Três Perguntas do PN para Morgana Kretzmann, autora de 'Água turva'
PublishNews, Beatriz Sardinha, 24/07/2024
Morgana Kretzmann retrata elementos da história recente do Brasil e a ambição da humanidade; ela foi uma das convidadas da Feira do Livro, em São Paulo

 Morgana Kretzmann foi convidada na programação da Feira do Livro| © Fernando Rabelo
Morgana Kretzmann foi convidada na programação da Feira do Livro| © Fernando Rabelo

A atriz, roteirista e escritora Morgana Kretzmann foi vencedora do Prêmio São Paulo de Literatura em 2021 com seu primeiro romance, Ao pó (Patuá). A autora gaúcha também roteirizou a série Tarã, série nacional prevista para estreia no Disney+ e que será estrelada por Xuxa. Agora, Morgana lança seu segundo romance, a ficção climática Água turva (Companhia das Letras).

O livro se passa no Parque Estadual do Turvo, Rio Grande do Sul, fronteira com a Argentina, onde a guarda-florestal Chaya é a responsável por combater a caça exploratória de animais silvestres no parque. Preta, sua prima, separada da família ainda na infância, é a líder de um temido grupo de caçadores e contrabandistas que vive no lado argentino da fronteira, os Pies Rubros. Olga, assessora parlamentar de um ganancioso deputado, é forçada a voltar à cidade onde cresceu para ser porta-voz da tragédia ambiental que se anuncia – até perceber que está nas mãos dela a chance de mudar o curso da história.

Em julho, a autora participou do seminário d'A Feira do Livro, realizado na Praça Charles Miller, no Pacaembu. Ela esteve presente com Ana Carolina Carvalho e Dianne Melo na mesa Ler na tempestade: por que recorremos à literatura para elaborar tragédias e momentos de incerteza?, que fez parte da programação de seminários Livro, Leitura, Literatura e Bibliotecas.

Morgana Kretzmann respondeu a três perguntas do PN.

PublishNews – Como foi a experiência de participar do seminário na Feira do Livro e qual a relevância do tema tratado, dentro do seu trabalho como autora?

Morgana Kretzmann – Passei dois dias me preparando para as falas. Eu acho que é essencial a gente discutir isso numa praça, numa tenda abertamente com outras pessoas, ouvindo e conversando e se interessando sobre o papel da literatura. Ao falar de situações de crise, como eu falei lá [na mesa do seminário], a gente vive uma crise política, uma crise econômica, uma crise social e inclusive uma crise de afeto, está tudo muito distorcido em relação ao mundo.

Eu acho que a gente conseguiu falar de muitos temas que nos são caros. E também sobre essa nova consciência planetária que a gente precisa ter em relação ao planeta, para não só que o planeta sobreviva.

Como a sua carreira enquanto dramaturga e atriz impacta seu processo de escrita e de estudo de personagem? Como fazer para engajar uma população considerada 'mais velha' e que tem dificuldade de vislumbrar um futuro?

Sempre falo que eu me considero uma contadora de histórias, uma artista. Eu já era uma contadora de histórias quando eu era atriz de teatro ou atriz de cinema. E hoje sou uma contadora de histórias escrevendo romances. Todos os lugares que eu conheci e as pessoas com as quais eu convivi profissionalmente ou não, estão nos meus livros.

Tudo que eu fiz como atriz também está nos livros. As pessoas costumam falar muito dos diálogos do Ao pó, como do Água turva e os diálogos vem muito do trabalho e anos de pesquisa e estudo pra encontro de personagens. Tento sempre estar estudando e buscando melhorar, ainda tenho muito o que aprender. O envelhecer tem o fascínio de encontrar coisas novas e novos caminhos. Estamos sempre buscando algo novo. A busca precisa existir para que a gente se sinta vivo.

Qual a sua relação com o Brasil? E como essa relação está conectada com seu projeto de estudar a literatura e o meio ambiente? De que forma você vê a relação entre catástrofes ambientais reais e a relação dessas com a ficção?

Escrevi esse livro como uma espécie de extensão do meu TCC quando me formei em Gestão Ambiental. Fiz esse curso de gestão ambiental por conta de uma inquietação minha, e uma ansiedade sobre os problemas ambientais do Brasil e do mundo. Durante o processo da faculdade, sempre fui pesquisando uma maneira de fazer com que a arte pudesse falar com as pessoas sobre os crimes ambientais e os nossos recursos finitos.

Acredito na arte como afeto e na literatura como afeto, e a partir de um sentimento de comunhão, ela pode fazer com que as pessoas tenham uma nova consciência e um novo sentimento sobre o meio ambiente. A gente ficou escutando por muito tempo que romances ambientais são "chatos".

Isso é uma chave que deveria ter mudado há muito tempo. E agora com o que acontece no Rio Grande do Sul, a gente percebe que isso é o mais urgente para ser falado, como por exemplo, A extinção das abelhas (Companhia das Letras), da Natália Polesso e o Deus das avencas (Companhia das Letras), do Daniel Galera. São livros que a gente precisa começar a ver nas prateleiras e nas escolas.

[24/07/2024 10:00:00]