Marisa Lajolo vive em um momento agitado da sua vida. Não bastasse o lançamento do seu livro Monteiro Lobato, livro a livro (obra adulta), a pesquisadora e professora de Teoria Literária foi anunciada há pouco mais de uma semana como a nova curadora do Prêmio Jabuti. Ela entra em campo para substituir José Luiz Goldfarb, que ocupou o cargo por mais de 20 anos. O PublishNews entrevistou Marisa Lajolo e ela falou sobre os desafios de suceder Goldfarb e sobre as novidades da 56ª edição do prêmio. A respeito da polêmica do Jurado C na qual o Jabuti se viu envolvido em 2012, Lajolo conta bem-humorada que o caso daria um bom título de romance policial e, otimista, diz que espera que o livro um dia seja tão popular quanto o futebol ao ponto de as pessoas discutirem as escolhas do júri como discutem as questões de arbitragem no campo. Leia abaixo a íntegra da entrevista:
PublishNews - Você assume a curadoria depois de uma gestão longa que durou mais de 20 anos. Encara isso como um desafio?
Marisa Lajolo - Um desafio imenso. Goldfarb deu ao prêmio representatividade e reconhecimento nacional.
PN - Qual será a sua maior missão agora como curadora do Jabuti?
ML - Em discussão com o Conselho Curador estabelecemos como proposta tornar o Jabuti – ao longo de todo o ano - uma oportunidade para discutir, em todos os fóruns possíveis, a leitura (prática tida como rarefeita, no Brasil) e leitores, figuras sorrateiras e misteriosas, não obstante fundamentais... Pois não é em nome delas que se escrevem livros?
PN - O prêmio se envolveu em 2012 em uma polêmica que ficou conhecida como o caso do Jurado C. À época, o então curador admitiu fragilidades nas regras do prêmio. Em 2013 houve mudanças para que se evitasse o desequilíbrio na disputa. Em sua opinião, você acha que esse episódio arranhou a imagem do prêmio?
ML - O caso do jurado C seria um sensacional título para um romance policial… Romance dos bons, não é mesmo? Penso que os mais de cinquenta anos do prêmio relativizam os sempre inevitáveis tropeços. Numa outra perspectiva, a polêmica, sobretudo em questões culturais, me parece saudável. Traz para o ar livre questões que geralmente ficam restritas a ambientes fechados. Quem sabe, um dia, teremos multidões lendo e discutindo prêmios literários, como se discute a arbitragem de jogos de futebol?
PN - Uma das novidades anunciadas junto com o seu nome como curadora é a instituição de uma categoria especial para traduções de originais em inglês, em parceria com o British Council. Você poderia falar um pouco sobre a parceria e o que se espera dela?
ML - É uma tradição do Jabuti incluir, entre as categorias que premia, obras traduzidas de uma língua específica. Ano passado, por exemplo, a premiação contemplava traduções do alemão. Este ano será a vez do Inglês. Dada a extrema importância que literatura inglesa exerceu (e exerce) sobre a brasileira, a parceria com o British Council é muitíssimo bem-vinda.
PN - Como você vê a produção literária nacional contemporânea?
ML - Sou leitora de caderneta dos escritores brasileiros de hoje. E, ao lê-los, tento despir-me de preconceitos. Acho que a variedade dos gêneros a que se dedicam nossos escribas- empenhados e corajosos- tem criado novos nichos de leitores. A literatura - a partir do pioneirismo dos livros para crianças e jovens – parece sair do gueto de artigo de luxo, voltado para uns poucos leitores, mais preparados do que outros e por isso tidos como melhores. Algumas áreas de estudos literários acadêmicos contemporâneos, ao focalizarem questões de leitura e da materialidade da literatura parecem confirmar o acerto destes rumos.
PN - Como será feita a seleção dos jurados para a 56ª edição do Jabuti?
ML - Seguirá os trâmites que tem seguido: a partir de indicações dos associados da Câmara Brasileira do Livro - profissionais todos, experientes em diferentes instâncias da cadeia do livro – o Conselho Curador amplia, discute e decide as indicações.
PN - Você recebeu o Jabuti em 2009 por Monteiro: Lobato Livro a Livro (obra infantil). O que muda na vida de um escritor quando ele ganha o Jabuti?
ML - Acho difícil me considerar escritora… Fui apenas organizadora – junto com João Luis Ceccantini – do livro que ganhou o Jabuti em 2009, e foi considerado Livro do Ano (não ficção). Foi ótimo. “Muito ótimo, bis – ótimo”, como diria a Emília! O livro é fruto do trabalho de jovens pesquisadores de universidades públicas paulistas; a premiação confirmou (para mim, e espero que também para eles) a importância de pesquisas coletivas, debruçadas sobre documentação primária, com resultados legíveis para o grande publico: não podíamos trair a popularidade e a legibilidade lobatiana, não é mesmo? A premiação – no que representa de reconhecimento de um tipo de trabalho – animou o grupo a prosseguir na pesquisa. O resultado é o livro que estamos lançando pela Editora da UNESP, Monteiro Lobato livro a livro (obra adulta) que estuda, discute e divulga um Lobato muito menos conhecido do que o Lobato para crianças. Mas tão interessante quanto…