
Além de oferecer um panorama do acelerado padrão de desenvolvimento das ferramentas e tecnologias de IA, Benchimol fez um diagnóstico preciso, a partir de um relatório recente produzido pelo Cerlalc: ainda não há um investimento significativo das empresas do setor editorial na formação dos seus colaboradores em IA – aspecto fundamental para que a indústria do livro possa se atualizar e se utilizar do potencial tecnológico.
“A IA é mais do que uma ferramenta, é uma tecnologia que muda tudo”, disse o consultor. “Foram cerca de 500 bilhões de dólares investidos nos EUA, na Europa os recursos também se acumulam. Da China não há cifras oficiais, mas sabemos que é um investimento de magnitude similar. Trata-se do maior investimento da história da humanidade. E ele se destina à infraestrutura, ou seja, a atender todas as nossas demandas. Já existem tecnologias avançadas que não podem ser disponibilizadas porque ainda não há infraestrutura para que as pessoas possam utilizá-las. Resumindo, será redefinido o que nos torna humanos. Mesmo que publiquemos livros físicos, o que provavelmente vai persistir, tudo ao nosso redor mudará”, afirmou.
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Para medir o impacto econômico no mundo do livro, Benchimol listou ainda alguns problemas que precisam ser vencidos para serem transformados em oportunidades. Um deles é o viés dos modelos das ferramentas, que ainda reproduzem um olhar cego sobre o mundo, a partir da reprodução estatística de informações. “A IA conhece diversos olhares, e depende de como ela seja utilizada podemos chegar a visões diferentes. Mas sem uma utilização com postura crítica, ela reproduz essa visão chapada”, explicou.
Outro problema é o que ele chamou de “alinhamento”: os modelo estão regulados para não responder sobre certos temas (desenvolvimento de novas drogas e armas, por exemplo); mas trata-se de uma linha muito fina (ética, moral, de valores). “Isso para o mercado editorial é um problema”, garantiu. Além das conhecidas alucinações, que são respostas verossímeis porém falsas. “O que ocorre cada vez menos”, disse.
O consultor ainda mencionou dois caminhos para editoras trabalharem conteúdos de forma segura: com o uso da tecnologia open-source (ou seja, a possibilidade de usar ferramentas de IA em um próprio computador, sem conexão com a internet); ou assinando planos das empresas mais conhecidas para que os conteúdos sejam privados e protegidos.
Oportunidades
Outra mesa do dia reuniu editores de três grandes casas – Planeta, HarperCollins e Mundo Cristão – para falar sobre como os dados das diferentes pesquisas relacionadas ao mercado podem influenciar decisões sobre o que publicar. Questões relacionadas a gênero – a proporção de mulheres é maior entre leitores do que entre a população em geral – e faixa etária (público jovem) foram os destaques da discussão: as editoras acabam produzindo títulos voltados a esses públicos, em diferentes gêneros textuais, e que acabam gerando resultados positivos de vendas.
“O público feminino é o público alvo também no segmento religioso”, explicou Renato Fleischner, diretor de operações da Mundo Cristão. “Recentemente eu estava em Belém, e estive em eventos praticamente voltados só para mulheres. Quem tem uma prática religiosa sabe, a maioria nas igrejas evangélicas é mulher. Boa parte da nossa linha editorial é voltada para esse público”, disse. Ele também citou um case recente de sucesso que tem a ver com o recorte de gênero, mas também de faixa etária. “Em 2023, recebemos a proposta de um livro para adolescentes, gostamos, e publicamos. De lá para cá, tanto a Mundo Cristão como outras editoras, passaram a aproveitar boas oportunidades com a ficção cristã. Foi uma resposta surpreendente em termos de variedade e de vendas em si, com volume muito alto. Passou a ser significativo dentro do mix da editora”, comentou.
Diversidade e experiências
A mesa final do dia reuniu profissionais para pensar em como fazer com que as empresas tenham profissionais cada vez mais inovadores, abertos e diversos. A mesa passou por questões como sobre mulheres precisam tomar decisões relacionadas às suas trajetórias profissionais que muitas vezes não se impõem a profissionais homens, bem como sobre estratégias de diversidade.
“Eu sei que nem sempre a pessoa está numa posição de poder para, por exemplo, colocar mais mulheres na equipe”, comentou a jornalista e vencedora do Prêmio Jovens Talentos 2025, Tatiany Leite. “Mas existe uma coisa tão básica desde o início: ouça as mulheres que estão nas equipes. Escutem. Cansei de estar em situações em que eu era a única mulher, os homens diziam que apoiavam, mas quando eu falava, ninguém me escutava. Isso pode ser mudado de uma maneira simples”.
Sevani Matos, diretora-geral da VR Editora, reforçou a importância de valorizar as equipes dentro das editoras. “Nosso mercado não é das ciências exatas, mas também é preciso ter uma visão clara para onde vai o seu catálogo, o que quer publicar, e tomar decisões. Algumas delas, que admiro nos editores, são tomadas a partir de um feeling. Mas mais do que isso, algo transformador é simplesmente apostar na sua própria equipe”.
A gerente comercial do Grupo Editorial Aleph, Ellen Costa, compartilhou que foi mãe antes de ser profissional do mercado. “Foi muito difícil tomar essa decisão, e muitas vezes as pessoas acham que não é possível, que não é uma opção. De tudo que vivi, foi a minha melhor decisão: ser as duas coisas”, contou.
Entidades
No início do dia, um painel reuniu representantes das principais entidades do setor para atualizar o estado atual das suas atuações. O presidente da Associação Brasileira de Livros e Conteúdos Educacionais (Abrelivros), Ângelo Xavier, falou sobre a situação do PNLD – com a revisão do Ensino Médio promovida pelo governo federal, houve atrasos na compra do Programa. Depois de uma pressão na imprensa, o governo prometeu garantir todos os recursos necessários.
Já Marcus Teles, diretor da Livraria Leitura e representando a Associação Nacional de Livrarias (ANL), repassou o trajeto da Lei Cortez no Senado – após aprovação em comissões, o projeto aguarda agora votação no Plenário. “Estamos confiantes de que, se pautar, passa. Mesmo assim, várias editoras importantes já resolveram ajudar, fazendo uma certa pressão em vendedores que colocam descontos altos nos primeiros meses de lançamento dos livros. O que queremos é mais concorrência, não menos”, afirmou.
Lizandra Magon, presidente da Liga Brasileira de Editoras (Libre) e membro do comitê do Plano Nacional do Livro e Leitura (PNLL), avaliou que a diretriz nacional proposta pelo Plano vai conseguir fazer a sociedade se mobilizar mais para os assuntos do livro. “Os temas particulares são de difícil compreensão para o público amplo. Com o Plano aprovado, agora passamos à discussão das regulamentações”.
O Encontro continua nesta quinta-feira (21) e sexta-feira (23). Veja a programação dos próximos dias:
21 de agosto
Sala Imperial
9h - Entrevista com Andy Hunter, Fundador e CEO da Bookshop.org, com mediação da jornalista Raquel Cozer.
10h10 – “Ferramentas de Inteligência Artificial no Marketing do Livro”, com Daniel Benchimol, Diretor da Proyecto451.
Sala Skeelo
10h10 – “Como escolher um livro: bastidores das aquisições e tendências no mercado editorial”, com a participação de Florência Ferrari, Diretora Editorial da Ubu Editora; Yasmin Santos, Editora de aquisição da Companhia das Letras; Tamires Von Atzingen, Gerente executiva editorial na VR Editora; e Rosely Boschini, CEO da Editora Gente. A mediação será de Rodrigo Casarin, editor da Página Cinco no UOL.
Sala Imperial
11h50 – “Tendências do Marketing: Branding, Influência e o Poder do H2H”. O debate será com Cristiano Britto, da ESPM; Luciana Fracchetta, Gerente de Marketing de Conteúdo na Companhia das Letras; e Bruno Zolotar, Diretor Comercial e de Marketing na Editora Rocco. A mediação será de Daniel Lameira, Fundador da Seiva e do curso Vida do Livro.
Sala Skeelo
11h50 – “Do Original à Publicação: Como Encontrar e Contratar Autores Nacionais”, com Diana Passy, Curadora da Arena Cultural na Bienal Internacional do Livro de SP.
Sala Skeelo
14h10 – “Curadoria nas livrarias: os desafios da escolha de um acervo”, com Maria Carol Borin, Consultora para Livrarias e Pesquisadora sobre Políticas do Livro no Brasil.
15h10 – Coffee break
Sala Imperial
15h40 – “Ideias que Saíram da Gaveta: Iniciativas que Transformaram Catálogos, Leitores e Resultados”. A mesa terá Mônica Carvalho, proprietária da Livraria da Tarde; Ramir Severiano, Fundador e CEO da Vitrola; Cecilia Arbolave, Sócia da Lote 42, da Banca Tatuí e da Sala Tatuí; Wellington da Silva, fundador e CEO da Gráfica Viena. A mediação será de André Luís Silvestre Cafu - Gerente Nacional de Vendas da Global Editora.
Sala Skeelo
16h50 – “Cultura Organizacional na Prática: Como Alinhar Valores, Comportamentos e Resultados”, com Daniela Ono, Head Gente & Cultura.
Sala Imperial
17h50 – Grupos de Discussão
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22 de agosto
Sala Imperial
9h – “Editando o Futuro: Selos, Estratégias e Novos Públicos”, com Rafaella Machado,
Editora Executiva na Galera Record e Verus Editora, e mediação de Maria Fernanda Rodrigues, Editora de Cultura e Colunista do jornal O Estado de S. Paulo.
10h10 – “Decodificando os dados: o que os números dizem e o que podemos fazer com eles”, com Nelson Naspitz, Diretor de Operações na Editora Sextante e Daniel Rodrigues, Sócio-Diretor na Livraria Leitura. A mediação da mesa será de Mariana Brandão, Executiva de vendas do Grupo Ediouro Publicações.
Sala Skeelo
10h10 – “Editando com Responsabilidade: ESG no Mundo dos Livros, com Marcus Nakagawa”, fundador e presidente da Abraps, e Thereza Castro, Gerente de Marketing na Citadel Grupo Editorial. A mediação será de Luciano Monteiro, VP de Comunicação e Sustentabilidade da CBL.
Sala Imperial
11h20 – “Novos leitores: Incentivando a Leitura com eBooks, Audiobooks e Bibliotecas Digitais”, com Antônio Hermida, Gerente de produtos digitais na Companhia das Letras; Adriana Alcantara, Country Manager na Audible Brazil; e Isadora Cal, Líder Global de Channel Operations na Bookwire. A mesa terá mediação do jornalista Leonardo Neto.
Sala Skeelo
11h20 – “Inteligência Artificial: aspectos legais e licenciamento”, com Maria Luiza de Freitas Valle Egea, Advogada e sócia em Freitas Valle Egea Advogados Associados.
Sala Imperial
12h30 - Gravação Podcast com o melhor do encontro
13h30 - Almoço