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Capas, Marketing e “tie-ins”
PublishNews, 30/04/2013
Capas, Marketing e “tie-ins”

Certa vez li um artigo, creio que na Publishers Weekly, sobre as várias capas do mesmo livro que circulavam simultaneamente. O livro era o Reparação, do Ian McEwan – em inglês Atonement – que estava circulando simultaneamente em três edições com formato, capa e preços diferentes. Havia a edição em capa dura, a original, com uma sobrecapa sóbria e custando por volta de US$ 30; uma edição paperback, em um formato parecido com o nosso de 14 x 21 cm, custando cerca da metade do preço, capa ilustrada, diferente da edição hardcover, mas também sóbria, e outra, designada como mass market, e custando cerca de US$10 (os valores são imprecisos, por conta da memória, que já não é lá essas coisas). Essa última tinha na capa uma foto do filme, com o Keira Knightley e o James McAvoy se beijando.

O que me intrigava era a coexistência das três edições, com preços diferentes. E capas diferentes.

É conhecido o fato de que, algum tempo depois do lançamento da edição em capa dura – vendida muito para bibliotecas –, as editoras americanas lançam paperbacks, edições de bolso. Às vezes, para atender obrigações contratuais, edições paperbacks eram lançadas na Holanda, para distribuição no mercado internacional, aproveitando a publicidade do lançamento. Nos últimos anos, com as edições em e-books, esse processo evidentemente se acelerou e assumiu novas formas.

Mas, na ocasião, e através do artigo, compreendi um pouco melhor a segmentação e estrutura de preços da indústria editorial dos EUA. Os custos, margem e retornos não são calculados por edição, e sim globalmente. Isso inclui também, eventualmente, os direitos territoriais de publicação – nem sempre o livro pode circular pelo mundo inteiro, e recentemente surgiram reclamações de que a Amazon não respeita isso (só isso?) – e de tradução.

No final das contas, isso revela uma postura que, infelizmente, não se vê muito por aqui: é preciso oferecer o livro em formatos e preços para todos os segmentos possíveis de mercado. O contrário é a postura elitista.

Na última sexta-feira, dia 26, o New York Times publicou uma matéria (na seção Mídia & Advertising) sobre as edições do romance de Scott Fitzgerald relacionadas ao próximo lançamento de uma nova versão do filme O Grande Gatsby, estrelada por Leonardo Di Caprio e Carey Mulligan, a ser lançada no dia 10 de maio (nos EUA), em versão 3D (existe outra versão do filme, estrelada por Robert Redford e Mia Farrow, de 1974).

A edição em catálogo, publicada pela Scribner’s, selo da Simon&Schuster, tem na capa uma reprodução da sobrecapa da edição original em hardcover, uma ilustração belíssima de Francis Cugat. Essa edição ainda vende em média 500.000 exemplares por ano (o livro é amplamente usado nas escolas). A nova capa, tie-in com o filme, apresenta uma foto de cena com o Leonardo Di Caprio cercado por uma moldura e tipografia que lembra os anos 20, época do filme. A matéria apresenta algumas informações interessantes.

Na quinta-feira, dia 25, já seguindo a barulho causado pelo filme, o livro (com a capa tradicional), era o mais vendido na Amazon. Na Barnes&Noble, na semana anterior, havia sido o paperback mais vendido. Na rede (B&N), as duas edições estarão disponíveis (na Amazon só vi disponível a edição tradicional). Em livrarias mais “literárias”, como a McNally Jackson (uma das melhores independentes de NY), só estará disponível a edição tradicional. Mas na Walmart, apenas a edição “cinematográfica” estará à venda.

Uma livreira independente, Cathy Langer, compradora da livraria The Tattered Cover, de Denver, comentou na matéria que, ao lançar as duas capas, os editores procuram alcançar dois públicos que não se sobrepõem.

Essa é a questão.

A indústria editorial americana procura os nichos de mercado. O mesmo conteúdo pode ser “empacotado” em diferentes embalagens (e preços) para alcançar públicos que não se comunicam. Os frequentadores de livrarias “literárias” (como a The Tattered Cover ou a McNally Jackson, para citar dois exemplos), não se confundem (necessariamente) com os que compram na Barnes & Noble, e muito menos com os que, motivados pelo filme, vão comprar no Walmart ou no supermercado da esquina.

E o que isso tem a ver conosco?

Infelizmente, essa percepção da segmentação do mercado é extremamente incipiente por aqui. As editoras lançam os livros nos formatos tradicionais do nosso mercado (14 x 21 cm ou 16 x 24 cm) e contam com fazer best-sellers. Se colar, colou. Se não colar (ou, mesmo tendo “colado”), depois de algum tempo os livros vão para a banca de saldos, ou são encontrados em ofertas casadas com outros títulos. Ou ficam criando fungos nos depósitos.

As iniciativas de reedição em “formato de bolso” que surgiram recentemente seguem ainda o antigo formato dos EUA. Relançam edições antigas, com novo formato e a preço menor, muito tempo depois do lançamento original. Mas estão muito longe de representar a dinâmica da exploração de mercados que se vê em outros países (não apenas nos EUA, mas também na Alemanha e na França). Só recentemente é que vimos a Avon – sim, a Avon, tradicional vendedora de cosméticos porta-a-porta – passar a vender livros, contratados com formatos e preços especiais para venda em seu mercado. Segundo informações de algumas editoras, é possível que a Avon seja, hoje uma das maiores (se não a maior) vendedora de livros do Brasil, ainda que de um número muito limitado de títulos.

A questão é que tanto os editores quanto os livreiros não gostam de livros baratos. Estão muito satisfeitos com a venda de livros caros, e não se esforçam para abrir novos mercados e conquistar clientes, possíveis leitores, que não frequentam as livrarias.

Uma parte dessa demanda é atendida nas bancas de jornais, nas coleções da L&PM, da Martin Claret (ugh!) e da Harlequin (que vende cada vez mais e-books). Outra parte é atendida pelos livreiros de coleções, nossos tradicionais vendedores do porta-a-porta, que não dispensam uma venda, seja lá onde esteja o cliente. Outro segmento que presta atenção nisso é o dos livros religiosos, inclusive os livros “espíritas”, que buscam todos os possíveis pontos de venda com edições baratas. Esses vão atrás dos clientes-leitores.

Mas o fato é que, infelizmente, falta à indústria editorial brasileira essa sede de conquistar – ou criar – novos mercados para seus produtos. Só que não adianta vender livros de luxo ou as edições corriqueiras, caras demais para o poder aquisitivo da grande maioria da população, nos pontos de venda tradicionais.

O potencial do mercado brasileiro de livros está longe de ser coberto. Da minha parte, só quero chamar atenção para essas possiblidades.

Felipe Lindoso é jornalista, tradutor, editor e consultor de políticas públicas para o livro e leitura. Foi sócio da Editora Marco Zero, diretor da Câmara Brasileira do Livro e consultor do CERLALC – Centro Regional para o Livro na América Latina e Caribe, órgão da UNESCO. Publicou, em 2004, O Brasil pode ser um país de leitores? Política para a cultura, política para o livro, pela Summus Editorial. Mantêm o blog www.oxisdoproblema.com.br. Em sua coluna, Lindoso traz reflexões sobre as peculiaridades e dificuldades da vida editorial nesse nosso país de dimensões continentais, sem bibliotecas e com uma rede de livrarias muito precária. Sob uma visão sociológica, ele analisa, entre outras coisas, as razões que impedem belos e substanciosos livros de chegarem às mãos dos leitores brasileiros na quantidade e preço que merecem.

** Os textos trazidos nessa coluna não refletem, necessariamente, a opinião do PublishNews.

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