
Depois de um primeiro dia com discussões concentradas em inovação, inteligência artificial e desafios do mercado do editorial, o Rio International Publishers Summit – evento do mercado editorial que antecede a Bienal do Livro Rio – debateu, entre outros assuntos, o futuro do audiolivro no país com especialistas internacionais. Uma mesa realizada nesta quinta-feira (12) reuniu Chantal Restivo-Alessi (HarperCollins), Amanda D’Acierno (Penguin Random House US), Paulo Lemgruber (Audible) e Videl Bar-Kar (Bookwire).
A palavra de ordem no painel foi esta: catálogo. Os executivos insistiram na importância da formação de catálogo em áudio para o crescimento e estabelecimento do segmento. "Nos EUA, construímos o mercado juntos do zero", contou D'Acierno, presidente da Penguin Random House Audio Publishing Group, comparando a experiência com mercados europeus que, mesmo antes das mídias digitais, já tinham um segmento ativo de "spoken word", como Alemanha e Reino Unido. "O mais importante foi realmente fazer crescer o catálogo, é preciso ter o suficiente para que os consumidores se engajem. Eles devem encontrar o que estão procurando. Mas também sempre fomos fortes defensores do formato, não apenas com os consumidores, mas também com agentes e escritores", completou.
Lemgruber – que é carioca e comanda a operação internacional da Audible desde os EUA – também ressaltou a importância da formação de catálogo no processo. "Se o consumidor encontra um título que está buscando, ele gosta, permanece e retorna", afirmou. A Audible tem cerca de 50 mil títulos em espanhol disponíveis para a América Latina, mas cerca de oito mil em português. "Temos muito a fazer no sentido de crescer essa oferta", completou.
No segundo semestre de 2025, a empresa, subsidiária da Amazon, vai completar dois anos de operação no Brasil. O executivo também participou da implantação em outros países, como Japão e Índia, e ele afirmou que os desafios são parecidos ao redor do mundo – inicialmente, existe uma certa resistência em mais de um sentido. "Antes de entrar em cada mercado, fazemos pesquisas de consumo sobre os modelos mais adequados para aquela região. Quem rege como a empresa vai operar é o interesse do consumidor e o conhecimento dos formatos. No Japão, por exemplo, a palavra 'audiolivro' não existia. Então precisamos investir muito em produção e marketing para criar uma consciência sobre o produto. O Japão é hoje o nosso mercado que mais cresce", afirmou.
Chantal Restivo-Alessi, diretora digital e CEO de Línguas Estrangeiras Internacionais da HarperCollins Publishers, ressaltou que a qualidade do conteúdo é muito importante – e nem sempre com custo de produção alto. "Conseguir negociar com os diferentes profissionais envolvidos, como por exemplo operadores de estúdios e produtores, é uma habilidade possível para entender como fazer bons audiolivros sem tantos recursos", analisou.
D'Acierno concorda. "O produto precisa ter boa qualidade alta. É uma performance. Por isso, uma dica para empresas é desenvolverem workshops para produtores, diretores, artistas. É preciso expertise no segmento, e vejo muitas opções de parcerias nesse sentido", sugeriu. Outra dica foi a seguinte: "Pensem nas grandes apostas. Nos EUA, por exemplo, os audiolivros de Harry Potter e as memórias do ex-presidente Bill Clinton, entre outros, atraíram muitas pessoas ao formato. Fazer uma produção extraordinária dessas grandes apostas vai trazer as pessoas para o marketplace", completou.
Para Videl Bar-Kar, vice-presidente de Áudio da Bookwire, o mercado brasileiro apresenta muitas oportunidades – não apenas, mas também por conta do alto consumo digital e de áudio em outros formatos e plataformas, como o uso massivo de mensagens de voz por Whatsapp e os altos índices de consumo de podcasts. De toda forma, ele analisa que o mercado local ainda está em fase de construção de catálogos, e também de formação de profissionais para o segmento, como narradores e produtores.
De acordo com a Pesquisa Conteúdo Digital do Setor Editorial Brasileiro, divulgada em maio, os lançamentos de áudio corresponderam a 21% dos novos livros digitais produzidos no Brasil em 2024, com destaque para as vendas em modelos por assinatura, que cresceram 64% em relação a 2023.
Outro consenso no painel do Summit foi o de que o investimento no digital tem retornos a longo prazo, mas que valem a pena.
A inteligência artificial também foi abordada durante o debate. "Acredito que ela pode ajudar muito, não apenas na produção do audiolivro em si, mas também em outros processos internos das editoras", disse Restivo-Alessi. Em entrevista ao PublishNews em maio, ela já havia dito que a IA teria "um grande impacto em todas as funções e níveis do nosso negócio, em termos de aplicações e ferramentas". Agora, no Summit, reafirmou a necessidade de as empresas serem transparentes nesses usos. "Isso é muito importante. É preciso falar aos consumidores o que eles estão consumindo. Mas ela pode contribuir muito, acredito, com os níveis de experimentação e de construção de catálogos".
Rio Capital Mundial do Livro
Em outro painel da tarde, o presidente do Sindicato Nacional dos Editores de Livros (SNEL), Dante Cid, falou sobre o processo até o título de Capital Mundial do Livro, pela Unesco, ao lado da secretária-executiva do projeto na Prefeitura, Maria Isabel Werneck, e do secretário municipal de Educação, Renan Ferreirinha.
"Foi e tem sido uma produtiva colaboração entre poder públicos e agentes privados", disse Dante. "A ideia é que prossigam as ações para dar visibilidade ao livro e à leitura, porque a intenção é transformar a leitura na cidade, a aposta é por uma nação leitora. A visibilidade que o título traz para a questão do livro pode contribuir para chamar a atenção para a necessidade de outras ações", explicou. "De toda forma, a valorização precisa partir também da sociedade, não é algo que pode ser forçado pelo governo ou pelos editores", concluiu.
Isabel Werneck destacou que seis linhas de expressões culturais foram criadas esse ano no Edital do Imposto Sobre Serviço (ISS), uma espécie de Lei Rouanet municipal. “A linha quatro, toda dedicada à leitura, recebeu a inscrição de 165 projetos. O resultado sai em dezembro e esse número é bem expressivo para uma primeira iniciativa, que já faz parte do legado do Rio Capital Mundial do Livro”, quantificou Werneck.
*O jornalista viajou a convite da GL events.