No primeiro artigo desta série, falei sobre o mindset necessário, a atitude mental, para a criação da nova fase do setor livreiro no Brasil.
Falei também sobre como as grandes redes demoraram a encarar a fase seguinte de qualquer crescimento, a de investir em novas ferramentas de gestão para não quebrarem, atitude que vale também para as editoras, pois essa conta é cobrada de todos, e elas tem sua responsabilidade e peso nessa balança.
Trago assim a partir deste artigo as primeiras soluções e ferramentas de gestão que já estão acessíveis no mercado para iniciarmos este processo de forma sólida e detalharei aqui a mais nova delas e que pode impulsionar diversas ações. A maioria dos profissionais está costumada a ver seus resultados apenas pelo comparativo estoque x vendas, a camada mais básica. Isso vale tanto para as livrarias quanto para as editoras. Mas esta análise é muito superficial perante o universo de oportunidades e revelações que estão ao redor destes números, em suas análises relacionadas.
Por exemplo: você sabe dizer em que livraria/loja/seção um produto vende mais, é mais desejado, e onde há uma ruptura e perda de oportunidade? Quem comprou seus produtos, quais são seus outros interesses culturais e potenciais intenções de compras? Qual sua frequência em visitar tal livraria e até mesmo qual é o seu poder aquisitivo? Imagina conhecer esses dados de seu cliente de forma global? Todas as ações das editoras, inclusive dos próximos investimentos, podem levar em conta esses aspectos.
E sim, você já pode ter essas informações. A meu ver, estes dados devem estar contidos nas primeiras ordens do dia dentro de sua empresa, e suas repostas, para começar, derivam da mesma fonte - suas vendas x estoque. Com estes números abertos e bem interpretados, as nuances se desmembram e é possível traçar estratégias e ações mais eficazes, como: negociar reposições mais assertivas, escolher o pdv ideal para uma ação de marketing, até ir além e agregar estas informações para programar uma nova tiragem ou a edição de um novo produto, de acordo com seu público e ponto de venda correlato - isto para as equipes comerciais e de marketing mais sofisticadas. É preciso e é possível traçar a linha de consumo do seu cliente para orientar e sustentar a existência do seu negócio.
Mas como faço isso na prática?
Primeiramente, para ter estas informações em mãos dependemos das livrarias. No artigo anterior chamei sua atenção para o modo como as mesmas analisam, geram e compartilham seus dados, pois não se pode agir com inteligência sem informações qualificadas.
Neste aspecto, a novidade mais quente é a ferramenta que acaba de ser disponibilizada pela Livraria Cultura. A rede, que sempre teve a reputação de ter o melhor sistema de compras e consignações acaba de lançar um portal onde traz algumas respostas que tanto ansiamos. Para escrever este artigo, tive uma conversa com o CEO da Livraria Cultura, Sérgio Herz, em pleno dezembro pós natal justamente sobre essas questões perenes no mercado, sobre os entraves que enfrento em nosso segmento para o desenvolvimento destas soluções, e ele me apresentou o que tem feito com sua equipe para contornar esta situação.
Assim trago aqui o Cultura Insight, a plataforma onde são compartilhados os dados de vendas dos produtos às editoras, para que ambos ampliem suas visões sobre seus negócios e possam melhorar tanto o atendimento interno entre livraria x fornecedor, como profissionalizar seus processos e refinar sua gestão.

Quando vi este portal minhas esperanças se fortaleceram. Mas percebi que o Sérgio não estava com a expressão de quem tinha o produto certo para a hora certa. O que ainda há de errado? O mesmo motivo que me levou até seu encontro: a resistência no nosso mercado às mudanças, em todos os níveis.
As editoras ainda precisam aprender a trabalhar com estes dados de forma produtiva; mas tê-los de forma tão organizada é metade do caminho. É preciso vencer o ceticismo, a falta de interesse e despreparo técnico se quiserem ver resultados, afinal, as editoras estão tão necessitadas de faturamento quanto as livrarias.
Vemos frequentemente críticas unilaterais do setor editorial. Um problema nunca tem a origem apenas em um lado. Este é o momento em que as editoras também precisam entender como obter essas informações e aprender a usá-las de forma eficiente. A iniciativa da Cultura precisa ser acompanhada. Não basta um dos elos da cadeia se adequar, os outros precisam acompanhar senão não dará certo, e todos morrerão abraçados. Não é correto culpar apenas as redes livreiras como totais responsáveis pelos vícios e desastres presentes.
Os produtos de inteligência de mercado vem justamente para fazer essa ponte e as pazes entre as partes envolvidas na busca do cliente em comum. Esta é uma ferramenta excelente para você começar a testar suas análises e a habituar-se a este universo. É tudo o que as editoras poderiam desejar como iniciação, um playground e tanto: o poder da informação em suas mãos, vão-se as demoras nas tratativas, reclamações e ruídos nas atividades comerciais de ambos os lados, há rupturas menores, abastecimentos mais rápidos e assertivos, etc.
Vejam alguns exemplos das análises mais sofisticadas que o Cultura Insight proporciona em cima dos cruzamentos de suas vendas x estoque, com dados disponíveis quase que em tempo real vindos das lojas da Cultura:

Elenco aqui algumas das métricas mais básicas...
I. Faturamento mensal
II. Visão por assunto
III. Visão por loja
IV. Estoque por produto
V. Estoque em ruptura
VI. Sugestão de reposição
VII. Resumo de Consignação
VIII. Compras
IX. Clicks e resenhas
.... até as mais estratégicas:
I. Perfil Fidelidade
II. Perfil Preço
III. Perfil Interesse
IV. Saturação de Clientes
V. Assuntos Relacionados
VI. Títulos Relacionados
VII. Sugestões de ações
VIII. Raio X – Produto à Produto & Produtos Esgotados
IX. Procura específica por produtos em loja
O que falta então?
É muito importante que as editoras comecem a usá-lo, experimentando e apoderando-se do seu mercado para ajudar assim a produzir mais resultados. Já foi o tempo de primeiro lançar um livro e depois verificar se alguém quer comprá-lo ou lê-lo. Eis a importância das casas editoriais conhecerem seus clientes e tornarem-se parceiras mais comerciais neste ponto com as livrarias, e não apenas cobrá-las.
As editoras estão preparadas para transitar no mercado que atuam? Pensaram em seu papel mercadológico e quem são os seus clientes? Querem conhecer ferramentas que podem mudar a forma como livros são publicados e vendidos no Brasil? Valorizam o poder da informação e a capacitação de seus profissionais para isso?
Neste momento chamo cada ponta deste mercado para uma reflexão, para equacionar as devidas responsabilidades de todos e não apenas formar sua opinião sob críticas sem saber quem está movimentando-se de fato nos bastidores e para onde, e se um movimento benéfico teve apoio ou não, por exemplo. Eu estou dentro das engrenagens e vejo os dois lados da história. Inteligência de mercado se cria na prática e com muitas mãos, e é o futuro.
A ferramenta já está disponível para todos os fornecedores da Livraria Cultura. Há modalidades de acesso e cada editora interessada deve contatar a rede para ser incluída na ferramenta.
No próximo artigo falarei de projetos com a Saraiva e a Livraria da Vila, e o que vem de novo para a próxima fase deste mindset apresentado, agora focado no cliente final. Tudo é uma cadeia lógica, então é preciso que assimilem a tecnologia e visões estratégicas propostas neste primeiro exercício.
Espero ter conseguido abrir um pouco mais sua mente, estimulado sua curiosidade e o seu senso analítico prático para assim termos os primeiros tijolos desta nova estrada. Meu conselho às editoras: marquem suas visitas na Livraria Cultura e comecem a entender mais de seu negócio dentro deste mapa da nova ordem! O jogo pode ser bem mais divertido.
