Precisamos falar sobre preconceito, Rita Lee
PublishNews, Juliana Albuquerque*, 08/12/2016
Juliana Albuquerque chama a atenção para uma declaração da cantora que acaba de lançar sua autobiografia e conclui: ‘não devemos usar a palavra maricas como sinônimo de fraqueza’

Neste meu artigo de minha estreia no PublishNews, preciso começar fazendo uma confissão: adoro problematizar. Ao longo do último ano, tomei um gosto por isso que quem me conhece sabe bem. Problematizar e descontruir, ô delícia! É uma maneira boa de sacudir a poeira e aprender sempre. Então bora lá.

No último novembro, a superstar brasileira do rock, Rita Lee, lançou sua autobiografia. Meios de comunicação a rodo acharam por bem dar destaque à seguinte declaração da cantora e compositora: “envelhecer não é para maricas”. Bateu na boca do estômago. Fiquei na expectativa de ler comentários criticando-a. Silêncio. Na era das problematizações, nada a respeito dessa frase.

As pessoas podem dizer que não foi intenção dela ofender os gays, que ela jamais faria isso etc. Gente, a intenção é o que menos importa aqui. De boas intenções o inferno está cheio, diria minha avó. O que interessa mesmo é a gente discutir por que não podemos, não devemos nem precisamos usar a palavra maricas como sinônimo de fraqueza. É assim que os preconceitos se consolidam. Por isso, insisto: o que a Rita Lee quis dizer não nos interessa. O que é importa é o que ela, de fato, disse.

E é aí que entra o papel do editor. Seja do jornal, da revista ou do livro, o editor de conteúdo tem responsabilidade enorme sobre o que publica. Porque não tem muito jeito, o editor é o gatekeeper dos conteúdos que disponibiliza pro seu público. E a difícil (e, às vezes, ingrata) tarefa de decidir o que publicar fica em nossas mãos. Essa decisão passa por vários fatores: linha editorial, posicionamento político, resultado financeiro – que, em geral, tem um peso enorme –, entre outros.

Podemos publicar uma declaração preconceituosa, o livro que bajula um juiz de direito ou o tratado megalomaníaco de um ditador alemão. E também podemos lançar um panorama histórico sobre mulheres, raça e classe, livros e autores LGBT e a obra da francesa que se tornou ícone feminista. Pelo bem da diversidade, podemos dar voz a todo mundo. Mas são escolhas pelas quais teremos de responder em algum momento. Portanto, colegas editores, não fujamos da responsabilidade. E aos leitores, por favor, não deixem de nos cobrar por isso sempre.


* Juliana Albuquerque (@judahoo no Insta e @ju_da_hoo no Twitter) é formada em Letras e em Jornalismo e editora desde 2009. Começou a carreira em 2006, como revisora, no incrível mundo dos livros didáticos, e desde 2015 é publisher da hoo editora (@hooeditora), que publica livros LGBT e veio pra sacudir as calças do patriarcado.

[08/12/2016 09:24:00]