Sob a perspectiva de uma menina de catorze anos criada pela avó, sexualidade, prostituição, religião e morte se mesclam a uma história familiar complexa e cheia de segredos que a personagem precisa desvendar para crescer. Esse silêncio que a protagonista se vê obrigada a confrontar esconde um passado formado por mulheres afetadas pelo machismo e pela hipocrisia. É na busca por sua origem que Catarina começa a traçar um caminho só seu. “Catarina precisa descobrir a sua história para poder contá-la”, resume Marcela Dantés.
A narrativa se desenvolve pelo decorrer de um ano, na transição dos 14 para os 15 anos, uma fase que Carla considera muito marcante para as mulheres. “Completar 15 anos faz parte do nosso imaginário coletivo do ‘tornar-se mulher’. E Catarina tem uma especial demanda quanto a esta idade, já que foi a idade em que sua mãe engravidou dela. É também uma fase em que se experimenta com muita intensidade as questões ligadas à sexualidade, que são abordadas no livro a partir do relacionamento de Catarina com Gustavo e com sua amiga Teresa”, explica a autora.
Na história, Catarina mora com a avó, que é servente em um condomínio de classe média no interior do Espírito Santo. Enquanto Catarina se aproxima de uma comunidade de prostitutas, onde desenvolve amizade com a sobrinha de uma delas, a avó Amélia se aproxima de uma comunidade evangélica, tornando quase que díspares os caminhos percorridos. “Embora pareça que estão em lados opostos, entendo que as duas buscam a mesma coisa: um senso de comunidade, de pertencimento. E o apoio de outras mulheres”, aponta Carla.
Ágil e envolvente, o fim da infância de Catarina se apresenta para o leitor em uma narração irresistível em primeira pessoa. “Escrevo simples. Tenho uma escrita que pretende ser fluida, direta, contar uma boa história, conversar com o leitor. E isso em todos gêneros, em todos os livros que publiquei até agora. Também gosto de criar imagens e de dizer algumas coisas sem dizer, deixar possibilidades de interpretação diversas nos gestos e intenções dos personagens”, comenta a autora que confia na capacidade de quem lê de criar junto com quem escreve. É nesse contexto que a aproximação com a história de outras mulheres acontece, conforme destaca Dantés, que considera o livro “fascinante”, uma obra que “toca fundo num lugar essencial, íntimo, mas também universal”. “Todo mundo tem mãe, e a história dessas mulheres que são tantas outras, que poderia ser eu, que talvez seja você, é bonita mesmo em sua imperfeição, na luta por se descobrir, na luta por continuar”, frisa.