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Autores e leitores: a interação necessária
PublishNews, 08/11/2011
Autores e leitores: a interação necessária

O que completa e dá sentido a um livro é sua leitura, como sabemos. Somente a fruição do conteúdo pelos leitores é que dá a este significado. Por isso mesmo, a busca pelos leitores é, de certa forma, um complemento da atividade do escritor. Busca que se perpetua mesmo depois da morte do autor, quando seu texto se incorpora ao imaginário social e continua sendo objeto de leitura. O escritor que diz que não precisa de leitores, que diz que “escreve para si mesmo”, não é mais que um autista da palavra.

Muitas vezes se confunde a busca do leitor com a busca do consumidor, do comprador de livros. Na sociedade capitalista, o sucesso se mede pela quantidade de livros vendidos, tomadas como sinônimo de livros lidos.

Essa é uma verdade parcial. Quantos livros são comprados e não lidos? E os lidos em bibliotecas, emprestados, furtados (esporte a que se dedicam estudantes pobres e loucos por leitura com pouco dinheiro, para lamento dos livreiros!) e que não há como computar nesse índice de leitores de um determinado título?

Assim, embora a quantidade de livros vendidos seja um indicador, cada vez mais os autores buscam modos de aumentar essa interação com seus leitores.

Os blogs e microblogs são algumas dessas formas, já que apresentam fragmentos da produção autoral para um universo mais amplo, com esperança de que quem os leia possa ser motivado e atraído para ler o livro todo.

Uma das maneiras mais tradicionais de proporcionar o diálogo dos autores com leitores é feita principalmente pelas editoras de didáticos, cujos divulgadores organizam visitas aos colégios, seja para convencer os professores a fazer uma adoção, ou também para conversas com alunos que usam os livros, principalmente os chamados paradidáticos ou os de ficção adotados pelos colégios.

Outro processo que tem crescido muito nos últimos tempos são os encontros de autores com leitores. Em um primeiro momento esses encontros eram fugazes: os lançamentos e noites de autógrafos ofereciam uma espécie de encontro pessoal, ainda que precário e apressado, entre autores e seu leitores. Há muitos anos algumas livrarias – principalmente nos EUA e na Europa – mantêm programas de conversas com escritores, abrindo locais para esses encontros. As turnês de lançamento de livros, também nesses países, sempre incluem a presença dos autores em livrarias, além das entrevistas para os meios de comunicação locais. No Brasil, infelizmente, essa prática das livrarias organizarem encontro de leitores com autores não é tão difundida.

Mas, em compensação, as feiras de livros, nos últimos quinze anos, oferecem cada vez mais essas atividades de palestras de autores e encontro entre leitores e autores. A feira que a CBL organizou em 1999 lançou o “Salão de Ideias”, que ajudei a organizar. No mesmo ano a Bienal do Rio de Janeiro lançou o seu primeiro “Café Literário”. As duas sistematizaram o que até então eram chamados de “eventos paralelos”, enfatizando a presença dos autores. Desde então essas iniciativas se multiplicaram. As grandes bienais do livro de São Paulo e do Rio de Janeiro apresentam, em suas atuais edições, versões dirigidas a públicos específicos, num fenômeno de cissiparidade da iniciativa original.

O aumento do número de feiras e festivais de livros nos últimos anos – este ano a Fundação Biblioteca Nacional já contabilizou mais de cem – vem sempre acompanhado desses encontros entre autores e leitores.

Nos primeiros anos da década de 90, a mesma Biblioteca Nacional – na época presidida por Affonso Romano de Sant’Anna e com Márcio Souza como diretor do então Departamento Nacional do Livro – organizou um circuito de presença de escritores em bibliotecas públicas de vários Estados, iniciativa que, infelizmente, teve pouca duração. A atual administração da FBN, presidida por Galeno Amorim, está preparando o lançamento de iniciativa semelhante. No Rio Grande do Sul, uma das atribuições do instituto Estadual do Livro é a de organizar viagens de escritores (gaúchos, é claro, tchê, que o patriotismo local exige) pelos municípios do Estado. Como as demais iniciativas, sofre com surtos de intermitência, mas certamente é um dos fatores de impulso para a indústria editorial gaúcha.

Algumas administrações de sistemas de bibliotecas já tomaram essa iniciativa, ainda que esporadicamente. A Secretaria Municipal de Cultura de S. Paulo teve, de modo intermitente mas por muitos anos, um programa desse tipo, com a presença de escritores nas bibliotecas. Na administração Martha Suplicy, o então diretor da Biblioteca Mário de Andrade, José Castilho Marques Neto, tentou desenvolver um programa de maior alcance dentro da principal biblioteca do Estado, com a criação da “Escola São Paulo”, que promoveu atividades com a presença de escritores.

Uma das iniciativas mais recentes, e que já tem alguns anos de continuidade, vem sendo feita pela Secretaria de Estado da Cultura de S. Paulo, com o programa “Viagem Literária”, que leva autores a bibliotecas públicas dos municípios paulistas. O programa existe desde 2008 e este ano levará autores a setenta cidades.

Procuro acompanhar esse tipo de atividade nas feiras que frequento, e conversar com autores que participam dessas diferentes iniciativas, e daí tiro algumas observações:

- A importância da divulgação. Mesmo que uma feira de livros tenha divulgação própria, essa não levará necessariamente a uma grande presença nos encontros com autores, se não for feito um esforço específico para isso. Os autores mais conhecidos certamente alcançam audiências mais amplas. Uma divulgação bem feita, entretanto, assegura presença de público mesmo para os autores menos conhecidos.

- Divulgação e adequação do público. Quando se fala de divulgação bem feita, um elemento essencial é a adequação ao público junto à qual é feita. E equívocos são praticados constantemente nesse aspecto, como levar alunos de escola fundamental para assistir palestra e interagir com autor de romances para adultos, ou autor de ensaios. A divulgação correta deve buscar o público alvo mais específico possível para o autor, e se ampliar a partir daí. Os autores não se importam em conversar com um número reduzido de leitores, desde que esses demonstrem interesse no que ele escreve, seja por um título específico ou por um gênero. O pior que pode acontecer é arrebanhar uma ou mais classes de colégios para “fazer número” na conversa com autores, sejam essas promovidas pelas editoras, ou nas feiras, viagens de autores e atividades do gênero.

As leituras e encontros entre autores e leitores serão experiências agradáveis e proveitosas para todos se forem criadas as condições para uma boa interação: um público adequado, em idade e interesse, à obra ou o tipo de obra produzido pelo escritor presente.

Felipe Lindoso é jornalista, tradutor, editor e consultor de políticas públicas para o livro e leitura. Foi sócio da Editora Marco Zero, diretor da Câmara Brasileira do Livro e consultor do CERLALC – Centro Regional para o Livro na América Latina e Caribe, órgão da UNESCO. Publicou, em 2004, O Brasil pode ser um país de leitores? Política para a cultura, política para o livro, pela Summus Editorial. Mantêm o blog www.oxisdoproblema.com.br. Em sua coluna, Lindoso traz reflexões sobre as peculiaridades e dificuldades da vida editorial nesse nosso país de dimensões continentais, sem bibliotecas e com uma rede de livrarias muito precária. Sob uma visão sociológica, ele analisa, entre outras coisas, as razões que impedem belos e substanciosos livros de chegarem às mãos dos leitores brasileiros na quantidade e preço que merecem.

** Os textos trazidos nessa coluna não refletem, necessariamente, a opinião do PublishNews.

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