O mundo visto daqui (Praça General Osório)(Desiderata, 224 pp., R$ 44,90) é uma coletânea de textos, pensamentos, crônicas e desenhos do escritor e humorista Millôr Fernandes publicados na imprensa entre 1980 e 1983. Neles, o autor destila toda sua verve crítica em ensaios sobre futebol, sociedade, corrupção, imprensa, relacionamentos e autoridade.

Entre uma anedota e outra (onde dá seu próprio significado a palavras como “inflação”, “nepotismo” e “dívida pública”), Millôr aborda assuntos sérios como em seu texto “Sugestão ao povo e ao poder”, onde, diante do impasse quanto à abertura política e seus desdobramentos, acalorado pelo atentado a bomba no Riocentro, aconselha a realização de um plebiscito para concluir se aquele foi um ato político ou não.

Seu arsenal é rico, sobrando até para o leite bovino (“tem chumbo, tem benzina, tem mais água do que leite, tem serragem, e sou capaz de jurar que não tem nem vaca por trás desse negócio”) e para os profissionais da psicanálise, que o autor carinhosamente chama de “psicanalhistas”: “Ninguém precisa ser psicanalista pra saber que o alto custo da psicanálise visa, humanamente ao bem-estar do psicanalista, e que a pretensão terapêutica da psicanálise é muita pretensão e pouca terapêutica”, escreve.

Mais do que uma simples observação do cotidiano, o livro é o registro de uma época em que o Brasil, por meio de contestadores incansáveis como Millôr, fazia frente a sua realidade política e a seus governantes.