O desafio comum de todos que se preocupam com o futuro do Brasil é a melhoria do nosso projeto educacional: melhores escolas, mais professores melhor qualificados e remunerados, mais e melhores leitores.
Isso está diretamente ligado por uma via de mão dupla com a nossa capacidade de escrever, publicar e tornar acessível o livro. Ou seja, o ”mercado do livro”.
Pensando esse mercado vejo três inimigos: o curtíssimo prazo, os monopólios e os aventureiros.
Em tese, o que é bom para as livrarias é bom para as editoras... e vice-versa. Assim sendo, será bom também para autores e leitores. Portanto, nossos inimigos, nossos problemas, são comuns. Uma corrente possui a força do seu elo mais fraco.
O “curtíssimo prazo” seria a emergência das editoras em fazer caixa, sobreviver no dia a dia. Isso as leva a uma busca aflita por receitas rápidas: vendas direto ao governo, venda direto às escolas, vendas com preço “de custo” em feiras patrocinadas e muitas vezes bancadas com recursos públicos. (Primavera dos Livros, Feira da USP, entre outras. )
O ruim dessas emergências é desestabilizar e enfraquecer o que a médio e longo prazo deveria ser o grande sustentáculo do mercado: uma forte, ampla e diversificada rede de livrarias, com as quais as editoras poderiam contar ao longo de todo o ano.
Livrarias pagam aluguel, IPTU, impostos e muita coisa mais. Certamente poderiam ser bem mais generosas com seus clientes caso também tivessem seus custos bancados por terceiros, o que não é o caso!
No mesmo sentido, consideremos se toda a compra de livros feita hoje pelo governo às editoras, passasse a ser feita diretamente nas livrarias. Quantas centenas delas não se viabilizariam nas pequenas e médias cidades do interior do Brasil afora? E qual não seria o resultado benéfico para todos? Centenas de livrarias criando demanda por livros, criando o hábito de leitura, estimulando o encontro entre leitor e o livro.
Também precisamos nos preocupar com os monopólios. O mundo do livro, das ideias e da cultura combina com diversidade, variedade e inclusão. Nunca com “exclusividade” ou monopólio!
Agentes que anunciam a intenção de ser “a única loja de tudo“ e eliminar (como se isso fosse possível!) toda a rica e diversificada rede de livrarias com suas particularidades, visão e propostas peculiares, vai contra tudo que defendemos.
Queremos e precisamos escolher o que e onde comprar e não que um único agente faça isso por nós, de acordo com suas estratégias comerciais.
E temos os aventureiros. Mesmo considerando que todo empreendimento é uma “aventura”, entendemos como problema agentes que entram no mercado livreiro com propostas desprovidas dos requisitos básicos de sustentabilidade.
Nessa categoria temos: os aspirantes a “visionários”, que pensam obstinadamente em reinventar a roda e reformar a natureza. Claro que a humanidade conhece alguns muito bem-sucedidos. Mas são raros, muito raros. (Galileu, Leonardo, Turing, Jobs, Gates). No futuro, talvez, cada pessoa será visionária por 15 segundos?
Para esses, parece que o nosso querido e funcional livro impresso, em torno do qual a humanidade cresceu, aprendeu e evoluiu, tornou-se um estorvo!
Outros enxergam no livro apenas um atrativo para capturar um público altamente qualificado e como desprezam a remuneração com a venda de livros, o fazem sem nenhum critério mercadológico.
Isso nos faz pensar no “livro grátis”. Fornecer livros e material didático para alunos carentes é importante. Mas como uma exceção!
Assim como tudo que necessitamos para nossa subsistência: arroz, feijão, inovação tecnológica etc., também o livro, deveria ser grátis ou muito barato. Porém não existe almoço ou livro grátis!
Precisamos remunerar os produtores, senão logo nos depararíamos com a redução drástica tanto de textos, livros, autores, editores, tradutores, designers quanto de arroz, feijão, inovação tecnológica.... .
Transformar o livro em produto e distribuí-lo no mercado é a forma mais eficiente de democratiza-lo. (Ou a pior, com exceção de todas as outras...)
Já se disse que a mais importante invenção da nossa civilização não foi a roda. Foi a patente.
O que move o mundo é a necessidade. O que sustenta o mundo se movendo é o mercado.
“...Toda a inspiração que jamais precisei foi o telefonema de um produtor a pedir uma canção", disse Cole Porter.
Cada livro precisa ter seu preço, determinado pelo equilíbrio entre oferta x demanda, preço x custo. Um preço justo. No Brasil, editoras ficaram quase sem reajustes nos últimos anos e o livro está barato. Livro é um barato.
O mineiro Rui Campos é dono da rede Livraria da Travessa. Sua primeira aventura no mundo do livro foi em 1975, quando inaugurou a Livraria Muro, em Ipanema, que logo firmou-se como um lugar de encontro, discussão e resistência ao regime militar. Em meados dos anos 1990, Rui inaugurou a Livraria da Travessa, na Travessa do Ouvidor, no Centro do Rio. Hoje a Travessa conta com sete lojas no Rio e uma em Ribeirão Preto, no interior de São Paulo. Nesse espaço, Rui discute os temas relacionados ao mercado livreiro e o seus impactos na sociedade.
** Os textos trazidos nessa coluna não refletem, necessariamente, a opinião do PublishNews.
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