Em Tembetá (Confraria do Vento), Clóvis Wey nos convida a colocar o ouvido no concreto e escutar o que ainda pulsa sob as fundações da cidade que chamamos São Paulo. Eu, que moro nesta cidade há apenas dez anos, tive uma aula histórica sobre a fundação da cidade. O romance alterna tempos, mas não perde o fio da memória: do Piratininga indígena ao caos urbano, há um mesmo clamor por pertencimento, por luta, por voz.
Não é só o passado que habita essas páginas. É o tempo circular das cosmologias originárias. São os tambores que insistem, mesmo quando abafados. Wey escreve com precisão histórica, mas é no ritmo do sangue que sua narrativa vibra.
João Ramalho, Tibiriçá, Cunhambebe, o padre José. Homens que se enfrentaram, se aliaram, se traíram. Todos em cena, sob um céu que já foi mais vasto. A vila de São Paulo não é apenas cenário: é personagem viva, e sua fundação, como tudo que nasce da fricção, é feita de conflito, pólvora e resistência.
Como uma arqueologia da palavra, o autor cava camadas de tempo. E ao fazer isso, nos mostra que o passado nunca passou: ele se infiltra nos becos, nos nomes das ruas, no apagamento sistemático dos povos originários. Mas também nos sonhos de um mundo novo, ainda por nascer.
É um livro que não se lê apenas com os olhos, mas com o corpo. Com a pele que se lembra, mesmo quando a cabeça esquece. Clóvis Wey, como um xamã das palavras, evoca fantasmas e futuros. E nos faz pensar que talvez o que nos falta não seja progresso, mas escuta.
Escutar o que grita nos rios soterrados. Escutar o que canta na língua esquecida. Escutar o que ainda vibra no tembetá, esse adorno ancestral que é também símbolo de resistência, de fala, de identidade.
Um romance que não se contenta em contar a história: ele a reencarna.
Livro indicado:
Tembetá, de Clóvis Wey
Editora: Confraria do vento
Vanessa Passos é escritora, roteirista, professora de escrita criativa, doutora em Literatura (UFC) e pós-doutora em Escrita Criativa (PUCRS), sob orientação de Luiz Antonio de Assis Brasil. É idealizadora do Programa 321escreva, do Método Mais Vendidos e do Encontro Nacional de Escritoras. Lidera uma comunidade de escritoras que tem voz em mais de 9 países, orientando centenas de escritoras a escrever, publicar e divulgar seus livros. Autora do volume de contos A mulher mais amada do mundo (2020). Seu romance de estreia A filha primitiva foi vencedor do Prêmio Kindle de Literatura (2021), do Prêmio Jacarandá (2022), do Prêmio Mozart Pereira Soares de Literatura (2023) e vai ser adaptado para o cinema pela Modo Operante Produções, agora publicado pela José Olympio. É colunista do Jornal O POVO e do PublishNews. Nas redes sociais, a escritora pode ser encontrada no perfil: @vanessapassos.voz.
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