se de gesto deplorável, que desrespeita a Constituição de 1988, ignora a autonomia da obra de arte e a liberdade de expressão”, diz o comunicado enviado pela ABL, que afirma ainda que a Academia “não admite o ódio à cultura, o preconceito, o autoritarismo e a autossuficiência que embasam a censura”.
Para Volnei Canonica, presidente do Instituto de Leitura Quindim, ex-Diretor do Livro, Leitura, Literatura e Bibliotecas do MinC e colunista do PublishNews, a tentativa de censura pode ser analisada em dois pontos: a falta de conhecimento do gestor da pasta e da falsa ideia de que a cultura e a literatura são doutrinadoras. “A tendência é que esse tipo de ação aumente, porque o governo e a sociedade não sabem lidar com o contraditório e sem um projeto de educação bem desenhado, nem um projeto de diálogo com a sociedade, existe sim a tentativa de doutrinação na educação”, explicou.
O Ministério Público Federal (MPF) anunciou que irá investigar a ordem da Secretaria de Educação de Rondônia e afirmou que o fato de o governo ter voltado atrás na decisão não encerra o caso.
Ainda segundo Volnei, o maior problema que toda essa história pode gerar é jogar a sociedade contra as escolas. “Quando o gestor, que é a pessoa achamos que deveria ter um discernimento maior, lança uma polêmica do tipo, ele está dizendo que tem algo errado dentro da escola e a sociedade compra isso. A partir daí começam os ataques”, pontuou.
Confira a íntegra do comunicado enviado pela ABL.
A Academia Brasileira de Letras vem manifestar publicamente seu repúdio à censura que atinge, uma vez mais, a literatura e as artes. Trata-se de gesto deplorável, que desrespeita a Constituição de 1988, ignora a autonomia da obra de arte e a liberdade de expressão. A ABL não admite o ódio à cultura, o preconceito, o autoritarismo e a autossuficiência que embasam a censura.
É um despautério imaginar, em pleno século XXI, a retomada de um índice de livros proibidos. Esse descenso cultural traduz não apenas um anacronismo primário, mas um sintoma de não pequena gravidade, diante da qual não faltará a ação consciente da cidadania e das autoridades constituídas.