Flipei se consolida como um dos principais espaços da programação paralela da Flip em 2023
PublishNews, Guilherme Sobota, 22/11/2023
Evento organizado pela Autonomia Literária traz neste ano nomes como o DJ KL Jay e o rapper Don L, para apresentações de música, e a filósofa italiana Silvia Federici

Flipei completa cinco anos de existência em 2023 | © fotosincriveis.com.br
Flipei completa cinco anos de existência em 2023 | © fotosincriveis.com.br
A história é conhecida. Julho de 2019. De um lado da foz do Rio Perequê-Açu, na Praia do Pontal em Paraty, Glenn Greenwald era levado numa pequena embarcação em direção ao barco da Flipei, que servia de palco e sediava uma audiência de milhares de pessoas que o aguardavam para ouvi-lo sobre a "Vaza Jato". Na outra margem, um grupo de siderados trajados com a camisa da seleção brasileira disparava rojões em direção ao barco, tocava músicas em volume alto, a ponto de prejudicar o debate, e o Brasil atravessava a mais grave crise política desde a redemocratização.

Tudo isso rolou no contexto da Festa Literária Pirata das Editoras Independentes (Flipei), que completa cinco anos em 2023 e se consolida como um dos espaços centrais do contexto da Flip, em Paraty. Neste ano, a Flipei chega a seu maior tamanho, com diversas mesas e discussões – nomes que vão da filósofa italiana Silvia Federici (autora de Calibã e a bruxa, publicado aqui pela Elefante) ao pesquisador Sidarta Ribeiro – e que tem na festa e na música elementos essenciais, com a presença neste ano dos músicos KL Jay, o DJ do Racionais, e Don L, um dos principais rappers dessa geração. A Flipei 2023 tem programação de quarta a domingo (22 a 26/11 – veja abaixo), na Praia do Pontal.

O movimento de trazer grandes nomes da música popular contemporânea para apresentações abertas é novidade na programação paralela da Flip – que neste ano também conta, em outros espaços, com uma robusta mostra de cinema brasileiro no Cinema da Praça e apresentações de teatro, além dos mais tradicionais debates e performances de slam.

A Flipei é organizada pela editora Autonomia Literária e pela a Rizoma Livros (ônibus livraria nômade), com apoio de mais de 100 editoras independentes, segundo a produção.

“A Flipei se tornou a maior casa parceira da Flip nos últimos anos por causa da programação e do seu modelo ‘catraca livre’, democrático e participativo nos debates e nas parcerias com diversas editoras independentes e movimentos sociais”, afirmam os membros da organização Cauê Seigner Ameni, Wander Wilson, Baby Grace, Rafael Limongelli e o editor da elefante, Tadeu Breda – eles responderam, em conjunto, algumas perguntas do PublishNews. “Assim como a Flipei, a Autonomia Literária é uma iniciativa coletiva, independente e radical. Por isso, a relação é de parceria e colaboração, mas às vezes um pouco conflitiva. Entendemos que a Flip organiza a maior festa literária do mercado editorial no país, e as editoras independentes, como a Autonomia Literária, fazem parte desse mercado e têm o direito de participar. As editoras independentes são o setor mais pujante do mercado e a democratização da Flip, que aconteceu recentemente após a profunda crise que abateu o mercado editorial, foi uma lufada para reoxigenar e salvar o evento. Eles têm a chance agora de aprofundar as parcerias com as editoras e casas parceiras ou vê-las como concorrentes – o que é ruim para o evento e o público. As casas parceiras estão investindo no evento porque fazem parte desse mercado e estão o ano inteiro fazendo eventos, lançamentos, debates e etc”.

O mote desta edição da Flipei é justamente a homenagem a Pagu, que também movimenta a programação principal do evento. “A homenageada da Flip, Patrícia Galvão, conhecida como Pagu, viveu confrontando as normas de seu tempo, seja nas opressões de gênero, seja no autoritarismo da União Soviética”, afirma o coletivo. “Rompeu com o Partido Comunista Brasileiro de seu tempo, sem deixar de ser comunista e anticapitalista. São estas as questões que atravessam toda programação, nosso jornal, e o livro Pagu na vanguarda socialista: os escritos mais incendiários de Patrícia Galvão, nossa publicação que será lançada durante a Flipei deste ano, trazendo textos de jornal até então inéditos no Brasil”.

Além da venda de livros e de bebidas, com um bar parceiro, a Flipei tem apoio das editoras participantes, fundações e movimentos ativistas, e de financiamento coletivo (no site https://flipei.abraceumacausa.com.br/), cujo resultado tem surpreendido positivamente a produção.

Os organizadores falaram também sobre o crescimento da Flipei ao longo dos últimos cinco anos. “Em cinco anos, a tentativa foi de ampliar a participação popular e pensar formas de fazer uma festa capaz escapar das armadilhas da especulação imobiliária e colonial que atravessa este tipo de festival”, apontam.

“Primeiro, pensamos em ocupar um barco atracado para montar uma livraria, e trazer o público para ocupar a rua em uma programação gratuita. Esse ano seguimos na mesma toada, construindo uma vila pirata que garanta a ampla participação e diversidade nas atividades. De outro lado, também construímos uma rede entre editoras independentes, descentralizando muito da produção para acolher as propostas de quem está diretamente vinculado ao trabalho editorial. A prática sempre foi ampliar a ação dos trabalhadores do livro em relação a mandatários externos”, dizem. “Em cinco anos estendemos as relações com a cidade de Paraty, incorporando as discussões de movimentos sociais da cidade em nossa programação e forma de fazer. Este ano, realizamos uma parceria bem especial com o Fórum de Comunidades Tradicionais. Isso tudo foi construído a partir de uma perspectiva declaradamente socialista, juntando comunistas e anarquistas. Nos parece que há um desejo por repensar as formas de viver neste mundo, enfrentando este cemitério de vivos chamado capitalismo que, no limite, tem nos empurrado para a extinção do planeta com a emergência climática. Bem, estamos em um campo político que desde a sua fundação buscou afirmar outras formas de existir, outras relações com este mundo. Como dizem os zapatistas, lutamos por ‘um mundo onde caibam muitos mundos’.”

A Festa

A primeira festa desta edição da Flipei começa nesta quarta-feira (22), às 22h, com a presença de KL Jay. Don L toca no sábado (25).

Noites da Flipei durante a Flip fazem sucesso na Praia do Pontal | © Flipei
Noites da Flipei durante a Flip fazem sucesso na Praia do Pontal | © Flipei
“São duas pessoas importantes na história das lutas sociais brasileiras, para repensarmos e combatermos a estrutura colonial-escravocrata deste território dominado pelo Estado brasileiro”, comentam os organizadores. “Também criamos articulações locais com esses grandes nomes da música, como no caso do grupo de rap Realidade Negra, do Quilombo do Campinho, que fará uma colaboração com o KL Jay na quarta feira (22/11) e no caso do grupo H2M, que é uma batalha de mulheres MCs de Paraty e a cantora e atriz Blackyva, mulher trans da favela da Rocinha, que irão abrir o show do Don L no sábado (25/11). Se buscamos transformar este mundo, se nos consideramos parte da história do socialismo, é porque pensamos que diante de um mundo austero e violento com os de baixo, lutamos tentando fazer uma vida que valha a pena ser vivida, e isso também se faz com festa”.

Confira a programação completa da Flipei 2023:

  • QUARTA (22/11)

16H Onira: tatiana nascimento & jovem palerosi. part. caco pontes

17H Arte, política e agitprop: da Pagu às lutas de hoje, com Maiara Líbano, Dinelli, Diego S. Dias, Caco Pontes, Baruq e Vitória Lobo.

19H Me contento em ser poesia com Coletivo Rubra e Primeiro Ato Slam

22H REALIDADE NEGRA (QUILOMBO DO CAMPINHO)

23H30 KL JAY

2H30 DJ ZAMBA

  • QUINTA (23/11)

10H Diáspora, exílio e refúgio – entre a memória e a política, com intervenção de Johnny Salaberg e debate com Vitor Graize, Marcelo Maluf, Heloisa Melino, Richemond Dacilien e Paula Carvalho.

12H Slam – da quebrada pro mundão, com Matriarack, Naiá Curumim, Laura Conceição, Brisa de Souza, Natalia Cariri e Mel Duarte.

14H [Show] Bruna Luchessi

15H A extinção da internet, com Vitória Cruz, Julie Ricard, Amauri Gonzo, Pedro Markum e Marcos Morcego.

17H Dez anos das revoltas de 2013, com Antonia Malta Campos, Elisa Quadros, Fábio Palácio e Facção Fictícia.

19H Crise climática e as alternativas do bem-viver, com Maristella Svampa, Helena Taliberti, Daniela Arbex, Vania Guerra e Vitória Lobo.

20H30 – AQUABIENTA

22H – BAZUROS

23H30 – DJ PENSANUVEM

  • SEXTA (24/11)

10H Educação Periférica – escrevivendo experiências antirracistas nas escolas públicas, com Ricardo Henriques, Jailson de Souza e Silva, Edneia Gonçalves e Cléber Ribeiro.

12H Esporte antifascista!, com Micael Zaramella, Vitoria Lobo, Micha, Aira Bomfim e Danilo Pássaro.

14H [Discotecagem comentada] Nathália Grilo

15H Revolução preta – da África à América, com Marcos Queiroz, Luciana Brito, Jones Manoel, Ronaldo dos Santos e Cleber Ribeiro.

17H Descolonização e a luta pela terra – da Palestina à América Latina, com Ana Morel, Breno Altman, Mestre Joelson, Jemina Alves e Ariane Martins.

19H Os fins do gênero, com Rita Von Hunty, Geni Nunes, Natalia Borges, Luisa Amaral, Renan Quinalha e Maíra Moreira

22H – MUNDIÁ CARIMBÓ

00H30 – DJ PAGU feat Babi Grayce

  • SÁBADO (25/11)

10H A importância de Marx para solucionar a crise climática e econômica, com Juliane Furno, Pedro Rossi, Marcello Musto, Gustavo Machado e Vitória Lobo.

12H Abolir a polícia, com Mario Rui, Kric Cruz, Almir Fellite, Júlia Almeida e Jeniffer Mendonça.

14H [Processos editoriais] Ciclo Selvagem

15H Pretitudes e negritudes contra o apagamento histórico-cultural, com Manoel Mutimucuio, Aida Gomes, Mauriceia Pimenta, Deivison Faustino, Jô Freitas e Cleyton Mendes.

17H Outras pagus – ousadas, comunistas e insubmissas, com Giuliana Bergamo, Ediane Maria, Silvana Jeha, Amelinha Teles e Tarianne Bertoza.

19H A guerra contra as mulheres e a resistência feminista, com Silvia Federici, Verónica Gago e Luci Cavallero Mediação Jéssica Balbino ~ Intervenção política com Talíria Petrone ~ Intervenção artistica da Luiza Romão antes da mesa.

22H – H2M

22H40 – BLACKYVA

23H – DON L

00H – DJ CALIXTO LOOP

  • DOMINGO (26/11)

11H O capitalismo está nos adoecendo – saúde mental além da clínica, com Stéphanie Jobst, Sidarta Ribeiro, Maíra Moreira, Ruy Braga e Rodrigo Gonsalves.

13H Memórias para outros futuros possíveis – utópicos e distópicos, com Pedro Cesarino, Ivanildes Kerexu, Mário Medeiros, Hanna Limulja, Rogério de Campos e Vitóra Lobo.

15H Como evitar o golpismo militar na América Latina, com Jamil Chade, Marcos Queiroz, Juliano Medeiros e Mário Rodrigues, Leo Folleto e Vitória Lobo.

18H – SAMBA DAS TRABALHADORAS

19H – DJ ORKIDIA

Tags: Flip, Flipei, Pagu
[22/11/2023 10:40:00]