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O atendimento e o futuro das livrarias
PublishNews, 30/08/2011
O atendimento e o futuro das livrarias

O desenvolvimento da Internet e dos livros eletrônicos há muito me faz pensar sobre o futuro das livrarias. Mais que o “futuro do livro”, o que vai acontecer com esses lugares que frequentamos para folhear livros, ver as novidades e – eventualmente – comprá-los, é o que me preocupa.

Há uns dois anos a ABA – American Booksellers Association – encomendou a uma consultoria um estudo sobre as alternativas para as livrarias independentes enfrentarem esse fenômeno. E a mesma ABA há vários anos havia desenvolvido o BookSense, um sistema de compras on-line que transferia a compra e o atendimento para a livraria que estivesse mais próxima do Zipcode (CEP) de quem fizesse o pedido. O BookSense deu fôlego para as livrarias independentes, mas o crescimento da Amazon e da Barnes & Noble sombreiam permanentemente o futuro das independentes.

O trabalho dos consultores da ABA salientava alguns pontos: serviço; disponibilidade para atender aos pedidos de e-books, e fortalecimento das “redes comunitárias” ao redor das livrarias. Ou, em outras palavras: servir bem e paparicar os clientes habituais da vizinhança. O caso é que esse padrão de comportamento deveria servir para todas as livrarias, tanto as independentes quanto as lojas das cadeias.

No caso dos e-books, a tendência por enquanto predominante é que as editoras continuem vendendo-os através das livrarias, e não em seus próprios sites. Na verdade, a venda de e-books vai cada vez mais se configurando como uma tarefa especializada... tal como vender livros em papel. E as editoras preferem a capilaridade, que perderiam caso vendessem diretamente esses produtos.

Habitualmente compro livros pela Internet, e quando se trata de algum projeto especial que implica em quantidades, recorro a distribuidoras. Mas nas últimas duas semanas, em função do projeto que desenvolvi para o SESC Bom Retiro (exposição sobre as comunidades que habitaram ou habitam o bairro), tive que percorrer várias livrarias à procura de alguns títulos.

Eram todas livrarias da região central de S. Paulo, todas bem estruturadas, com grandes seleções de títulos. Ruim mesmo só a FNAC, cuja seleção e variedade estão muito fracas, e que tem péssimos prazos de entrega de encomendas. Afinal, quem vende aquele mix de produtos prefere dar atenção para a venda de computadores e aparelhos de som, que geram um tíquete alto, em vez de cuidar dos livros... tão baratos.

Mas não vou falar das que tiveram atendimento bom, dentro do padrão do varejo moderno. Quero falar da que, há muito tempo, considero ter o melhor atendimento ao cliente de São Paulo, a Livraria Cultura.

O site da Cultura não oferece descontos espetaculares, nem para os best-sellers (mas oferece, é claro). No entanto tem o melhor serviço de todos os sites, com a maior variedade de títulos para entrega “foguete” – no mesmo dia – que qualquer dos outros pontos de comércio eletrônico.

Mas onde a Cultura se destaca mesmo é no atendimento local ao cliente. Como fui várias vezes lá, observei vários vendedores(as) em ação. Todos com atenção e presteza, embora às vezes atendendo a várias pessoas simultaneamente.

Uma das vendedoras chamou minha atenção por um detalhe: como, durante o atendimento, conseguia indicar (não “empurrar”) outros títulos para o cliente, com base na demanda inicial que era feita. Aquilo deixava transparecer um conhecimento bastante razoável da seção em que ela trabalhava (literatura) e um empenho de serviço que, embora distinto das outras vendedoras, traduzia também um padrão de serviço comum e que há anos o Pedro Herz e sua equipe desenvolvem.

Carla Tideman trabalha na Cultura há seis anos e meio. Formada em Letras, trabalhou antes na área comercial da Folha de S. Paulo, e conversei um pouco com ela sobre sua experiência.

Os funcionários recém-contratados passam por um processo de treinamento relativamente longo, pois precisam aprender os detalhes do sistema informatizado da livraria e os padrões de atendimento da loja. E é importante saber como localizar livros também em outras seções.

Depois, o comum a todos: “Todas as semanas temos uma reunião da equipe para revisar as notícias que saem nos jornais no fim de semana, quem é citado, quem é elogiado, coisas assim. E, de fato, muitas pessoas já chegam com listas tiradas das resenhas publicadas em jornais e revistas”. A Livraria Cultura também recebe, eventualmente, autores ou pessoas da equipe de vendas das editoras que fazem palestras sobre os lançamentos especiais. “Recentemente, Fernando Morais esteve apresentando o novo livro Os últimos soldados da guerra fria e veio também uma equipe da Summus apresentar alguns livros”, disse Carla.

Até aqui, o dedo da formação da equipe de vendedores do Pedro.

“Mas eu vou, sempre que possível, a todos os eventos organizados pelas editoras, como cafés da manhã, para conhecer os autores e me informar melhor sobre os livros. Alguns colegas também vão, mas, sempre que posso, não falto”, acrescentou.

Carla disse que lê muito, e é com base nessas leituras que, eventualmente, dá suas opiniões aos clientes. “Não podemos falar mal de nenhum livro” – diz ela. “Mas uma coisa é informar objetivamente que tal livro está sendo bem vendido, foi elogiado pelos jornais e coisas assim. Outra coisa é quando eu li e gostei de um livro. Aí eu posso falar à vontade dele, e indico para os clientes que demonstram interesse pelo gênero”.

“Tem gente que toda semana vem me perguntar por indicações. Como eu já conheço o gosto dessas pessoas, vou dando sugestões”, informa.

Pessoas como a Carla Tideman e seus colegas de equipe é que são o futuro das livrarias. Nesse meu tempo de vida no mercado editorial conheci vários livreiros e livreiras como a Carla. Vários assumiram cargos de gerência, passaram a trabalhar na área comercial de editoras e estão muito bem por aí.

Infelizmente conheci também alguns cujo conhecimento se transformou em arrogância quando assumiram postos na definição da compra de títulos para as redes onde trabalhavam. Um deles acabou dono de livraria, mas aí já tinha perdido a mão. De tanto destratar pequenas editoras, não percebeu que os livros por elas publicados são, muitas vezes, o sal que dá gosto ao mercado editorial, que não vive só dos best-sellers.

Felipe Lindoso é jornalista, tradutor, editor e consultor de políticas públicas para o livro e leitura. Foi sócio da Editora Marco Zero, diretor da Câmara Brasileira do Livro e consultor do CERLALC – Centro Regional para o Livro na América Latina e Caribe, órgão da UNESCO. Publicou, em 2004, O Brasil pode ser um país de leitores? Política para a cultura, política para o livro, pela Summus Editorial. Mantêm o blog www.oxisdoproblema.com.br. Em sua coluna, Lindoso traz reflexões sobre as peculiaridades e dificuldades da vida editorial nesse nosso país de dimensões continentais, sem bibliotecas e com uma rede de livrarias muito precária. Sob uma visão sociológica, ele analisa, entre outras coisas, as razões que impedem belos e substanciosos livros de chegarem às mãos dos leitores brasileiros na quantidade e preço que merecem.

** Os textos trazidos nessa coluna não refletem, necessariamente, a opinião do PublishNews.

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