Um autor cindido em sua condição de dominado
PublishNews, Redação, 22/03/2024
Obra da crítica literária francesa Pascale Casanova revela um Kafka inconformado com todas as formas de dominação

Kafka indignado (Edusp, 448 pp, R$ 68 – Trad.: Iraci D. Poleti e Regina Salgado Campos), de Pascale Casanova, revela a imagem de um escritor combativo, indo além da análise de suas posições políticas, de seu lugar no mundo social, de sua relação com a identidade judaica ou de sua relação com o pai. Fundamentada em rico material documental (textos de ficção, diários íntimos, correspondência), a autora nos apresenta um autor cindido em sua condição de dominado entre o espaço literário antigo e poderoso da cultura alemã e os espaços recentes e desprovidos de força simbólica da literatura tcheca e judaica, unidos em torno de uma definição política de sua especificidade. Como se lê na quarta capa do volume, Pascale Casanova revela um autor “impregnado pela ira contra todas as formas de dominação – o que dá sentido à sua obra, revestida por um élan difuso de cólera, raiva e indignação”. Na introdução de Kafka Indignado, Pascale escreve: “Quis me distanciar, na teoria e na prática, da ilusão que consiste em acreditar que se terá acesso à vida secreta e íntima de Kafka buscando-a em seu diário ou em sua correspondência. Os escritos ‘íntimos’ são engodos que só revelam uma superfície enganosa. Kafka não confidencia neles nenhuma ‘verdade’, em todo caso nenhuma ‘profundeza’ que daria acesso às ficções, nenhuma chave permitindo entrar no segredo da obra. A obra não é uma coisa secreta: é a marca das únicas formas de tomadas de posição sobre todos os assuntos que lhe eram caros. Em outras palavras, nos textos de ficção é que se deve buscar a resposta às questões que nos colocamos sobre as reais convicções de Kafka”.

[22/03/2024 07:00:00]