Como podemos comparar um homem que deixou de ser escritor para se dedicar ao ofício de mecânico com uma mulher que viaja em um trem de Berlim para Munique enquanto observa outra passageira comer um ovo, e, ainda, com uma menina que não aceita o fato de não ser notada por um colega de classe? Aparentemente, não há nada que nos faça pensar que histórias tão banais possam se interligar, mas nos dez textos de Mulher feita e outros contos (Fósforo, 80 pp, R$ 34,90) Marilene Felinto usa a simplicidade cotidiana para mostrar ao leitor que a complexidade da vida está ligada de modo íntimo ao ordinário. Nesta volta da autora de As mulheres de Tijucopapo ao conto, as confluências e separações acontecem ao acaso, de forma leve, mas impactante. O leitor que mergulhar nesse microcosmo sairá dele com a sensação de que se encontrou com um amigo, com a infância, ou a própria velhice, como se um pouco de cada um de nós estivesse descrito ali. Mulher feita e outros contos é uma reunião desse tipo de acontecimento, com personagens majoritariamente femininas que permitem ao leitor refletir sobre a inconstância dos dias.