“O Brasil tem muitos bons escritores e é preciso mostrá-los”, diz tradutor alemão
PublishNews, Maria Fernanda Rodrigues, 06/10/2011
Michael Kegler, que será o mediador do bate-papo entre escritores brasileiros na Feira de Frankfurt, diz que o interesse das editoras de seu país pela literatura brasileira já cresceu
O alemão Michael Kegler é um dos grandes entusiastas da literatura feita em língua portuguesa e já traduziu autores como José Eduardo Agualusa, Gonçalo M. Tavares e Paulina Chiziane. Apesar de ter vários trechos de escritores brasileiros na gaveta e uns tantos projetos em mente, por enquanto só traduziu Notícias do Mirandão, de Fernando Molica, lançado na Alemanha por uma editora pequena. Isso é uma mostra de como é risível a presença da literatura brasileira por lá. Segundo o tradutor, existem apenas 60 títulos traduzidos. E desses, 39 são do Paulo Coelho.

Mas Kegler está confiante de que essa realidade vai mudar. Aliás, já começou a mudar no momento em que a Feira de Frankfurt anunciou que homenagearia o Brasil em 2013 e quando a Fundação Biblioteca Nacional lançou o projeto de apoio à tradução de obras brasileiras.

Confira a entrevista desse alemão apaixonado pelo Brasil, que conheceu ainda menino quando a família se mudou para Minas Gerais. Ele será o mediador do painel “Who or what tells us of Brazil?”, organizado pelo Centro Cultural Brasileiro em Frankfurt e que promoverá um bate-papo entre Carola Saavedra e Marcelo Ferroni no sábado, dia 15 de outubro, entre 15h45 e 16h45 na Feira de Frankfurt.

Você vê alguma chance de o interesse do alemão pela literatura brasileira crescer?

Sim, o interesse já aumentou desde que o Brasil foi anunciado país tema da Feira do Livro de 2013, e principalmente desde a publicação do edital de apoio à tradução. Todos nós percebemos com alguma surpresa que a presença brasileira no mercado editorial alemão tinha caído quase a zero nos últimos anos. Concretamente, temos pouco mais de 60 títulos traduzidos no mercado, incluindo reedições, clássicos, livros de bolso etc. E desses títulos, 39 são do Paulo Coelho. Portanto, não será muito difícil crescer significativamente. E isso é mesmo necessário, pois uma ou até duas gerações de escritores brasileiros passaram completamente despercebidos aqui. Mas voltando à pergunta: Sim, as editoras acordaram e perceberam que há uma lacuna, e estão à procura....

O novo programa de tradução de autores brasileiros vai ajudar a ampliar a presença da literatura brasileira no exterior?

Definitivamente. Temos que ver que a publicação de um livro traduzido é sempre mais cara do que a publicação em língua original. Há também o risco que uma editora toma ao apostar numa literatura estrangeira. O apoio à tradução pode ajudar a reduzir o risco financeiro. Mas já o sinal de que o Brasil está disposto a se comprometer, a investir na internacionalização de sua literatura, cria um clima favorável. Importante agora é que o programa se mostre estável, confiável e sustentável a longo prazo.

Quais livros brasileiros você já traduziu?

Por incrível que pareça, só um: Notícias do Mirandão, de Fernando Molica, em 2006. Foi um dos poucos livros brasileiros publicados na Alemanha nos últimos cinco anos, por uma editora pequena - e sem apoio brasileiro. Tenho outros livros e trechos na gaveta. Ideias não faltam, e já tenho algumas propostas para o próximo ano.

Quais livros você gostaria de traduzir?

A lista é bem maior do que o espaço que temos para esta entrevista e inclui bem mais do que eu seria capaz de traduzir em toda minha vida. Eu citaria, aleatoriamente, Eucanaã Ferraz, André Sant'Anna, Paulinho Assunção, Ignácio de Loyola Brandão, João Antônio, Fernando Bonassi e outros. Felizmente temos cerca de 20 tradutoras e tradutores literários na Alemanha que trabalham a sério com a língua portuguesa. É gente extremamente qualificada e culta e todos eles têm sugestões maravilhosas e estão ansiosos para mostrar isto tudo aos leitores de língua alemã.

Qual escritor você gostaria de ver na Feira de Frankfurt em 2013?

Principalmente aqueles que terão um livro na praça nesta época. É preciso apoiar as editoras também neste sentido. A presença do autor ajuda muito a vender um livro. Por isso já tentamos lançar algumas iscas, promovendo autores brasileiros bem antes de 2013. Este ano fizemos uma série de leituras com gente ainda desconhecida na Alemanha. Em março, o João Paulo Cuenca esteve aqui por iniciativa própria. Fizemos três leituras, sempre com apoio de associações locais, em Frankfurt, Munique e Berlim, e através disso já conseguimos uma editora. Toda a comunidade deve contribuir para o sucesso do Brasil em 2013 e para além desta data. Com isso quero dizer que também quero ver autores brasileiros aqui em 2014, 2015...

Conhece as obras de Carola Saavedra e de Marcelo Ferroni?

Sim e não. Devo confessar que ainda não li o romance do Marcelo Ferroni, que sairá em alemão no ano que vem. Talvez eu até espere pela tradução, que certamente será muito boa. Da Carola Saavedra já li dois romances, portanto, conheço algo de sua obra.

Qual é a sua ligação com o Centro Cultural Brasileiro em Frankfurt?

Ah, o CCBF tem promovido muitas coisas boas aqui em Frankfurt. A cidade é pequena, e a cena de língua portuguesa é menor ainda. Temos o CCBF e temos a livraria TFM. Quem trabalha com língua portuguesa não passa sem estas duas instituições. E ambas estão sempre muito abertas a propostas culturais e apóiam bastante na medida das suas possibilidades. Quando se teve a ideia de convidar alguns escritores brasileiros para já animar a festa de 2013, me chamaram para fazer parte da equipe, mediar os eventos, estas coisas. É tudo muito natural.

Esses encontros que estão sendo realizados pelo CCBF têm dado resultado?

Como já disse, a presença de João Paulo Cuenca trouxe um resultado imediato, embora o evento principal tenha acontecido em Munique, promovido pela associação Lusofonia, também muito ativa. De resto estou convencido de que precisamos de muitas iniciativas pequenas e grandes, privadas e institucionais. A cultura não é um automatismo, mas sim um processo complexo, confuso e sempre surpreendente. Tomamos mais uma vez o Cuenca como (muito bom) exemplo. Encontrei-o em Portugal, no Festival Correntes d'Escritas, que frequento há alguns anos. Numa conversa entre copos ele disse que ia à Alemanha passar umas férias e perguntou se a gente não queria fazer um encontro literário em Berlim. Peguei a bola e em poucos dias tínhamos acertado três leituras - em Frankfurt, Berlim e Munique. Tudo sem luxo, mas com muita boa vontade do pessoal envolvido. Traduzi umas páginas do seu último livro e aí fizemos esta pequena turnê, sem grandes expectativas, "just for fun". E deu certo. Estou convencido de que os encontros com a Letícia Wierzchowski, Adriana Lisboa, Santiago Nazarian e João Gilberto Noll, que o CCBF está promovendo de forma mais institucional, terão os seus efeitos, e a presença da Carola Saavedra na Feira do Livro, os encontros em Frankfurt e Berlim, terão resultados. O Brasil tem muitos bons escritores e é preciso mostrá-los.

Qual é a sua relação com o Brasil?

Vivi perto de Congonhas do Campo, em Minas Gerais, dos quatro aos dez anos e fiz os primeiros quatro anos escolares lá. Minhas primeiras leituras foram os livros do Monteiro Lobato. Vivo na Alemanha desde 1976 e desde 1991 trabalho com língua portuguesa. Me tornei tradutor e alarguei meu espaço imaginário pelos outros países de língua portuguesa: Portugal, Angola, Moçambique etc. Mas o Brasil será sempre uma espécie de primeiro amor.
[06/10/2011 00:00:00]
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