Daqui uns dias, começa mais um Navegar é Preciso, projeto de viagem encampado pela Livraria da Vila há quatro anos e, que nesse ano, vai levar às águas do Rio Negro, nomes como Alejandro Zambra, Marcelino Freire e Humberto Werneck para conversas sobre livros e literatura e interação com leitores e, claro, com a natureza. A iniciativa cai como uma luva dentro da proposta da Livraria da Vila, que se estabeleceu como uma livraria-butique, onde se faz um delicioso culto quase fetichista ao objeto livro. O PublishNews entrevistou Samuel Seibel, proprietário da casa, e ele conta a importância de projetos como esse, fala de planos para o futuro, as ameaças e oportunidades do livro digital. Leia abaixo a transcrição da entrevista.
PublishNews - Como surgiu a ideia de levar escritores para encontro com fãs além dos limites das lojas?
Samuel Seibel - A proposta do Navegar é Preciso tem tudo a ver com o dia a dia da Livraria da Vila e com a forma como enxergamos o mercado. Estimular a convivência entre leitores e autores é uma maneira de fomentar o prazer pela leitura, possibilitando debates e discussões. Realizar um encontro literário em um barco em pleno Rio Negro, na Amazônia, faz com que autores e leitores “comuns” sintam-se à vontade para contar causos e histórias que não seriam possíveis, ou, pelo menos, não de maneira tão espontânea, em outros ambientes.
PN - Ampliar o espectro de ação, não se limitando a ser um mero ponto de vendas de livros, é uma forma de sobreviver e crescer nesse mundo cada vez mais digital?
SS - O Navegar é Preciso não nasceu com qualquer objetivo financeiro e, até hoje, em sua quarta edição é totalmente viabilizado pela venda das cabines do barco aos passageiros. Queremos proporcionar ao público da Livraria da Vila - leitores assíduos e formadores de opinião - uma experiência diferente, em um destino brasileiro pouco frequentado como a Amazônia.
PN - Qual o perfil dos participantes do Navegar é preciso?
SS - São fãs de literatura, música e artes, que buscam um programa diferente, fora da caixa. Trata-se de uma viagem direcionada ao público jovem e adulto em busca de momentos agradáveis e bate-papos sobre os mais variados temas. Ao longo destes quatro anos, notamos que várias pessoas vão sozinhas ao Navegar e lá acabam fazendo amizades, se desprendendo de seu núcleo de convívio habitual.
PN - Como é feita a curadoria dos autores convidados?
SS - A curadoria do Navegar é Preciso é feita pela Livraria da Vila, a partir de uma lista de nomes de escritores, músicos, atores e outros artistas com os quais já temos relacionamento ou que possam compor boas mesas de conversa. Uma das características da nossa curadoria é deixar os temas dos encontros e bate-papos em aberto, não direcionando e nem interferindo na condução das conversas. Cada autor fica à vontade para definir sobre o que irá falar, somando ao clima descontraído que já caracteriza a viagem.
PN - Ano que vem, a LV completa 30 anos. Como será comemorado o aniversário?
SS - Será uma data de enorme importância para uma empresa que contribuiu muito neste período para a formação de novos leitores de todas as idades. Com certeza, 2015 será um ano de muitas comemorações, ainda estamos desenhando o formato de cada uma delas.
PN - Qual o balanço que você faz desse período?
SS - Os primeiros 19 anos de existência da Livraria da Vila foram de forte consolidação no mercado junto a um público residente ou frequentador da Vila Madalena, intelectual e que lê muito. Fomos desenhando ali nosso modelo de negócios, sempre pensando tanto no cliente quanto no funcionário, incentivando o hábito de leitura em todas as fases da vida e das mais diversas formas. O modelo foi mantido quando expandimos para outros endereços da capital, interior, em Campinas, e na nossa mais recente loja, em Curitiba, onde não havia o conceito de “polo cultural” em livrarias. Outro cuidado enorme foi o de tornar cada uma das unidades da Vila um destino. Cada uma com sua característica arquitetônica, de forma a provocar/instigar o cliente, permitindo que ele escolha sua favorita, onde se sente mais à vontade.
PN - E daqui pra frente? O que esperar da LV?
SS - Continuaremos firmes no nosso trabalho de consolidação no mercado como uma livraria diferenciada, amiga do cliente, democrática e composta por equipes altamente qualificadas e leitora. Cada vez mais, fortaleceremos a Vila como um polo cultural das regiões em que atua, oferecendo ao público uma ampla programação cultural e ambientes que proporcionem a discussão, o conhecimento. Seja dentro de um auditório ou numa agradável mesa de café. Sem dúvida que acompanharemos as mudanças e tendências do mercado.
PN - Você sempre diz que se um dia as pessoas deixarem de sair de casa pra irem às livrarias seria a falência não só das livrarias (e dos livros) mas também da sociedade. Os investimentos em vendas pelo site da LV são tímidos, se comparados aos feitos pelos concorrentes. A gente pode concluir que investir em vendas pela internet ou mesmo no livro digital é algo que não está nos planos de crescimento da livraria?
SS - De forma alguma. Sabemos e entendemos o potencial e a importância das vendas pela internet ou mesmo do relacionamento com clientes de praças onde não estamos no momento. Nestes últimos anos investimos e focamos muito na expansão física para locais aonde julgávamos fundamental implementar a marca e o conceito da Livraria da Vila. Paralelamente a tudo isso, fizemos e continuamos fazendo toda uma estruturação da área de TI para que possamos entrar com força no ambiente virtual.
PN - Como o Kindle entra nessa história? A Livraria não só vende o dispositivo como foi o primeiro varejista a colocá-lo no mercado brasileiro. Na época, muita gente não entendeu porque a Vila começou a comercializar o 'device' e surgiram especulações de toda sorte... Você poderia dar a sua versão para os fatos?
SS - A Livraria da Vila foi procurada pela Amazon para uma parceria com o objetivo de apresentar o Kindle ao mercado brasileiro. Entendemos que faz parte do nosso serviço ao cliente mostrar e oferecer a ele as diferentes opções e formas de leitura, contribuindo assim para a construção de uma sociedade culta e leitora. Não fazemos qualquer julgamento sobre a preferência de um ou de outro pela plataforma digital ou impressa, mas acreditamos que seja fundamental dar a opção ao cliente e deixá-lo escolher. O Kindle, portanto, veio para complementar o nosso mix de produtos e para contribuir com o objetivo de formar novos leitores.