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Conhecer, Como Funciona e as enciclopédias em fascículos dos anos 70
PublishNews, 16/07/2010
Ter enciclopédias em casa era sinal de valorização do conhecimento para as famílias

Uma das recordações mais fortes associada a livros que tenho dos meus anos de ginásio e colégio, na década de 1970, é a de colecionar fascículos de enciclopédias vendidos em bancas de jornal. Não creio que seja algo que cause estranheza aos que frequentam bancas hoje: há muitas coleções de DVDs, documentários e ficção, CDs de música e miniaturas – todos acompanhados de pequenos fascículos, além coleções de clássicos da literatura.

Os fascículos começaram a ser lançados nos anos 1960 e entre os primeiros estavam a Bíblia mais bela do mundo (ilustrada) e uma coleção de receitas culinárias. Houve semanas em que venderam um milhão de exemplares. A maioria era da Editora Abril (pena que o site da Abril seja tão lacônico ao contar esta história), mas outras editoras também se aventuraram. Havia de tudo: de história a jardinagem, de ciência a trabalhos manuais, de psicologia a música (com long-plays), de mitologia a comportamento, atraindo todos os interesses e faixas etárias.

Os fascículos eram muito bonitos e com capas super produzidas. A cada tanto se comprava a capa dura que era entregue ao jornaleiro para o volume ser encadernado. Ao final da coleção, as terceiras e quartas capas compunham um livro único com metade do formato do fascículo.

Eu colecionava no máximo duas enciclopédias por vez. Não foram muitas, porque uma coleção podia levar mais de dois anos: Nosso Século, Grandes Personagens da História do Brasil, Geo, Como Funciona, Enciclopédia do Mar (todas da Abril), Atlas do Brasil (Editora ABZ), Brasil - História, Costumes e Lendas (Editora Três) e Enciclopédia do Estudante. Conhecer eu já ganhei inteira, em 1977, em 12 volumes (mais três de dicionário enciclopédico) na versão de capa vermelha (de brinde veio Grandes Personagens da História Universal em uma belíssima encadernação branca). Meu irmão mais velho colecionou Medicina e Saúde; lembro-me vivamente da capa verde e das ilustrações coloridas do corpo humano super bem feitas. História do Século 20 eu comprei pronta já no início dos anos 1980.

Acho, sem nenhum saudosismo, que a informação destas enciclopédias é de excelente qualidade e continua válida, com a limitação cronológica de sua edição (o que vale para qualquer livro e página na internet, claro). As páginas de Conhecer são de uma beleza gráfica em suas ilustrações e design difícil de igualar. Como Funciona – da campainha ao foguete... – é sensacional e continua a me fascinar tanto quanto na época em que colecionei. Ter enciclopédias em casa era sinal de valorização do conhecimento para as famílias, que, quando podiam, compravam a Barsa, a Mirador, a Delta e outras, fontes únicas de pesquisa para qualquer matéria da escola.

Mas há também os fascículos que eu não colecionei e duas histórias me “doem” até hoje... Uma é Gênios da Pintura, da qual tenho dois ou três fascículos avulsos; as reproduções de quadros eram deslumbrantes. A outra é a Enciclopédia do Crime, que eu não tive coragem de colecionar. Tinha uns 12 anos, comprei os três primeiros fascículos, achei interessante, mas não fui em frente. As terceiras e quartas capas formavam um volume sobre técnicas de perícia e investigação do FBI... Um colega meu da escola colecionou até o final, ele era grande e forte e talvez por isso eu achasse que ele podia encarar aquelas histórias de crimes, investigações e agências policiais célebres. Os três fascículos que ainda guardo da Enciclopédia do Crime são como troféus de um pequeno fracasso pessoal.

No ginásio, outro amigo colecionou Grandes Cientistas, lançado pela Funbec e Abril, que continha um fascículo e uma caixa super bem bolada com um kit de experiência. Passamos incontáveis tardes fazendo as experiências. Era a época também de jogos/brinquedos como (nomes aproximados) “O Engenheiro Químico”, “O Engenheiro Elétrico” e muitos de montar, como “Montebras”.

Confesso que continuo com vontade de colecionar. Comprei dezenas de pacotinhos de figurinhas da Copa do Mundo para um álbum “coletivo”. E me detenho na banca que freqüento, na Praça da República, olhando as coleções. Minha preferida, que não colecionei (quer dizer, não para mim...), foi uma de cavaleiros medievais...

As enciclopédias nasceram no século 18 e continuam plenamente ativas no século 21 com a internet (há centenas de enciclopédias temáticas na rede). Mas é claro que consultar um índice, entender a árvore e a hierarquia de assuntos, as remissões e assim por diante são (ou eram) operações que nos ensinavam a entender o conhecimento e sua lógica de organização. E a qualidade das ilustrações ainda não foi superada na internet. Fico em dúvida, neste sentido, se a internet valorizou ou desvalorizou o conhecimento.

Passada minha fase colecionista de fascículos, ganhei do meu irmão mais velho uma Britannica, um primor de qualidade de pesquisa, texto, edição e arquitetura de organização do conhecimento. Mas minhas preferidas e estimadas – Conhecer, Como Funciona, História do Século 20 e Nosso Século (títulos precisos e sintéticos) – continuam em lugar central entre os meus livros. Eu as consulto e gosto da sua presença física e companhia. São dos poucos livros dos quais jamais me desfaria, junto – entre outros – com minha coleção de “manuais” da Disney, sobre a qual prometo escrever em breve...

Roney Cytrynowicz é historiador e escritor, autor de A duna do tesouro (Companhia das Letrinhas), Quando vovó perdeu a memória (Edições SM) e Guerra sem guerra: a mobilização e o cotidiano em São Paulo durante a Segunda Guerra Mundial (Edusp). É diretor da Editora Narrativa Um - Projetos e Pesquisas de História e editor de uma coleção de guias de passeios a pé pela cidade de São Paulo, entre eles Dez roteiros históricos a pé em São Paulo e Dez roteiros a pé com crianças pela história de São Paulo.

Sua coluna conta histórias em torno de livros, leituras, bibliotecas, editoras, gráficas e livrarias e narra episódios sobre como autores e leitores se relacionam com o mundo dos livros.

** Os textos trazidos nessa coluna não refletem, necessariamente, a opinião do PublishNews.

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