Mudanças na Lei Rouanet afetam pouca coisa no mercado editorial
PublishNews, Leonardo Neto, 22/03/2017
Entre as novidades anunciadas ontem está o teto para captação de R$ 10 milhões por projeto, o que pouco afeta os eventos literários

Nova Instrução Normativa da Lei Rouanet foi apresentada nesta terça-feira pelo ministro da Cultura, Roberto Freire | © Janine Moraes / Ascom MinC
Nova Instrução Normativa da Lei Rouanet foi apresentada nesta terça-feira pelo ministro da Cultura, Roberto Freire | © Janine Moraes / Ascom MinC

Sancionada em 1991, a Lei Rouanet foi criada com a finalidade de captar e canalizar recursos privados, via renúncia fiscal, para projetos culturais. É pela lei que são viabilizados não só eventos como as Bienais ou a Flip, mas também a publicação de livros. Na última terça-feira (21), o ministro Roberto Freire, da Cultura, anunciou mudanças na lei, por meio de uma Instrução Normativa publicada no Diário Oficial desta quarta-feira (22). Com as mudanças, o Ministério da Cultura (MinC) quer descentralizar os projetos. Segundo levantamento do órgão, 80% das propostas aprovadas são realizadas na região Sudeste e 11% no Sul. Restando muito pouco para o Nordeste (5,5%), Centro-Oeste (2,6%) e Norte (0,8%).

Além disso, o MinC estabelece na Instrução Normativa a criação de ferramentas tecnológicas para aumentar o controle, a fiscalização e a transparência dos projetos, que passarão a ter prestação de contas em tempo real. O MinC estima que 18 mil projetos estão com prestação de contas pendente. "Tivemos como principal preocupação a transparência dos processos. No Brasil de hoje, o acompanhamento da prestação de contas em tempo real é um avanço muito importante que será trazido à Lei Rouanet com a vinculação da conta única do Banco do Brasil e a publicação da movimentação dos recursos públicos no Portal da Transparência. Isso proporcionará que o passivo pendente de análise existente em cerca de 18 mil projetos seja desbastado", destacou o ministro durante o evento.

"O sistema já estava preparado para a prestação de contas via internet, mas o processo tinha que seguir em papel. Há muito tempo, a gente ansiava para que isso de fato funcionasse. Estamos torcendo para que esse processo fique cada vez mais desburocratizado, transparente e on-line", comemora Amanda Mendes, diretora da empresa ApontoAr especializada em elaboração, acompanhamento e prestação de contas de projetos em leis de incentivo.

Última edição da Bienal Internacional do Livro de São Paulo captou via Lei Rouanet R$ 3,9 milhões, abaixo, portanto, do teto máximo de R$ 10 milhões | © Divulgação
Última edição da Bienal Internacional do Livro de São Paulo captou via Lei Rouanet R$ 3,9 milhões, abaixo, portanto, do teto máximo de R$ 10 milhões | © Divulgação

Entre as principais mudanças que poderiam afetar a realidade sobretudo de eventos literários está o teto de até R$ 10 milhões por projeto (podendo este limite ser ampliado em até 50% para projetos realizados nas regiões Nordeste, Norte e Centro-Oeste). Para as bienais (tanto de São Paulo quanto a do Rio), essa mudança não deverá ter efeito imediato. “Historicamente, a captação fica abaixo desse teto. Ele está, portanto, de acordo com o nosso porte”, apontou Fernanda Gomes Garcia, diretora executiva da Câmara Brasileira do Livro (CBL), entidade que realiza a Bienal de São Paulo. Na última edição, realizada em 2016, a CBL foi autorizada a captar R$ 9,3 milhões via Rouanet. Desse total, no entanto, a Bienal captou R$ 3,9 milhões, que representou 30% do orçamento global do evento.

Para a próxima edição da Bienal do Rio, marcada para acontecer entre agosto e setembro deste ano, o MinC autorizou a captação de cerca de R$ 5 milhões. Tatiana Zaccaro, diretora do Núcleo de Cultura da Fagga, que organiza a Bienal do Rio em nome do Sindicato Nacional dos Editores de Livros (SNEL), aponta, portanto, que o teto não afetará a realização da Bienal. “A parte burocrática, de prestação de contas, é a única coisa que efetivamente muda para a Bienal, mas a gente enxerga que isso vai ajudar a democratizar o processo”, comentou.

Capa do livro 'Balé Folclórico da Bahia', editado pela Solisluna via Lei Rouanet, custa R$ 300, acima do teto estipulado pela nova Instrução Normativa do MinC | © Reprodução
Capa do livro 'Balé Folclórico da Bahia', editado pela Solisluna via Lei Rouanet, custa R$ 300, acima do teto estipulado pela nova Instrução Normativa do MinC | © Reprodução
Outra mudança que pode atingir a indústria do livro é o novo valor médio máximo de R$ 150 para os produtos culturais subsidiados pela Lei, o que vale tanto para ingressos quanto para livros, por exemplo. Essa novidade pode não afetar as bienais (o ingresso mais caro da última edição de São Paulo custou R$ 25 e a do Rio, R$ 16), mas atinge a produção de livros de arte, cujos valores podem ultrapassar esse limite. “Em geral, os livros subsidiados já são vendidos a um preço menor do que eles custariam. Nossos livros, em média, não ultrapassam esse valor. Mas aqueles que ultrapassarem, vamos ter que estudar”, disse ao PublishNews Valeria Pergentino, diretora da editora baiana Solisluna, que faz muitos livros via leis de incentivo. O belíssimo volume Balé Folclórico da Bahia, editado pela Solisluna em formato grande (30 x 40) e capa dura, é vendido a R$ 300. Apesar de um possível ajuste para os futuros livros viabilizados via Rouanet, Valéria comemora o fato da descentralização da lei. “Lendo [a Instrução Normativa], tive a sensação de que foi mais positivo do que negativo, sobretudo por essa questão da descentralização. Ter um olhar para essas regiões [Nordeste, Norte e Centro-Oeste] é muito positivo. É muito difícil para a gente, que está aqui no Nordeste, por exemplo, viabilizar projetos via Lei Rouanet. A novidade busca corrigir isso”, completou.

[22/03/2017 12:32:22]