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Uma pequena floresta de livros
PublishNews, 18/06/2010
Na coluna de hoje, Roney fala sobre a “biblioteca de madeira” do Horto Florestal

O Horto Florestal de São Paulo, na zona norte e vizinho do Parque da Cantareira, é certamente um dos parques mais bonitos e simpáticos da cidade. Lugar agradável para caminhar em meio à Mata Atlântica, sentar, conversar, deixar crianças brincarem e aproveitar um parque público bem cuidado. E ainda beber água de bica e conversar em torno da fonte, lembrando usos e costumes anteriores aos do abastecimento de água encanada na cidade...

O Horto tem um museu e uma de suas atrações é uma pequena biblioteca de livros de madeira. Não são encadernações de madeira, mas livros integralmente de madeira e sem páginas de papel dentro. Esta “biblioteca” é, na verdade, uma espécie de xiloteca, acervo de tipos de madeira encontrados no Estado de São Paulo; os livros de madeira podem também servir como apoiadores de livros impressos na prateleira.

No museu, fundado em 1931, funcionou durante anos uma oficina de trabalho e de aplicação de diferentes técnicas de entalhamento, sendo os livros de madeira parte desta produção. No segundo andar, o mais interessante do museu, há também uma xiloteca completa e cada amostra de madeira tem um entalhe com a imagem das sementes da árvore correspondente.

A nossa pequena biblioteca de livros de madeira é reveladora do lugar imensamente destacado que o livro – o livro como objeto – já teve em nossa sociedade, a ponto de transformar-se até se tornar pura forma: o livro-objeto no qual o conteúdo de informação é a própria forma livro; neste caso, livro-madeira. Esta pequena “biblioteca” simboliza o quanto se valorizou armazenar informações sobre a natureza nesse formato, tornando o próprio material de produção do objeto-livro a informação.

É uma pequena floresta de livros ou biblioteca de livros da floresta. E tal como os anéis das árvores que guardam a informação sobre a passagem do tempo, os livros e as bibliotecas também têm esta função em relação à história do conhecimento: ensinar as diferentes formas como ele foi pensando, catalogado, organizado nas bibliotecas e assim por diante. Sem esquecer que as marcas físicas do tempo agindo sobre o papel também são parte da história do suporte da impressão.

As bibliotecas com livros em papel não são apenas recipientes que guardam quantidades de megabites de informações impressas. Elas foram até há bem pouco tempo a forma privilegiada de pensar, olhar, estudar e catalogar de uma parte importante da cultura da humanidade (sem excluir outras formas simultâneas).

Ao mediar o acesso ao conhecimento com a densa espessura do tempo (o livro, sua própria história como objeto e seus “anéis” de tempo), essa forma tem sido, certamente, a possibilidade, de certa humildade na condição humana ao nos vermos diante de algo imensamente maior, mais antigo e cuja lógica tinha que ser apreendida. Estranhas categorias, que certamente passam a anos luz de distância da cultura da informação digital e sua prepotente apropriação de tudo.

Por isso, a pequena biblioteca de livros de madeira do Horto Florestal é tão curiosa e reveladora de uma história do conhecimento, da poesia, da cultura, em que o livro tem sido – ou foi – um suporte persistente e vitorioso. A sua simples existência como formato – o de livro... – sustenta, literalmente, a informação. (O museu do Horto abre de terça à sexta das 9h às 12h e das 13h30 às 16h30 e aos domingos das 10h às 15h30, e não esqueça de beber água da bica...)

Roney Cytrynowicz é historiador e escritor, autor de A duna do tesouro (Companhia das Letrinhas), Quando vovó perdeu a memória (Edições SM) e Guerra sem guerra: a mobilização e o cotidiano em São Paulo durante a Segunda Guerra Mundial (Edusp). É diretor da Editora Narrativa Um - Projetos e Pesquisas de História e editor de uma coleção de guias de passeios a pé pela cidade de São Paulo, entre eles Dez roteiros históricos a pé em São Paulo e Dez roteiros a pé com crianças pela história de São Paulo.

Sua coluna conta histórias em torno de livros, leituras, bibliotecas, editoras, gráficas e livrarias e narra episódios sobre como autores e leitores se relacionam com o mundo dos livros.

** Os textos trazidos nessa coluna não refletem, necessariamente, a opinião do PublishNews.

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