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Movimentos atuais da literatura brasileira
PublishNews, 16/07/2013
Movimentos atuais da literatura brasileira

O projeto Conexões Itaú Cultural – mapeamento Internacional da Literatura Brasileira, se propõe a construir um banco de dados sobre professores, pesquisadores e tradutores da literatura brasileira no exterior. Já escrevi algumas vezes aqui sobre o Conexões, do qual sou um dos curadores, juntamente com o professor João Cezar de Castro Rocha. Alguns dos dados estatísticos sobre os quase 250 mapeados podem ser consultados aqui. Ali também podem ser consultados textos resgatados de pesquisadores, alguns produzidos especialmente para o projeto. Também podem ser vistos cerca de 150 vídeos gravados com depoimentos de autores e pesquisadores que participaram dos vários eventos do Conexões e de outros programas do Itaú Cultural.

Além do mapeamento, o Conexões suscita, junto aos curadores e outros pesquisadores, a produção de pesquisas específicas, seja usando o banco de dados, sejam inspiradas pelos temas do projeto. Foi assim na última Flip, quando o Conexões apresentou quatro pesquisas inéditas reunidas como “Movimentos Atuais da Literatura Brasileira”. As quatro em breve estarão disponíveis no site mencionados.

A professora Laetitia Jensen Eble, que integra o Grupo de Estudos em Literatura Brasileira da UnB (coordenado pela prof.Regina Dalcastagné) preparou um trabalho, a partir do levantamento dos currículos da Plataforma Lattes, do CNPq.

O professor João Cézar Castro Rocha aproveitou alguns dados dessa pesquisa, comparou-os com os do banco de dados do Conexões e preparou um instigante trabalho sobre o novo perfil do “brasilianista”, e que autores são estudados.

Fábio Malini, professor da Universidade Federal do Espírito Santo, onde coordena o Laboratório de Estudos sobre Imagem e Cibercultura (Labic) do Departamento de Comunicações, preparou um interessante mapeamento das fanpages e hashtags dos retuítes sobre cinco autores da literatura brasileira: Leminski, Machado de Assis, Clarice Lispector e Caio Fernando de Abreu.

Eu, que não dou aula em lugar nenhum, fiz um levantamento sobre o espetacular aumento de feiras de livros e festivais literários no Brasil, assim como o montante gasto por prefeituras e governos estaduais em diversas formas de “cheque-livro” ou “vale-livro” entregues para professores, alunos e bibliotecas nessas feiras de livro.

Os interessados poderão ter acesso, em breve, à íntegra desses trabalhos. Só pretendo aqui assinalar alguns pontos de interesse.

Em primeiro lugar, o fato do Conexões – com cerca de 250 questionários preenchidos – já permitir que dali se retirem informações pertinentes e importantes para o desenvolvimento de políticas públicas para a literatura brasileira, e em especial sua difusão no âmbito internacional. Quais os autores mais estudados, os temas e áreas de interesse desses pesquisadores são, entre outros, alguns dos dados pertinentes.

O artigo do prof. João Cézar de Castro Rocha destaca algumas questões. Em primeiro lugar, a mudança do conceito de “brasilianista”, termo que, quando cunhado, dizia respeito a especialistas estrangeiros que se dedicavam ao estudo de temas brasileiros. Pois bem, dos quase 250 mapeados, 85 – ou seja, um quarto – nasceram no Brasil. Estudar assuntos brasileiros a partir de universidades do exterior vem se tornando uma alternativa profissional para jovens pesquisadores brasileiros. João Cézar destaca, também, que alguns desses brasileiros que trabalham no exterior já estão formando uma nova geração de pesquisadores – alguns brasileiros, outros estrangeiros – que continuam esse aprofundamento de estudos, não apenas em literatura, como também em outras áreas.

Um segundo ponto de interesse no artigo de João Cézar de Castro Rocha é a ampliação das áreas de estudo. Os “brasilianistas” da literatura brasileira estudam cada vez mais a nossa literatura dentro do contexto de pesquisas mais amplas, que abarcam o cinema, a música, e outras formas de manifestação cultural. E, muito importante, cada vez mais dentro de um contexto de estudos de literatura comparada – seja com as demais literaturas latino-americanas, ou dentro dos estudos de gênero – literatura feminina, sobre a violência, gay, etc.

Finalmente, o artigo do prof. João Cezar destaca que os estudiosos de nossa literatura no exterior estão muito mais atentos aos autores contemporâneos – sem excluir os autores do cânone – que os que estudam nas universidades brasileiras. Essa informação decorre da comparação dos dados do Conexões com os levantados por Laetitia Jansen, que detectou, estudando os dados da plataforma Lattes, do CNPq, a presença de 2.176 professores-doutores, dentro da área de Letras, que se dedicam especificamente a estudar literatura brasileira. Laetitia Jansen extraiu dos currículos registrados algumas informações muito interessantes, entre as quais as quantidades de artigo e obras publicadas em revistas especializadas que divulgam a produção de 111 programas de pós-graduação em Letras existentes no país.

Uma das constatações mais interessantes desse trabalho aparece no ranking dos autores mais estudados: ao contrário dos pesquisadores que trabalham no exterior, os que aqui estão preferem, maciçamente, estudar os autores do cânone.

Os dois pesquisadores concluem: para os brasileiros, é mais frutífero se dedicar aos autores sobre os quais o diálogo com os pares está mais desenvolvido, as referências são mais abundantes e os resultados acadêmicos mais frutíferos. Para os que trabalham no exterior, ao contrário, o conhecimento dos movimentos contemporâneos é o mais valorizado, e por isso mesmo a presença de autores vivos e atuantes é significativamente maior.

Seja como for, existe uma coincidência: Machado de Assis, com certeza, é o autor mais estudado, aqui e lá fora.

O trabalho que Fábio Malini desenvolve no Labic já abriu novas avenidas para a compreensão do papel das redes sociais na sociedade contemporânea. Basta dizer que os levantamentos feitos por ele e sua equipe das manifestações recentes resultou em matérias publicadas em alguns dos principais jornais do Brasil e do mundo, como o New York Times e o El País.

Malini colocou seus robôs para acompanhar os retuítes produzidos a partir de fanpages ou citados por tuiteiros anônimos e que mencionavam os cinco autores citados. Apenas os retuítes, já que estes permitem verificar a extensão das redes que se constroem, onde estão os principais núcleos geradores de tuítes sobre cada um desses autores, e como essas redes se relacionam entre si. Uma visita à página do Labic é muito instrutiva. Além do mais, os diagramas das redes formadas a partir de diferentes temas produzem objetos estéticos com uma belíssima plasticidade.

O trabalho que apresentei mostra um quadro da evolução das feiras de livros no país, no que diz respeito à sua forma e qualidade. No início eram apenas eventos promocionais das editoras. Posteriormente, foram acrescentados espaços – cada vez mais estruturados – que permitiam o encontro dos autores com seus leitores, até chegarmos ao formato “festival de literatura”, do qual a Flip é o exemplo mais conhecido, embora não único.

Outro ponto de destaque é o aumento do número desses eventos, particularmente a partir do ano 2000. Hoje, o portal da FBN, que registra feiras e festivais de literatura que acontecem em 2013 pelo Brasil afora, registra 261 feiras/festivais em quase todos os estados. O destaque numérico é do Rio Grande do Sul, que atribuo, pelo menos parcialmente, à presença do sexagenário Instituto Estadual do Livro. Com suas deficiências e oscilações de programas e orçamentos, o IEL-RS é um exemplo praticamente único de continuidade institucional de políticas públicas para o livro no Brasil.

Outro levantamento apresentado é o do volume de recursos distribuídos a alunos, professores ou bibliotecas ou escolas através de vários mecanismos de vale livro ou cheque livro. Consegui informações sobre 2010 e 2011. No primeiro ano, foram distribuídos R$ 12.732.000. Já em 2011, esse montante subiu para R$ 26.120.000. Esse volume de recursos, pulverizado nas feiras, foi muito superior às compras de livros para bibliotecas feitas pelo Governo Federal (Ministério da Cultura) nos dois anos. Não se compara com os recursos destinados aos livros escolares nem ao programa da Biblioteca na Escola, que são muito maiores que os do Ministério da Cultura, e destinados especificamente às bibliotecas escolares e alunos.

O que importa destacar, no caso, é o seguinte: a) aumentam os espaços para as interações entre os autores e seus leitores. b) os recursos públicos (não se trata de toda a movimentação financeira das feiras) destinados ao mercado editorial nas feiras são significativos e tendem a crescer.

Certamente haverá questões de qualidade a serem levantadas nos dois fenômenos. Como se desenvolve efetivamente esse relacionamento autores/leitores, inclusive os métodos de seleção dos autores convidados, assim como o tipo de livros adquiridos com esses recursos. Mas aqui desejo destacar é que essas questões podem ser pesquisadas, agora, a partir de uma base quantitativa muito significativa.

E assim se movimenta a literatura brasileira.

Felipe Lindoso é jornalista, tradutor, editor e consultor de políticas públicas para o livro e leitura. Foi sócio da Editora Marco Zero, diretor da Câmara Brasileira do Livro e consultor do CERLALC – Centro Regional para o Livro na América Latina e Caribe, órgão da UNESCO. Publicou, em 2004, O Brasil pode ser um país de leitores? Política para a cultura, política para o livro, pela Summus Editorial. Mantêm o blog www.oxisdoproblema.com.br. Em sua coluna, Lindoso traz reflexões sobre as peculiaridades e dificuldades da vida editorial nesse nosso país de dimensões continentais, sem bibliotecas e com uma rede de livrarias muito precária. Sob uma visão sociológica, ele analisa, entre outras coisas, as razões que impedem belos e substanciosos livros de chegarem às mãos dos leitores brasileiros na quantidade e preço que merecem.

** Os textos trazidos nessa coluna não refletem, necessariamente, a opinião do PublishNews.

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