O que o Piglet pode ensinar sobre livros de receitas
PublishNews, 10/02/2012
Um concurso diferente

Já é a terceira vez que o portal Food52, uma comunidade dedicada à troca de receitas e experiências culinárias, promove um divertido concurso batizado de Piglet (Leitão). Em busca do melhor livro de cozinha publicado nos Estados Unidos no ano anterior, quinze jurados (ou duplas de jurados) lêem, preparam algumas receitas e decidem, cada um, entre dois títulos previamente selecionados pelo site. Os melhores, entre os dezesseis concorrentes, vão avançando até chegar à final – funciona exatamente como a Copa de Literatura Brasileira, que se propõe a avaliar romances nacionais.

Tem sempre gente de peso envolvida – no júri de 2012 havia escritores e chefs televisivos (Nigella Lawson, Ina Garten), jornalistas (Hunter Lewis, da revista Bon Appétit) e donos de restaurantes festejados (Anita Lo, do Annisa, Alice Waters, do Chez Panisse) – e o vencedor é anunciado numa festinha, em Nova York, que este ano aconteceu na última segunda-feira, 6 de fevereiro.

O resultado de 2012 causou alguma controvérsia entre os leitores do site. Nem tanto pela escolha, mas pela maneira como Alice Waters, do restaurante Chez Panisse, avaliou os dois finalistas. Uma das principais defensoras da comida orgânica, sazonal e local nos Estados Unidos, ela deixou a impressão de ter encarado os livros de sua cota com um tanto de má vontade. “Ambos parecem contribuir para alimentar nosso vício em açúcar e gordura”, escreveu, antes de dar o troféu a The art of living according to Joe Beef: a cookbook of sorts (Ten Speed Press, 304 pp., US$ 40), de David McMillan, Frédéric Morin e Meredith Erickson, e deixar como segundo colocado o Momofuku milk bar (Clarkson Potter, 256 pp., US$ 35), de Christina Tosi.

Acompanhar os textos dos jurados no decorrer do Piglet não só é divertido como ajuda a entender o que, na visão especializada – a maioria dos votantes tem algum título publicado ou em vias de publicação e, melhor ainda, escreve bem –, prejudica ou ajuda a fazer o sucesso de um livro de cozinha. Separei os principais exemplos ruins, porque são muito comuns (cada um deles merece ser melhor dissecado em colunas futuras):

• Ingredientes difíceis (e receitas que obrigam os leitores a pular de loja em loja porque não dá pra resolver a lista toda em apenas um supermercado);

• Etapas muito elaboradas (como notou o jurado Jacob Weisberg, do Slate Group, “quando você acabar de preparar a comida, alguns ingredientes já estarão fora da temporada”);

• Receitas-corrente (daquelas que fazem muitas remissões a outras, no mesmo livro, e assim acabam multiplicando o número de ingredientes e as etapas de preparo);

• Fotos excessivas dos chefs (“Aqui ele está servindo chá. Aqui, colhendo limões de uma árvore e usando fones de ouvido. Fones de ouvido – por quê?”, pergunta Hunter Lewis, da Bon Appétit);

• Fotos que não acompanham o texto (se uma receita pede apenas um dente de alho, a imagem correspondente não pode mostrar uma frigideira cheia deles);

• Quantidades impossíveis (1/16 de colher de chá? Sério, 1/16 de colher de chá? A respeito de uma das receitas de The family meal: home cooking with Ferran Adrià [Phaidon Press, 384 pp., US$ 29,95], do badalado chef espanhol, a jurada Celia Sack contou que parecia estar cozinhando para um iguana, de tão pequenas eram as quantidades pedidas);

• O problema da múltipla personalidade (livros que ensinam tanto a ferver água quanto a abrir massa-folhada: são para amadores ou para alunos avançados de confeitaria?);

• Nomes que intimidam – ou irritam (“Como cozinhar camarões à maneira de um profissional, não de um idiota” faz parte do livro American flavor [Ecco, 336 pp., US$ 34,99], de Andrew Carmellini).

Há, também, uma série de detalhes que fazem a diferença para melhor. Mas esses ficam para um outro texto.

[09/02/2012 22:00:00]