
Retomando os avanços obtidos desde 2010, o livro também constrói uma perspectiva crítica – seja no âmbito dessas conquistas majoritariamente obtidas no judiciário, seja em relação aos limites do próprio direito como categoria última de conquista da cidadania. Uma gama de questões ligadas aos direitos de gays, lésbicas, bissexuais, transsexuais e outras identidades sexuais não hegemônicas é tratada nos artigos. Entre elas, está uma que já causou dissensos entre ativistas e estudiosos do tema: a criminalização da homofobia. Para a pesquisadora, transfeminista e escritora Helena Vieira, que assina a orelha da publicação, “o centro da questão é o aspecto punitivista da criminalização, que, num país como o Brasil, marcado pelo racismo e o baixo acesso à justiça, significaria mais perseguição a pretos e pobres”.
Em seu texto de apresentação à coletânea, o diretor do Sesc São Paulo Luiz Deoclecio Massaro Galina afirma que o livro “historiciza os debates sobre gênero e sexualidade, as políticas de direito e o sistema jurídico, sem perder de vista o que mobiliza essas interfaces: as demandas sociais”. Para Galina, os textos reunidos “apontam para o exercício de pensar e fabricar práticas que incorporem as diversas realidades e necessidades dos sujeitos. Afinal, a emancipação só é verdadeira se for coletiva”.
União civil reconhecida pelo STF
Os organizadores abrem o livro lembrando que, em 2011, o Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu a união civil entre pessoas do mesmo sexo, e citam outros marcos jurídicos dos direitos LGBTI+ conquistados ao longo da década de 2010. Eles afirmam que, “depois de tantas conquistas, a sensação é de que, ao menos do ponto de vista formal, não haveria mais pelo que lutar”. Mas alertam que esse “é um imaginário que não se sustenta ao ser confrontado com a realidade social”, e que os direitos LGBTI+, “apesar de formalmente assegurados, ainda são uma ficção para boa parte da população que deveria se beneficiar deles”. Os organizadores lembram ainda que está em tramitação na Câmara dos Deputados um Projeto de Lei que proíbe o casamento homoafetivo, apesar da decisão do STF.
Direitos conquistados desde os anos 1970
A primeira parte da coletânea, intitulada Os direitos civis: prazer, afetividade e conjugalidade, traz texto do organizador Renan Quinalha, que explora, em perspectiva histórica, a construção da gramática dos direitos durante os primeiros passos do movimento LGBTI+, no contexto de abertura democrática, no final da década de 1970. Os outros dois artigos da primeira parte – assinados por Laura Mostaro Pimentel e Luiza Cotta Pimenta; e por Eder van Pelt – abordam os fluxos decisórios e legislativos nos processos de busca por legitimidade das famílias homoafetivas e não monogâmicas, e uma reescrita queer do julgamento que reconheceu a união estável homoafetiva.
A segunda parte do livro, Os direitos sociais: educação, saúde e cultura, trata de temas como a cultura escolar, educação sexual anti-LGBTfóbica e a situação do sistema carcerário.
A terceira parte da obra, Usos e limites do direito penal para o enfrentamento da LGBTI+fobia, traz textos de Emerson Ramos e Paulo Iotti sobre a homotransfobia como crime de racismo; Fernanda Pereira e Thiago Amparo com o texto Além da criminalização: leitura queer sobre legalismo progressista, e Victor Sugamosto Romfeld, autor de A LGBTfobia entre a ausência e o reconhecimento: uma análise empírica a partir dos casos criminais julgados pelo Tribunal de Justiça do Estado do Paraná entre 2010 e 2020.
A quarta parte aborda os direitos das pessoas trans e intersexo, com textos de Antonella Galindo, Alice Hertzog Resadorj, Carla Watanabe, Luana Lemos de Almeida e Sumaia Midlej Pimentel Sá, Dyego de Oliveira Arruda e Caroline Oliveira Santos. Encerrando, Leandro Reinaldo da Cunha e Nicole Gondim Porcaro tratam sobre a inclusão das pessoas trans no processo eleitoral brasileiro.
A parte 5 traz o tema (Re)pensando um direito internacional para a diversidade sexual e de gênero, com textos de Flávia Piovesan e Nathércia Magnani. Gabriel Mantelli, Isabela Soares Bicalho e João Vicente F. Pereira assinam em conjunto Descolonizar/deslocalizar e desbinarizar/desbaratinar o direito internacional.
Na sexta e última parte, Horizontes e desafios para a reconstrução da cidadania LGBTI+ no Brasil, Lucas Bulgarelli e Arthur Fontgaland assinam Entre os desmontes e expectativas de reconstrução: os efeitos da agenda anti-LGBTI+ no Brasil; e Bruna Andrade Irineu discute O ativismo LGBTI+ brasileiro sob as ruínas do neoliberalismo.
SERVIÇO
- Lançamento Direitos LGBTI+ no Brasil: novos rumos da proteção jurídica (Edições Sesc)
- Data: 19 de junho
- Horário: 19h
- Local: Sesc Avenida Paulista (Av. Paulista, 119 – São Paulo / SP)