Encontrando seu próximo livro
PublishNews, 23/10/2013
Encontrando seu próximo livro

Um grande pânico se espalhou recentemente: a livraria britânica WH Smith encontrou e-books impróprios sendo recomendados no meio de livros infantis dos e-books da Kobo que eles hospedam. Isso gerou muitas discussões sobre como as recomendações – na verdade, como a curadoria delas – é gerenciada no ambiente online. Neste caso, a discussão tem a ver com especificidades deste problema e como os metadados podem estar errados, podem ser modificados e incompreendidos. Isso levou a Smith a tirar todo seu site do ar, todos os e-books da Kobo, enquanto o problema era “resolvido”. É uma confusão que mostra como estamos distantes de resolver desafios centrais da venda de livros em um ambiente virtual.

A venda de livros online tem um longo caminho a percorrer em termos de busca ou ajuda aos clientes. Claro, há dois outros grandes problemas que aparecem primeiro: saber quais seriam as sugestões corretas e ser capaz de produzi-las de forma eficiente, para se aproximar da experiência de compra em livrarias físicas.

As análises de Russ Grandinetti da Amazon em nossa conferência Publishers Launch em Frankfurt sugeriram que os EUA e o Reino Unido estão à beira de chegar a mais de 50% de suas transações de vendas online de livros, com outros mercados na Europa e Ásia atingindo esse nível daqui a dois ou três anos. (E essa análise pode estar subestimando a situação; em uma reunião que tive em Londres me contaram que uma das maiores editoras no Reino Unido diz que 60% das vendas de livros impressos, e-books e áudio acontecem através da Amazon!) Vendas de livros online estavam no patamar de 10% ou menos para a maioria das editoras há uma década. Esta mudança é por que o espaço de prateleiras das livrarias diminuiu muito, com a diminuição das grandes redes nos dois grandes mercados de língua inglesa (e em outros menores também).

Quando a maioria dos livros era comprada em locais físicos, era axiomático que um livro mostrado em uma loja tinha uma chance exponencialmente maior de vender em comparação com aquele outro que não era exposto, apesar de todo o suprimento nos EUA da Ingram e da Baker & Taylor, que conseguiam que quase qualquer livro estivesse em quase qualquer loja em 24-48 horas. O livro precisava ser visto na loja para ser comprado. Editoras gerais competentes sabiam que não importava muito forçar um livro através de esforços de marketing se o inventário não estivesse na livraria, porque ver o livro no momento em que você queria comprar era o gatilho mais poderoso para a compra, mais do que qualquer outro. Na verdade, todos os outros estímulos (resenhas, sugestões de amigos, conversas no trabalho) tendiam a agir somente quando o livro estivesse na livraria. (Sem contar que a recomendações de vendedores na loja eram as mais poderosas de todas: por isso o conceito de “vendas à mão”.)

Um problema com a mudança para compra online dentro da perspectiva da descoberta é que o funil para cada comprador continua ficando mais estreito. Não é difícil para alguém em uma livraria olhar centenas de livros em poucos minutos. É quase impossível online. Isto exige ou que o consumidor passe mais tempo comprando para ver o mesmo número de títulos que eles costumavam ver na loja, ou tomar uma decisão tendo visto menos. E a preocupação é que a decisão que é tomada tendo visto menos pode não ser comprar nada. (Ou, especialmente no caso de usuários de tablet, comprar algo que não sejam livros.)

Claro, teoricamente, ser capaz de apresentar um monte de sugestões pessoais dirigidas especificamente a cada cliente poderia ser muito mais preciso do que entrar numa livraria e ficar olhando e, neste caso, menos títulos mostrados poderiam ter o mesmo efeito. Mas estamos muito distante disso. E, por várias razões que espero que este artigo deixe claro, escolhas pessoais seriam, na verdade, bem mais prováveis de serem feitas pelo Google do que pela Amazon (apesar de que isto criaria mais preocupações sobre privacidade para muitos clientes).

A tecnologia que pode ajudá-lo a “escolher seu próximo livro” é tratada como um “motor de recomendações”. Nunca participei de tal esforço, mas o pensamento por trás deles parece centrar-se ao redor da análise de quais livros você comprou e o que procurou e, a partir daí, a descoberta do que poderia ler em seguida. Isso pode se basear em análises do próprio conteúdo (p.ex. Pandora recomendando música de estilo e qualidade similares) e/ou modelos de filtros colaborativos – alavancar as inserções dos usuários (histórico de compra, qualificações e resenhas) para fazer recomendações para outros usuários similares (“pessoas que compraram x também compraram y”). Tudo isso me lembra um grande vendedor de livros, o falecido Joel Turner, e sua palestra na convenção da American Booksellers de 1978 em Atlanta, onde ele disse que “se um cliente vem até meu caixa com cinco livros, eu sempre posso vender o sexto”.

Claro, com o tempo, um vendedor pode preencher este conhecimento com até mais dados quando veem mais compras e conhecem seus clientes, e talvez suas famílias. Mas, na verdade, usar livros comprados como um guia de recomendação é um conjunto de dados incompleto. Também pode ser enganador já que as pessoas compram livros para outros e não só para si mesmos.

Outra forma de olhar para o problema veio de meu amigo, Andrew Rhomberg. Baseando-se em sua experiência com a start-up Jellybooks, ele formulou cinco grandes caminhos para a descoberta de livros: sorte, social, distribuído, impulsionado por dados e incentivado.

A questão é que a maioria das pessoas tira suas ideias sobre o que ler em seguida de muitas fontes: conversas com outras pessoas, reportagens, interações de negócios. Algumas pessoas dizem que conseguem recomendações de livros de seus amigos; outras (como eu) dizem que não leem as mesmas coisas que seus amigos ou parentes. Suspeito que as comunidades online de leitores tendem a funcionar melhor para pessoas que leem muitos livros de gêneros e não tão bem para pessoas que misturam ficção e não-ficção, entretenimento e aprendizado. E algumas pessoas gravitam para o que é mais popular, então os best-sellers funcionam melhor para elas. É claro que entrar em uma lista de mais vendidos dá um gás na venda do livro.

E os livros são comprados por outras motivações diferentes de “para ler”, então poderia também ser importante saber que o filho de um cliente está fazendo aniversário, que o primo de um cliente vai se casar, que um cliente vai comprar uma casa nova ou está procurando um novo emprego ou começando um novo hobby ou gastando dinheiro em um antigo.

Poucas, se é que algumas, destas coisas são aparentes até para a mais dedicada equipe de vendas. Pedaços disso podem ser detectados pela super-vendedora Amazon (mas é improvável que por outras).

Este é um problema tremendamente complexo. Há incontáveis dados potenciais para a decisão de “qual próximo livro comprar” e eles são processados por indivíduos de forma diferente e altamente personalizada. Se você pensar nisso, parece óbvio que a maioria das recomendações não vai funcionar para a maioria das pessoas. O que nos leva de volta à necessidade de fazer muitas recomendações, algo que uma vitrine de livraria faz muito melhor do que páginas online que mostram 10 ou 20 livros de uma vez.

No longo prazo, parece que o Google é a entidade melhor posicionada para encarar este desafio se eles puderem combinar, de alguma forma, o conhecimento do que você tem procurado (algo que eles sabem), com o que você lê online (que ele poderiam saber se você usa o Chrome como seu browser), e os tópicos e títulos de livros que apareceram nos seus e-mails (que eles poderiam saber, se você usar o Gmail) e as coisas que você “gosta” e conversa online (se você usar o Google+). Saber seus planos de viagem e padrões seria útil também.

Claro, a menos que você use o Google Play para compras de e-books e consumo, eles estariam perdendo os dados mais importantes – o que você comprou e com que velocidade lê, e ainda não saberiam nada sobre suas compras de livros de papel (a menos que espiem seus recibos via e-mail também); dados que a Amazon possui sem todas as outras informações. Legal seria relacionar a compra de livros e o consumo de informação do passado com os dados de comportamento atual. Com tudo isso junto, talvez você pudesse filtrar as recomendações e, assim, os 20 ou 50 livros que se poderia mostrar online teriam a força comercial das centenas ou milhares que dá para ver na mesma quantidade de tempo em uma loja.

No momento, tanto a Amazon quanto o Google estão tentando encontrar um padrão com miopia.

Mas isso é realmente parte de um problema maior para as editoras? A descoberta online está realmente afetando os padrões de venda dos e-books? Parece que sim. Um dos vendedores globais de livros me contou em Frankfurt que suas vendas online estão muito mais concentradas do que as vendas das editoras costumavam ser, com uma pequena fração de títulos (menos de 5%) contribuindo com uma enorme porcentagem das vendas totais (quase 70%). (Estou assumindo que os dados do vendedor representam o típico do mercado; pode ser que não.) Se a memória serve para algo, na virada do século, nas lojas da Barnes & Noble só uns 5% de suas vendas vinham dos “best-sellers” e os catálogos superavam os novos títulos. As editoras realmente vivem das midlists. Sabemos que a cauda longa está aumentando sua participação nas vendas e, aparentemente, a cabeça também. Estas vendas saem das midlists. É bastante difícil ter uma editora lucrativa sem uma midlist lucrativa.

E isso sugere que o aumento da concentração de vendas, que é provavelmente o resultado de nossa incapacidade de apresentar alternativas no ambiente de vendas digital, seja um problema que as editoras vão querer resolver.

[22/10/2013 22:00:00]